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Familiares na Seleção Argentina – Parte 3: Irmãos (I)

Argentinos antes de estrearem, contra a França, na Copa de 1930. Juan Evaristo é o primeiro em pé e seu irmão Mario, o último agachado. Natalio Perinetti é o primeiro agachado e Roberto Cherro, o quarto, ao lado de Mario.

Dezenas de pares de irmãos já defenderam a Argentina, e alguns, inclusive, já apareceram nos especiais anteriores da série. Este e o seguinte focarão naqueles em que pelo menos um esteve em uma Copa do Mundo. Vale lembrar que é o caso de Jorge Solari, um dos abordados no último especial.

Juan e Mario Evaristo merecem destaque dentre estes por terem sido, até hoje, os únicos a terem ido juntos a um mundial, exatamente no primeiro. Além dos quatro jogos da Copa de 1930, compartilharam outras cinco partidas pela Albiceleste. Apenas outras três duplas de irmãos estiveram juntas em uma final de Copa: os alemães Fritz e Ottmar Walter (1954), os ingleses Bobby e Jack Charlton (1966) e os holandeses René e Willy van de Kerkhof (na de 1978, na e contra a própria Argentina). Os Evaristo perderam apenas uma partida lado a lado: justamente a decisão de 1930, exatamente a última partida de cada um pela seleção.

O volante Juan era o mais velho. Homem de marcação dos mais técnicos no futebol argentino, foi figura nos anos 20, no Sportivo Palermo, além de ter integrado o Huracán campeão nacional de 1925. Estreou pela Argentina em 1922, vindo a ter seu melhor momento no final da década: disputou e venceu os Sul-Americanos de 1927 e 1929 e foi bivice-campeão mundial: além da Copa, também participou das Olimpíadas de 1928, perdida para o mesmo Uruguai vencedor dois anos depois. Marcou um gol, contra o Paraguai, em 1925.

Já Mario, que na verdade era registrado civilmente como Marino por um equívoco, era um ponta-esquerda clássico: veloz (o que o fez ser conhecido como El Galgo) e habilidoso. Suas nove partidas foram todas ao lado do irmão (que, por sua vez, defendeu a Argentina 25 vezes), a primeira delas em 1929. Era seu colega também no Sportivo Palermo, passando a jogar em 1930 no Boca Juniors, onde tornou-se um grande ídolo (Juan também jogou com ele nos auriazuis, sem tanto sucesso) – integrou o elenco titular xeneize bicampeão em 1930 e 1931 (este, no primeiro campeonato profissional do futebol argentino). Marcou três vezes: contra Paraguai e Uruguai no Sul-Americano de 1929 e outra contra o Chile, no mundial.

Felipe Cherro

Colega deles na seleção de 1930 e também no Boca Juniors, Roberto Eugenio Cherro (cujo sobrenome real era Cerro) era, apesar do físico robusto, que incluía um abdômen um tanto avantajado, um dos grandes atacantes de seu tempo – foi o maior artilheiro da história bostera (218 gols) até ser superado por Martín Palermo em 2010 -, bastante hábil em jogo aéreo, e também no drible e organização de jogadas. Foi goleador também na seleção, tendo média de 0,76 tentos por partida: foram treze em dezessete, quatro deles em um único jogo, contra o Uruguai, em 1933.

Vencedor dos Sul-Americanos de 1929 e 1937, sua trajetória na seleção, apesar dos números, poderia ter sido mais marcante: nas Olimpíadas de 1928, após quatro gols em três jogos, perdeu lugar na final por conta de uma lesão. Na Copa de 1930, depois do jogo contra a França, deixou o time titular por conta de uma crise nervosa, tendo seu lugar ocupado por Guillermo Stábile. O atacante do Huracán acabaria sagrando-se artilheiro da competição, com oito gols nos quatro jogos seguintes da Argentina.

El Cabecita de Oro chegou a jogar uma vez pela seleção ao lado do irmão mais velho, Felipe Gabriel Cherro. Foi em vitória por 2 x 0 sobre o Uruguai em 1932. Felipe, lateral-direito destacado pelo jogo limpo, era jogador do Sportivo Barracas, equipe em que o irmão também estava na época. Naquele ano, com ambos, o time venceu o campeonato argentino amador. Felipe jogou outros oito jogos pela Argentina, entre 1924 e 1932, sem integrar convocações para os grandes torneios da época. Ele, que defendera o Independiente na amadora década anterior, ainda é o jogador do Sportivo com mais partidas pela Albiceleste.

Juan Perinetti, antes de jogo do Sul-Americano de 1919, seu último ano na seleção

Um dos colegas dos Evaristo e de Cherro na Copa de 1930 era o ponta-direita Natalio Perinetti, cujo irmão mais velho, Juan Nelusco Perinetti, fora figura na seleção na segunda metade dos anos 10. Ambos são ídolos históricos do Racing. O ponta-esquerda Juan, vindo do Talleres de Remedios de Escalada (do qual é também um dos fundadores), esteve presente no elenco que, ao sagrar-se heptacampeão argentino consecutivo naquela década (ainda um recorde no país), ficaria conhecido como La Academia, posteriormente um apelido do próprio clube de Avellaneda.

O Perinetti mais velho ficou conhecido como El Llorón justamente por derramar-se em prantos nas poucas vezes que o time perdia. Pela Argentina, Juan jogou dezoito vezes entre 1915 e 1919, participando dos Sul-Americanos deste ano e dos de 1916 (o primeiro) e 1917.

Já Natalio, nove anos mais novo e que chegou ao Racing através do irmão, era inteligente e driblador, demonstrando grande habilidade em cruzamentos, criando grande dupla na época com Pedro Ochoa. Além dos três últimos títulos do hepta, somou, como um grande capitão, os outros dois que o Racing obteve no amadorismo, em 1921 e 1925, conseguindo tornar-se um ídolo ainda maior que o irmão no clube.

Na seleção, estreou em 1923, estando presente, além da Copa de 1930, também no vice das Olimpíadas de 1928. Não teve participação ativa em nenhuma das campanhas; na Copa, depois de figurar na partida contra a França, foi trocado por Carlos Peucelle, e não voltaria a defender mais a Argentina. Já nos Jogos, não esteve em uma partida sequer. Segundo ele, por pressão de um delegado do San Lorenzo que palpitava na escalação, onde interferia em favor de Alfredo Carricaberry, jogador dos cuervos, para a posição.

Ermindo Onega comemorando seu gol contra o Brasil na Copa das Nações, em imagem que se tornou icônica

Depois dos Evaristo, a dupla que esteve mais perto de ir junta para uma Copa foi os Onega, na de 1966. Ambos estão entre os grandes ídolos da história do River Plate, onde cada um passou dos 100 gols. Ermindo Ángel Onega foi um dos melhores jogadores argentinos daquela década, dono de grande visão de jogo e versatilidade nas posições ofensivas. Foi um dos condutores da campanha da seleção no mundial da Inglaterra, onde só não foi mais elogiado por conta de sua participação na confusão gerada pela polêmica expulsão de Rattín.

Dois anos antes, teve participação decisiva no título da Copa das Nações, maior conquista do futebol argentino até 1978. A imagem em que ele sai gritando em comemoração ao gol que fez na vitória por 3 x 0 sobre o anfitrião Brasil ficou na galeria dos maiores momentos da seleção.

Ele esteve presente ainda na primeira vitória argentina sobre a Bolívia na difícil altitude de La Paz, em 1965. El Ronco faleceu precocemente, aos quarenta anos, vítima de um acidente automobilístico em 1979. Jogara pela última vez pela Argentina em 1967.

Daniel Onega pela Argentina em 1972, seu último ano pela seleção

Seu irmão mais novo, Daniel Germán Onega, esteve entre os pré-selecionados para a Copa de 1966, fazendo seus dois primeiros jogos exatamente nos amistosos que antecederam a convocação definitiva. Essas partidas, contra a Polônia em Buenos Aires (1 x 1) e a Itália em Turim (0 x 3), foram as únicas em que atuou ao lado de Ermindo pela Argentina. Seu corte, visto atualmente, foi, de certa forma, surpreendente: na campanha que levou o River ao vice-campeonato na Libertadores daquele ano, semanas antes do mundial, o atacante Daniel marcou 17 gols, ainda um recorde para uma única edição da competição, cujo valor para os argentinos, porém, ainda engatinhava.

Aquela enxurrada de gols não se repetiu na seleção: Daniel não marcou uma única vez em suas treze aparições pela Argentina. Poderia ter participado da Copa de 1970: atuou na maior parte das eliminatórias, em que os argentinos perderam a vaga dentro de La Bombonera para (sem ele em campo) o Peru, um trauma retratado pelo Futebol Portenho neste especial. El Tito ainda teria 29 anos na época da Copa de 1974, mas deixou de ser lembrado depois que foi jogar na Espanha. Seu último jogo foi em um 0 x 0 contra o Paraguai, em Salta.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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