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Elementos em comum entre Boca e Racing

Nota originalmente publicada em 08-08-12, pela final que ambos travaram na Copa Argentina. 

Reconhecidos pelo ardor de suas torcidas, Boca e Racing farão um duelo caseiro de gigantes pela Libertadores, nas quartas-de-final atrasadas dessa edição – pois a perda de Maradona adiara em uma semana as partidas do Boca pelas oitavas. O próprio Dieguito, inclusive, foi um elemento em comum a ambos, começando o ano de 1995 (de quando datam as duas imagens que abrem a matéria) como técnico racinguista e terminando como jogador boquense. Mas vale relembrar também os outros páreos da dupla e quem pôde se consagrar em ambos, que até os anos 60 rivalizavam pela dianteira de títulos argentinos. Porte que não condiz com a quantidade pequena de duelos continentais. Será apenas a terceira Libertadores a opor as duas equipes.

A primeira foi na edição de 1989, que teve nada menos que três partidas. Em tempos onde cada grupo alinhava duplas de dois países, os hermanos tiveram pela frente os peruanos Universitario e Sporting Cristal. Um 0-0 em 12 de fevereiro em La Bombonera marcou a estreia conjunta dos argentinos. Em Avellaneda, os visitantes prevaleceram por 3-2 em 8 de março. Os dois acabaram igualados na liderança, com o critério de desempate ainda sendo o jogo-extra. No campo neutro do Vélez, deu novamente Boca, em 29 de março: 3-1. Embora classificada, La Academia, como segunda colocada na chave, entrou nos mata-matas logo no caminho do Atlético Nacional, que caminharia rumo a seu histórico título. O Boca também não foi mais longe: enfrentou justamente o vice Olimpia naquelas oitavas-de-final.

Também em 1989, novos duelos continentais, dessa vez pela extinta Supercopa – o valorizado torneio que entre 1988 e 1997 reuniu somente os campeões da Libertadores. Em 19 de outubro, o 0-0 parecia promissor ao Racing na Bombonera nas quartas-de-final. La Acadé era a detentora do título, mas caiu em casa por 2-1 uma semana depois. O Boca arrancaria rumo a seu primeiro título desde o maradoniano Metropolitano de 1981.

Em 1996, a Supercopa, abrigando cada vez mais novos campeões da Libertadores, já precisou começar com uma fase de grupos, onde a dupla dividiu a chave com o Argentinos Jrs. Mesmo perdendo Maradona e Caniggia para anos sabáticos, só o Boca avançou de fase, após um 1-1 em casa em 11 de setembro e um 0-0 em Avellaneda em 3 de outubro. Apenas vinte anos depois é que o duelo voltou a ter verniz continental, na primeira fase da Libertadores de 2016. Em 3 de março, o 0-0 foi o placar na Bombonera. E, outra vez, o Boca se deu melhor fora, vencendo por 1-0 no Cilindro em 13 de abril. O Racing cairia para o Atlético Mineiro já nas oitavas e o Boca durou até as semifinais, frente ao Independiente del Valle.

Eis abaixo uma lista sobre quem se destacou na dupla mais ligados à figura do marido de Evita; o nome oficial do Cilindro é Estadio Presidente Juan Domingo Perón em retribuição à ajuda política que seu governo propiciou à construção da casa racinguista, mas é lenda urbana a versão muito difundida de que o general teria coração blanquiceleste. Era azul y oro mesmo.

Ídolos em ambos

Delfín Benítez Cáceres: já dedicamos este Especial a este paraguaio que, com apenas 20 anos, participou da Copa do Mundo de 1930 por seu país, ano em que foi campeão nacional com o Libertad – curiosamente, tendo como vice um River Plate local. Mas ainda era desconhecido para os argentinos quando o Boca o importou, em 1932. Tanto que Benítez Cáceres foi primeiramente utilizado na equipe B chamando a atenção ao marcar três gols em um jogo contra o River no campeonato da categoria. Contra o próprio arquirrival debutaria enfim pelo time principal. Não marcou e enfrentou nova geladeira, mas no Superclásico do returno já marcou os dois gols da vitória por 2-1. Em 1933, já titularíssimo em um ataque formidável com Roberto Cherro e Francisco Varallo, marcou 19 vezes. Um primeiro título veio em 1934, com 20 gols do paraguaio. Naquele ano, ele até integrou o combinado da liga, em partida que anos depois seria convalidada como da própria seleção argentina.

Delfín Benítez Cáceres e Mario Boyé

Em 1935, 26 gols seus contribuíram muito em um bi seguido que fez o Boca igualar-se ao próprio Racing como maior campeão argentino. Em 1938, veio o apelido que lhe consagraria: El Machetero, ao ser assim rotulado por um jornal após marcar os dois gols da vitória por 2-1 sobre o Vélez na casa adversária, onde o Fortín era muito difícil de ser batido. A alcunha era uma referência às machetes usadas em combate pelas tropas paraguaias na Guerra do Chaco, conflito entre Paraguai e Bolívia entre 1932-35. Apesar dos 21 gols naquele ano, seu temperamento forte fez o Boca optar por desfazer-se em 1939 dele. Até hoje, Benítez Cáceres é o maior artilheiro estrangeiro do clube, com 115 gols em 176 compromissos. Contra o River, sua presença era meio gol, pois marcou seis em meio aos doze Superclásicos que jogou.

Desembarcou no Racing e logo mostrou a que veio. Estreou na terceira rodada do campeonato de 1939 justamente diante do arquirrival (e futuro campeão) Independiente e marcou um na vitória por 2-1. Se como racinguista Benítez Cáceres não conseguiu títulos, teve mais protagonismo: em 1940, com 33 gols por um time que terminou em 5º enquanto o ex-clube era campeão, desbancou justamente o compatriota Arsenio Erico, três vezes seguidas goleador nos anos anteriores. Ao lado deste, é considerado um dos quatro marechais do futebol paraguaio do início do século XX, ao lado de Manuel Fleitas Solich (por sinal ex-jogador da dupla, embora mais associado aos xeneizes, e posteriormente técnico de diversos times brasileiros) e Gerardo Rivas. El Machetero ficou mais um ano em Avellaneda, onde sua média de gols foi ainda melhor, 65 em 84 partidas. E despediu-se marcando em nova vitória sobre o Independiente, por 3-1.

Mario Boyé: também já dedicamos este Especial ao Rivellino argentinoApós um início irregular vindo em 1941 dos juvenis boquenses, virou tema de música própria: “eu te darei, te darei menina bonita, te darei uma coisa, uma coisa que começa com B”. Em vez de “beijo”, a canção da torcida do Boca (e depois a do Racing) se encerrava com um uníssono “Boyé!!”. Em 1943, El Atómico começou a se firmar e o time emendou um bicampeonato sobre a festejada La Máquina do River Plate, com Boyé chegando à seleção em 1945. Embora os troféus não voltassem, ele emplacou individualmente – foi um dos cinco jogadores presentes em todo o tri seguido da Argentina na Copa América (recorde nunca igualado por outra nação) naquela década.

Em 1946, Boyé tornou-se ainda o primeiro ponta a ser artilheiro do campeonato argentino, com 23 gols. Ao todo pelo Boca, marcou outras cem vezes (é o sexto maior artilheiro do clube), cinco delas diante do River, em 228 jogos. Após a famosa greve de 1948 não ser compreendida pelos cartolas, ele rumou ao Genoa em 1949. Mas já em 1950 voltava à Argentina, aprimorando um Racing recém-campeão. O ponta reestrou justamente contra o Boca e faria o golaço no ângulo que garantiu o tri racinguista seguido em 1951. Naquele mesmo 1951, marcou gol até em Wembley, no primeiro Argentina x Inglaterra. Ficou mais dois anos no Racing, fechando a conta com 33 gols em 84 jogos.

El Atómico ainda chegou a regressar ao Boca em 1955. Deixou marcas, mas já não era o mesmo e deixou o time outro ano depois, não sem antes uma última anedota: em amistoso contra o River Plate em Montevidéu, marcou um gol em Amadeo Carrizo. Era o primeiro que fazia no mítico arqueiro do arquirrival, que prometeu-lhe um uísque se levasse mais um de Boyé. O quase aposentado atacante marcou outros três. Após o futebol, abriu uma rede de pizzarias, La Guitarrita, que visitamos em 2017. Uma das opções no cardápio chama-se “Atómica“.

Marcelo Delgado: ele tinha apenas 22 anos quando chegou ao Racing, em 1995, vindo do mexicano Cruz Azul. Mas já tinha experiência na primeira divisão desde os 17, quando se profissionalizara no Rosario Central, onde El Chelo já havia sido ídolo. Logo exibiu boa fase, entendendo-se bem com Claudio López. Ambos, marcados tantos pelas bolas que colocaram nas redes e nas arquibancadas, conduziram a boa campanha no Apertura de 1995, quase campeã após tirar justamente o Boca do páreo – com gol de Delgado em um histórico 6-4 dentro da Bombonera. Delgado marcou oito vezes em 19 jogos, incluindo um sobre Rosario Central, Newell’s, River e no clássico contra o Independiente.

Marcelo Delgado (sua foto no Boca é de um dos gols no Santos na Libertadores de 2003) e Alfio Basile

Delgado logo acabou na seleção olímpica para 1996, ano em que também fez um dos gols que colocaram o Racing na Libertadores de 1997, em tira-teima pela segunda vaga contra o forte Gimnasia da época. Protagonista na campanha semifinalista naquela Libertadores (eliminando-se River e Peñarol), continuou no radar da seleção e foi à Copa do Mundo de 1998. Mesmo sem jogar na França, ainda é o último convocado ao Mundial como racinguista. Despediu-se da Academia como seu máximo artilheiro na era dos torneios curtos até então, com 39 gols (depois Maxi Estévez, Diego Milito e Gustavo Bou o superaram), reforçando em 2000 um Boca já entrosado para ser sombra à dupla Martín Palermo e Guillermo Barros Schelotto.

Chelo Delgado marcaria no histórico Superclásico vencido por 3-0 na vitoriosa Libertadores daquele ano, faria com Palermo a dupla titular no Mundial Interclubes e também marcou o único gol argentino na final da Libertadores de 2001. Mas sua expulsão no Mundial de 2001 o crucificou por um tempo com a torcida. Demorou, mas ele enfim se imortalizou em 2003: foi o artilheiro de novo título na Libertadores, ajudando na remontada contra o Paysandu no calor do Mangueirão (foi dele o outro gol nos 4-2 recordados pela tripleta de seu desafeto Schelotto) e marcando três vezes nas finais contra o Santos. De alma lavada, partiu de novo à Cruz Azul, mas ainda voltou ao Boca em 2005. Já sem lugar em um ataque onde Rodrigo Palacio e Daniel Bilos eram as opções mais frequentes para acompanhar Palermo, deixou a Casa Amarilla rumo ao Belgrano em 2006 – garantindo ao menos uma penca de títulos sob o comando do homem a seguir.

Alfio Basile: já dedicamos este Especial ao último técnico campeão com a seleção principal. Ainda como jogador, El Coco (curiosamente, torcedor do Independiente na infância) fazia com Roberto Perfumo a dupla de beques casca grossa da Equipo de José, apelido do poderoso Racing que existiu entre 1965-69, ganhando no período um título argentino no embalo de 39 jogos seguidamente invicto (então um recorde no profissionalismo argentino), a única Libertadores da Academia e o primeiro Mundial do futebol argentino. Como técnico, construiu reputação primeiramente na dupla rival Instituto e no Racing de Córdoba, sendo até vice nacional com este outro Racing em 1980.

Voltou ao Racing de Avellaneda em 1985 para desatola-lo da segunda divisão, onde La Acadé jazia já havia duas temporadas. Conseguiu e foi além, recolocando o time nas cabeças e vencendo a primeira Supercopa, em 1988. Foram suas credenciais para assumir a seleção após a Copa de 1990 – conseguindo um recorde mundial de invencibilidade de 32 jogos, erguendo no período um bi na Copa América e a primeira Copa das Confederações, trabalho que terminou manchado pelos 5-0 sofridos contra a Colômbia e pela queda tumultuada na Copa de 1994.

Basile não chegou a obter bons trabalhos de imediato, mas Maradona o referendou para o Boca em 2005. O clube vinha órfão de Carlos Bianchi e El Coco mostrou mais do que carisma: conquistou tudo o que estava ao alcance ali e em 2006, calhando de não disputar a Libertadores naquele biênio. Levou duas Recopas, a Sul-Americana de 2005 e o bicampeonato do Apertura 2005 com o Clausura 2006. Após a segunda Recopa, foi escolhido para voltar a dirigir a seleção – o que fez Maradona, desejoso confesso do cargo, passar a boicota-lo. Ele também retornaria ao Boca em 2009 e ao Racing no início de 2012, sem sobreviver à instabilidade que os clubes viviam.

Em comum na seleção

Além de Boyé e Delgado, outros jogadores defenderam a Argentina vindo dos dois clubes, embora sem conseguir a idolatria conjunta como os citados acima. Boyé foi sucedido inicialmente pelo zagueiro Federico Sacchi, que já era jogador de seleção quando veio do Newell’s em 1961. Sabia ser elegante na marcação e, já naquele ano, foi campeão nacional com o Racing, sendo ídolo e uma inspiração para Basile e Perfumo. El Polaco (tinha pele claríssima e cabelos loiros como se fosse um legítimo descendente de poloneses), assim, credenciou-se por um lugar na Copa do Mundo de 1962 e manteve-se inicialmente convocado mesmo em um passo que terminou opaco no Boca: não teve tanto lugar no time campeão de 1965 e ali teria a lesão que lhe abreviaria a carreira.

Federico Sacchi e Julio Olarticoechea, dois dos jogadores que defenderam a Argentina vindos de ambos os clubes

Depois foi a vez do volante Julio Olarticoechea, que por vezes atuou também nas duas laterais. Surgiu em 1976 das categorias inferiores do Racing, que intercalava péssimas campanhas (briga para não cair nos Metropolitanos de 1976 e 1977, queda na fase de grupos do Nacional de 1980) com alguns sopros de luz – com a classificação aos mata-matas nos Nacionais de 1978 e 1979 e, por fim, a colocação um ponto abaixo do bronze no Metropolitano de 1981. Chegou nesse embalo à seleção e ao River, integrando ainda em 1981 o elenco vencedor do Nacional. El Vasco foi à Copa de 1982 mas não construiu tanta reputação assim em Núñez; na virada de 1985 para 1986, foi usado como moeda de troca junto a Carlos Tapia para o Millo adquirir do arquirrival as estrelas Ricardo Gareca e Oscar Ruggeri. Já dedicamos este especial ao defensor, que, se não virou exatamente ídolo xeneize, conseguiu convencer a seleção a chama-lo para a Copa de 1986 após três anos de ausência na Albiceleste. Foi ao Nantes após a Copa, voltando ao Racing para a temporada 1988-89. E como racinguista ele foi à Copa de 1990.

O caso de outro defensor, José Luis Brown, é mais curioso. Ídolo mesmo, ele foi no Estudiantes, onde construiu uma sólida parceria com o técnico Carlos Bilardo. O título alvirrubro no Metropolitano de 1982 encerrou doze anos de jejum do clube de La Plata e levou Bilardo à seleção. Brown, por sua vez, rodou por Atlético Nacional, Boca e Deportivo Español, sem se firmar em nenhum, embora seguisse na seleção de Bilardo (foram dois jogos como boquense, em novembro de 1985). Falamos aqui que o site HistoriadeBoca até o descreve como “fora de forma, não rendeu e se desvinculou (…). Ninguém poderia acreditar que este zagueiro lento e inseguro fosse o líbero sólido e chave na seleção argentina campeã do mundo”. Com gol na final sobre a Alemanha Ocidental, seguiu carreira europeia no pós-Copa, reforçando o Racing na temporada 1989-90.

As lesões obrigaram Brown a pendurar as chuteiras ali mesmo pelo 8º colocado do campeonato argentino. Mas houve tempo para El Tata, como racinguista, defender a seleção em dois amistosos não-oficiais em 1990, contra o Monaco em janeiro e o Linfield em abril – menos por boa fase e mais pela relação com Bilardo, que inclusive até hoje, por conta de preocupação da família com sua fragilidade física, não sabe do falecimento do pupilo (nem o de Maradona). Brown foi justamente o último cortado entre os pré-convocados, embora fizesse questão de seguir na delegação para apoio moral na Itália. Brown ainda voltaria ao Boca em 1996, como fiel escudeiro de Bilardo, sendo seu assistente técnico na decepcionante passagem do Narigón como treinador boquense.

O outro nome é a de mais um zagueiro, Néstor Fabbri. Ele conseguia sobressair-se na defesa mesmo sendo assumidamente lento, o que compensava com boa noção de posicionamento. “Nos treinos da seleção anulava Caniggia. E quando joguei na França, havia africanos mais rápidos e que não me passavam”, declarou La Tota, marcado também pela personalidade forte e por chutar bem com a perna esquerda. Foi um dos campeões da Supercopa de 1988, estando no Racing de 1987 até 1992. Já em 1987, foi eleito oficialmente o melhor jogador de futebol argentino do ano, e esteve na Copa de 1990. A derrota para Camarões o crucificou por quatro anos: só voltou à Albiceleste após a Copa de 1994, já como recém-chegado ao Boca. Foram quatro anos de Casa Amarilla como um dos astros do “cabaré”, como foi apelidado aquele elenco cheio de egos e incapaz de vencer algum título. Mas a momentânea boa fase vice-campeã da Supercopa 1994 o devolveu à seleção para a Copa América de 1995.

Em comum em títulos

Além de Boyé, Sacchi e Basile, um certo número de outros nomes pôde ser campeão na dupla, embora o protagonismo só se notasse em um deles (quando muito). O primeiro foi o ponta-direita Zoilo Canaveri, a personificação do vira-casaca na Argentina: jogou por Boca e River e por Racing e Independiente. O único grande que não defendeu foi o San Lorenzo, e, destes quatro, só não foi campeão no River. Além disso, foi um uruguaio que jogou pela Argentina (e ambos contra o Uruguai natal)! Ele e o contemporâneo Horacio Vignoles ainda são os únicos charruas na Albiceleste. No Racing, ele esteve entre 1915 e 1917, erguendo os títulos argentinos de todos esses anos de hepta e chegando à seleção argentina. No Boca, apareceu primeiramente no fim de 1916, voltando como reforço do elenco campeão argentino pela primeira vez, em 1919. Mesmo perdendo a titularidade ao longo da campanha, até tango virou como boquense.

José Luis Brown e Néstor Fabbri também jogaram pela seleção tanto como boquenses como também como racinguistas

Outro racinguista daquele ciclo do tetra foi o atacante reserva Marcelino Martínez, igualmente sem tanta presença pelo Boca campeão de 1920 (vinte jogos, quatro gols). Já o Racing campeão de 1961 teve o citado Sacchi na defesa e dois astros no ataque: o meia-direita Juan José Pizzuti e o ponta Omar Corbatta. Pizzuti (outro que, como Basile, torcia na juventude pelo Independiente) chegara a Avellaneda em 1952, vindo do River para gradualmente tornar-se o quarto maior artilheiro da Academia. Antes de firmar-se de vez, reforçou pontualmente o Boca em 1955 e, já consagrado, voltou aos auriazuis como reserva de luxo no título de 1962. No Racing, sua história como treinador foi ainda maior: era em referência a ele que o timaço campeão de tudo entre 1966-67 foi apelidado de Equipo de José. Saiu de lá para a seleção em 1969 e voltou diversas vezes como bombeiro, incluindo na vã tentativa de livrar La Acadé do rebaixamento em 1983. Já aos 92 anos, o maior personagem da história racinguista foi uma das primeiras baixas desse trágico 2020, em janeiro.

El Loco Corbatta, por sua vez, foi uma espécie de Garrincha argentino pelas diabruras que fazia na ponta e pelo alcoolismo que lhe declinaria e o faria morrer jovem, pobre e sozinho. Ele chegou ao Racing em 1955 e em 1958 foi primeiramente um dos poucos poupados de críticas do vexame da seleção na Copa do Mundo (marcou três gols em campos suecos), sagrando-se ao fim do ano campeão argentino junto a Sacchi e Pizzuti. Bicampeão da Copa América em 1957 e em 1959, já não era o mesmo quando foi contratado pelo Boca, em 1963. Foi um ilustre reserva do time vice-campeão da Libertadores de 1963 e do elenco bi argentino em 1964 e 1965.

De caminho inverso, porém igualmente mais apreciados em Avellaneda, estão Juan José Rodríguez e Juan Carlos Rulli. Rodríguez jogara pelos auriazuis nos últimos quatro anos da década de 1950 (inclusive integrando rapidamente a seleção em 1959), mas quando enfim foi campeão, ao retornar em 1964, esteve na reserva. Chegou ao Racing em uma troca com Sacchi para consagrar-se no novo clube, sendo vice-artilheiro dos campeões da Libertadores de 1967, com seis gols. Rulli, por sua vez, saiu do Estudiantes rumo ao Boca em 1963 e ficou até 1965. Mas, como Corbatta, ocupou mais o banco nesse período. Veio ao Racing como reforço bom e barato e fez história na Equipo de José campeã de tudo entre 1966 e 1967.

As quatro décadas perdidas do Racing entre o início dos anos 70 e o fim dos anos 2000 reservaram somente a Supercopa 1988 e o Apertura 2001 como títulos; o Boca, menos severamente, também teve taças apenas esporádicas na maior parte dos anos 80 e 90. Assim, o nome seguinte tardou bastante: foi o do volante Gustavo Barros Schelotto. El Tiburón despontou no bom time noventista do Gimnasia LP junto com o irmão gêmeo, o atacante Guillermo. Maradona pediu por ambos ao Boca na temporada 1997-98. Embora tivesse talento, o volante viu apenas Guille manter protagonismo com a mudança. Gustavo prejudicou-se ao ir às vias de fato com o técnico Héctor Veira no início de 1998, custando-lhe exílio semestral no Unión. Nunca se firmou por completo na Casa Amarilla, mas ainda assim conseguiu consideráveis 90 jogos e doze gols (bom número a um volante reserva) até ser adquirido pelo Villarreal após o Mundial de 2000.

O clube espanhol prestara atenção nele por ter sofrido gol em um amistoso ainda em agosto de 2000. Gustavo não se firmou e em um semestre já voltava à Argentina para defender um decrépito Racing. Foi pé-quente instantâneo como um bom coadjuvante no operário elenco que encerrou ao fim de 2001 o jejum racinguista de 35 anos no campeonato argentino. Ainda assim, terminaria mais identificado com o Rosario Central, para onde partiu em meados de 2002. O “outro Schelotto” seguiu até 2017 como último campeão pela dupla. Àquela altura, ele e o gêmeo compunham a dupla de técnicos do Boca vencedor do campeonato de 2016-17. Dentre os comandados, o instável Ricardo Centurión, atacante promissor no Racing campeão do Transición 2014 (seu único gol foi justamente o do título, no duelo final com o Godoy Cruz).

Juan José Pizzuti e Omar Corbatta: ídolos apenas no Racing, campeões nos dois

Após a primeira conquista racinguista desde 2001, Ricky naufragaria no São Paulo, que o emprestou ao Boca para aquela temporada 2016-17. Ele voltou ao Racing em meados de 2018, participando do início do título de La Acadé na Superliga de 2018-19, saboreado quando Centurión já estava emprestado ao futebol mexicano. O elenco vencedor da Superliga de 2018-19 contou ainda com outros três antigos campeões com os auriazuis, sobretudo o volante Neri Cardozo. Sua estadia de 2004 a 2008 abarcou não só a vitoriosa Era Basile como também garantiu títulos antes (Sul-Americana 2004) e depois (Libertadores 2007, ano em que até chegou à seleção, e Recopa e Apertura em 2008).

Em 2008, como campeão mundial sub-20 com a seleção em 2007, o goleiro Javier García foi profissionalizado pelo Boca. Ficou até 2012 mas, mesmo testado uma vez na seleção em 2011, nunca se firmou na titularidade nem por lá (Mauricio Caranta primeiro e Agustín Orión depois se apossaram da vaga) e nem nesse Racing, onde ocupou o banco de Gabriel Arias – ainda assim, ele voltou ao Boca em 2020, vencendo novamente a Superliga, mas assistindo Esteban Andrada jogar. Na reta final da Superliga de 2018-19, La Acadé se reforçou como veterano atacante Darío Cvitanich. Formando no Banfield e sondado pela seleção croata no passado, ele pertencia ao Ajax quando chegou sob empréstimo ao Boca, para a temporada 2011-12.

Como xeneize, Cvitanich integrou o time que venceu o Apertura e a Copa Argentina, mas nunca se firmou e ficou mais lembrado pelo gol perdido no lance final da primeira decisão contra o Corinthians na Libertadores de 2012; em Avellaneda, conseguiu mais protagonismo. Ao fim de 2019, ergueu também o Troféu dos Campeões. Por fim, o volante Guillermo Fernández surgiu no Boca em 2012 a tempo de ser um reserva campeão da Copa Argentina, mas passou por sucessivos empréstimos até ser vendido em 2015 ao Godoy Cruz. Dali chegou ao Racing para a temporada 2018-19, conseguindo instantaneamente o título da Superliga como titular. Ele e García logo voltaram à reserva Boca campeão da Superliga de 2019-20.

Nomes honrosos

José D’Amico teve no futebol mais destaque como preparador físico, integrando a comissão técnica do Racing tricampeão de 1949-51. Em 1954, assumiu a função principal na Academia, sem brilho: o time foi 10º, então sua pior colocação. No Boca, também começou como o preparador físico, virando técnico inicialmente de modo interino, entre a saída de Carlos Sosa e a chegada midiática do brasileiro Vicente Feola. Substituiu-o em 1962 e teve seu grande momento: o clube encerrou em alto estilo oito anos de jejum, concorrendo exatamente contra o River, superando-o em um Superclásico histórico na penúltima rodada. Também era o técnico xeneize vice da Libertadores de 1963, na primeira final disputada por argentinos. Chegou a reassumir o Boca em 1968 e foi por fim um dos bombeiros tentados pelo Racing no 11º lugar de 1971.

O goleirão Rogelio Domínguez, antes de brilhar no Real Madrid de Di Stéfano penta na Liga dos Campeões, formou-se no Racing em 1951. Só não subiu a tempo de ser titular no elenco campeão daquele ano, só jogando uma única partida até começar a firmar-se a partir de 1953. Foi vendido aos espanhóis após vencer com a seleção a Copa América de 1957, sem conseguir nenhum outro troféu defendendo a Academia. Após pendurar as luvas no Flamengo em 1969 (tendo até enfrentado, pelo Nacional, o Racing na final da Libertadores de 1967), engatou nos anos 70 uma carreira de técnico que fazia o estilo “boleiro”. Ficou de 1973 e 1975 no Boca. Dos técnicos jamais campeões no clube, é quem mais anos e partidas durou, sendo reconhecido pelo futebol bonito mas ao mesmo tempo imaturo para taças. Também teve diferentes ciclos no Racing na nova função. Já dedicamos-lhe este outro Especial.

Antes de consagrar-se como técnico da Argentina de 1978, César Menotti foi um refinado camisa 10 clássico no início dos anos 60, tendo chegado também como jogador à seleção. Com essa credencial pelo desempenho ainda no Rosario Central, chegou em 1964 ao Racing. Ele, que futuramente passaria (sem destaque) pelo Santos de Pelé, formou em Avellaneda um ataque com três provenientes da própria Vila Belmiro, incluindo o ídolo alvinegro Dorval. Menotti foi o artilheiro de um time que, mesmo em 6º, teve o segundo melhor ataque da competição, superior inclusive aos três do pódio. Com isso, ele e o citado Federico Sacchi passaram ao Boca em 1965, mas lesões começaram a minar a carreira do Flaco, melhor recordado pelos xeneizes quando foi técnico (na temporada 1986-87 e na de 1993-94): nessa função, foi outro que, como Domínguez, foi reconhecido pelo bom futebol, mesmo que os títulos não viessem: em 1987, sete vitórias seguidas tiraram o time do 14º lugar para a liderança, mas as chances de título ruíram ainda antes da rodada final; na segunda passagem, assumiu o clube na 12ª rodada do Apertura 1994, com a azul y oro só tendo marcado seis gols. Ao fim, o time terminou a dois pontos do título e seria vice da Supercopa 1994. Menotti só se queimaria na Academia ao terminar associando-se mais ao Independiente, a partir de diversas passagens pelo rival a partir de 1996. Já dedicamos-lhe esse outro Especial.

Campeonatos e decisões

Apesar do porte da dupla, foram muito raras as vezes em que ambos lutaram por um mesmo torneio. Ainda mais raros foram os anos em que foram igualmente campeões – apenas em 1919 (cada um em uma liga argentina separada) e em 2001, quando o Boca venceu a Libertadores e o Racing, o Apertura. Já os primeiros duelos decisivos datam ainda de tempos conjuntos na segunda divisão; o Boca orgulha-se de ser o único jamais rebaixado do futebol argentino, o que não significa que jamais tenha disputado a segundona, criada ainda antes da fundação dos dois clubes. Desde então, muitos outros foram duelos com ares de decisão, mas raramente com os dois clubes juntos numa disputa por título.

Gustavo Barros Schelotto chegou a treinar Ricardo Centurión no Boca

Eis abaixo um breve histórico de encontros decisivos, embora uma corrida conjunta de ambos pela taça se resuma aos anos de 1908, 1910, 1918, 1988, 1991, 1993 e 1995 – pois os pódios conjuntos de 1950, 1958, 1998 e 2011 camuflam torneios onde o campeão abriu cedo uma distância larga demais:

1908: a final da segunda divisão por pouco não foi entre Boca e River, ainda humildes vizinhos de bairro; numa das semifinais, os auriazuis caíram por 1-0 para o time de Avellaneda, que adiante terminou derrotado pelo River, que ali se tornou o primeiro dos futuros “cinco grandes” a chegar à elite.

1910: dessa vez, Boca e Racing se encontraram na final da segunda divisão. Por 2-1, prevaleceu o clube de Avellaneda – que, inspirado no ano do centenário da independência, passou a trajar-se com as cores da bandeira. Essa decisão recentemente completou 110 anos, no último 11 de dezembro. O Racing logo se firmou como a primeira potência argentina oriunda fora da comunidade britânica, ganhando em 1913 o primeiro título argentino de um time “latino”. Foi também em 1913 que o Boca estreou na elite, precisamente, embora tardasse mais um tempo para se mostrar capaz de lutar pela taça – ao passo que o vizinho emendaria mais seis títulos seguidos àquele. O heptacampeonato seguido ainda é um recorde exclusivo do Racing e apenas no fim desse ciclo é que o Boca ofereceu resistência.

1918: um 4-1 do Racing na 21ª rodada sobre o concorrente direto Boca já permitiu uma mão na taça à Academia, que assegurou o título na 23ª – com ainda mais três jogos a disputar. Depois que a taça se definiu, o Boca ainda jogou mais quatro vezes, mas só venceu uma e acabou ultrapassado em um ponto pelo River (que no mesmo período venceu três vezes), terminando em terceiro. No ano de 1919, o Racing puxou uma grande fila de clubes insatisfeitos com a federação. O Boca seguiu nela e terminou campeão argentino pela primeira vez, enquanto que o Racing, numa liga então “pirata”, garantiu o sétimo título seguido. Em 1927, as duas ligas se unificaram e os títulos de ambas foram convalidados como oficiais.

1932: o jogo-extra entre River e Independiente pelo título esconde que o Racing também estava no páreo até a penúltima rodada, quando foi derrotado por um Boca já sem chances. A Academia ainda teve ânimo na rodada final, que foi justamente o Clásico de Avellaneda. Mesmo visitante, venceu o rival, forçando aquele jogo-extra.

1933: em um certame embolado, quem tinha pinta de campeão na verdade era El Expreso do Gimnasia, em uma disputa que envolvia ainda San Lorenzo e River. Mas o time de La Plata, perdendo duas seguidas contra os concorrentes Boca e San Lorenzo (ambos jogos de reconhecido prejuízo da arbitragem contra os azarões), desanimou na reta final. O pódio terminou com o San Lorenzo campeão, um ponto acima do Boca e dois acima do Racing – que, mesmo emendando três vitórias seguidas, perdeu as chances de título na penúltima rodada.

1934: o Boca foi campeão com um ponto de vantagem sobre o Independiente. A taça só não foi garantida na penúltima rodada porque o Racing, em tempos em que honra esportiva era mais valorizada, venceu os auriazuis por 2-1, embora estivesse fora do páreo desde cedo (foi 6º). O Boca chegou ao oitavo título argentino, ficando a um de igualar-se ao então recordista Racing. Igualou em 1935 e superou em 1940.

1944: mesmo concorrendo contra a célebre La Máquina do arquirrival River, o Boca foi bicampeão seguido ao triunfar na rodada final com um 3-0 sobre o Racing (outra vez apenas 6º), curiosamente com os auriazuis mandando o jogo no Monumental.

1949: o Racing garantiu em um jogo de onze minutos contra o Boca o fim de largo jejum. Era o tempo restante de um duelo que valia ainda pela 28ª das 34 rodadas, suspenso após revolta da plateia mandante na Bombonera contra um suposto impedimento no gol da virada racinguista: é que aquele era justamente o único torneio em que o Boca lutou contra o rebaixamento (a ponto de se livrar somente na rodada final). Os minutos restantes foram disputados após os jogos da 31ª rodada. Houve espaço para mais polêmica, agora com a anulação do gol de empate que o Boca até conseguiu achar no exíguo tempo para reação. Prevaleceu o triunfo visitante por 2-1 e a primeira volta olímpica de La Acadé na liga desde o torneio de 1925.

1950: contratando o veterano astro José Manuel Moreno, o Boca reagiu e foi vice do Racing, mas comendo poeira: La Academia assegurou o título na antepenúltima rodada mesmo perdendo de 3-0 do Banfield (com dois gols de Juan José Pizzuti, ainda banfileño), pois em paralelo o Boca não saiu de um empate com o Ferro Carril Oeste.

1951: o Racing foi tri seguido (foi o primeiro tricampeonato do profissionalismo argentino) precisando correr atrás do prejuízo após perder em casa do Boca (apenas 6º colocado) na 30ª rodada. Nas quatro restantes, empatou duas e venceu outras duas, conseguindo igualar-se à surpresa Banfield e forçar jogos-extras contra os alviverdes, que não resistiram à camisa mais pesada.

Neri Cardozo e Darío Cvitanich: com passado campeão no Boca, venceram com o Racing a Superliga de 2018-19 e seguem em Avellaneda

1955: o páreo era mais entre Racing e River. Ainda em tempos de honra esportiva mais valorizada, na 27ª rodada o 3º colocado Boca bateu o Racing por 3-1. Mas duas rodadas depois não conseguiu fazer o mesmo contra o arquirrival. O River, mesmo em La Bombonera, venceu o Superclásico realizado na 29ª e  assegurou com uma rodada de antecipação o título. Até hoje, foi a última volta olímpica riverplatense na Bombonera.

1957: em roteiro parecido, o River foi campeão (na realidade, tricampeão seguido, igualando a marca do Racing) na antepenúltima rodada ao triturar por 3-0 o Independiente. Na rodada anterior, o Racing levara de 3-0 do 4º colocado Boca e terminou nas rodadas restantes ultrapassado pelo San Lorenzo.

1958: o Racing foi campeão com três pontos de vantagem sobre o vice Boca, mas o tira-teima final ocorreu ainda na 19ª rodada. Em Avellaneda, o Boca venceu por 2-1, mas La Acadé pôde assegurar a taça ainda na antepenúltima rodada, reduzindo a marcha nas duas restantes. Esse título colocou o Racing a um de igualar o Boca como maior campeão, o que ocorreria em 1961.

1959: filme parecido ao de 1957. O campeão, agora o San Lorenzo, assegurou a taça ainda na 26ª de 30 rodadas. Tarefa facilitada com derrota do concorrente Racing na visita ao 8º colocado Boca (3-1) na rodada anterior.

1960: quatro pontos separaram tanto Racing como Boca do campeão Independiente, mas a tabela é enganosa. Não chegaram a estar no páreo, centralizado entre o Rojo e a surpresa Argentinos Jrs – embora no fim o vice tenha sido o River, igualado ao Argentinos muito por um inútil arranque final de quem também estava fora das cabeças.

1966: concorrendo apenas com o River, o Racing colocou uma mão e meia na taça ao bater o 3º colocado Boca por 3-2 na 35ª rodada. E ficou com as duas no jogo seguinte (a antepenúltima), ao empatar em 0-0 com o Gimnasia. Foi o torneio em que o time de Avellaneda acumulou 39 jogos seguidos de invencibilidade, então um recorde profissional, a catapultar os campões aos títulos na Libertadores e no Mundial em 1967. Foi a última vez em que o Racing esteve a um título de igualar o Boca como máximo campeão argentino.

1968: no Torneio Nacional, o Boca, embora 5º colocado, ficou a um ponto dos três líderes: Racing, River e Vélez, que avançaram a um triangular extra favorável aos velezanos, ali campeões pela primeira vez da elite. Mas o torneio, em turno único, reservou o Boca x Racing ainda para a segunda rodada (0-0 na Bombonera).

1969: quase fizeram a final do Torneio Metropolitano, mas caíram nas semis. O Racing perdeu a vaga a quatro minutos do fim para o surpreendente campeão Chacarita, enquanto o Boca falhou no Superclásico. La Academia perderia seu histórico treinador Juan José Pizzuti à seleção, após a não-classificação argentina à Copa de 1970, e iniciaria longo declínio.

1973: um empate em 1-1 entre o vice Boca e o 12º colocado Racing permitiu ao Huracán pôr uma mão e outros quatro dedos na taça do Torneio Metropolitano – pois foi campeão na seguinte (a antepenúltima) mesmo derrotado pelo Gimnasia.

1975: o Boca se manteve no páreo do Torneio Metropolitano vencendo na 28ª rodada em Avellaneda por 4-3 em jogo onde perdia de 3-0. O azar do 16º colocado Racing já virava algo folclórico, pois na mesma data o Independiente garantia o tetra seguido da Libertadores (algo tão comum que a capa da revista El Gráfico preferiu retratar a virada boquense). Ao fim, porém, a corrida do Metro se limitou a River e ao forte Huracán da época.

1981: concorrendo só com a surpresa Ferro Carril Oeste, o Boca de Maradona foi campeão do Metropolitano ao empatar com o Racing na rodada final. Foi a última campanha digna da Academia (5º colocada, mas a um ponto do bronze) antes do rebaixamento racinguista em 1983. Seriamente endividado para reforçar-se com Maradona, o Boca também entraria em declínio sentido, quase beirando a extinção em um 1984 igualmente trágico ao Racing (incapaz de subir na segunda divisão enquanto o Independiente vencia Libertadores e Mundial).

1988: no primeiro semestre, o Racing venceu a primeira Supercopa, seu único título entre 1967 e 2001. Embalado, disputou no segundo semestre a liderança do torneio de 1988-89 com o Boca. O duelo direto encerrou o primeiro turno (a liderança conjunta ali classificou ambos à Libertadores de 1989, edição onde o torneio passou a ocorrer no primeiro semestre após anos ocupando apenas o segundo). Um rojão racinguista atingiu o goleiro boquense Carlos Navarro Montoya e os tribunais deram os pontos ao Boca, que seguiu no páreo enquanto o concorrente despencaria para 9º e veria o título ficar justamente com o Independiente.

1991: Racing e Boca (em jejum argentino desde a conquista maradoniana de dez anos antes) lutavam pela liderança do Clausura quando se toparam na 14ª das 19 rodadas. Foi o primeiro jogo do Boca após sua tumultuada eliminação para o Colo-Colo nas semifinais da Libertadores. Mordido, Batistuta marcou três vezes em inapelável 6-1 nas redes de Goycochea. A Academia só venceria dois jogos dos cinco seguintes e terminou nove pontos abaixo, ainda que Batigol e colegas tampouco recebessem medalhas, com o título ainda se definindo em uma final entre líderes do Apertura e do Clausura (vencida pelo Newell’s de Marcelo Bielsa). Na pós-temporada, o Boca, nos pênaltis, também levou a melhor nas semifinais da liguilla pre-Libertadores.

Festas do Racing na Bombonera: a volta olímpica de 1949 e os 6-4 de 1995 – Rubén Capria comemora um de seus três gols, ofuscando Maradona inclusive na foto (nota-se atrás dele a faixa de capitão e a mecha loira usada por Dieguito na época)

1992: o 1-1 com o 16º colocado Racing na 16ª de 19 rodadas do Apertura esteve na sequência de quatro jogos seguidos que o líder Boca (ainda em jejum nacional) não venceu, até a penúltima rodada. O temor de perder um torneio que parecia ganho aumentou na rodada final ao sair atrás do placar em casa para o San Martín de Tucumán, mas a gordura acumulada foi tanta que o empate bastou para encerrar a pior seca argentina dos auriazuis.

1993: o Racing era líder do Apertura quando o torneio foi pausado após a 15ª rodada, já em 18 de dezembro (as turbulentas eliminatórias da Copa, com uma imprevista repescagem, atrasaram o cronograma). Na penúltima rodada, ambos tinham chances e o Boca praticamente repetiu o filme de 1991, surrando por 6-0. Na rodada final, o Racing até bateu por 3-1 o Estudiantes, mas terminou um ponto atrás do campeão River (mesmo com o Millo só empatando em casa com o Argentinos Jrs) e o Boca, a dois, ao não sair do 1-1 com o Gimnasia.

1995: o Racing começou o ano treinado por Maradona, contratado sob expectativa de que, encerrada sua suspensão para jogar (15 meses desde a Copa de 1994), se convertesse em jogador. Mas, ainda em meio a um decepcionante Clausura, Diego abandonou o projeto após a não-reeleição do presidente que o contratara. E terminou acertando com o Boca. Reforçado com ele e Caniggia, o clube liderava de modo invicto o Apertura até a antepenúltima rodada. Tinha sofrido seis gols no torneio inteiro, mas sofreu outros seis só naquele dia. Em recordado duelo que completou 25 anos no último dia 3 de dezembro, o Racing encerrou por 6-4 um jejum de 20 anos na Bombonera (justamente no dia em que Mauricio Macri foi eleito presidente boquense) e, em arrancada final, passou ele próprio a disputar uma corrida que envolvia ainda o Vélez. O Boca repentinamente saiu dela na penúltima rodada, ao sofrer nova derrota seguida. Ao fim, a taça foi velezana.

1996: Maradona e Caniggia estavam em estado de graça após o famoso Superclásico do beijo na boca, pela 16ª rodada do Clausura. O chocolate de 4-1 com três gols de Cani deixava o Boca a um ponto do líder Vélez, faltando três rodadas. Mas o torneio foi pausado para as Olimpíadas e o time preferiu fazer uma inoportuna excursão à China. Três semanas depois, o campeonato recomeçou com Claudio López dando nos minutos finais a vitória ao 8º colocado Racing na antepenúltima rodada. Nova derrota seguida para o Estudiantes na penúltima outra vez tiraria os estrelados auriazuis do páreo: Maradona, Caniggia e Verón sequer atuaram na última e Diego, arrasado por perder seis pênaltis seguidos na campanha, iniciaria um ano sabático para tratar das drogas.

1997: no Apertura, reforçado novamente com Maradona e Caniggia, o Boca só perdeu uma partida e o campeão River, duas. Os boquenses inclusive venceram de virada o Superclásico dentro do Monumental, mas Dieguito anunciou o fim da carreira dias depois. Mas empataram demais e uma delas, um 0-0 na antepenúltima rodada contra o 13º colocado Racing, atrapalhou que a liderança fosse recuperada. Ao fim, o Boca, sem títulos desde o já distante Apertura 1992, fez a melhor campanha de um vice-campeão dos torneios curtos.

1998: no Apertura, o Racing fechou um pódio enganoso. Embora La Acadé realmente empolgasse no início com um time estrelado, terminou treze pontos atrás de um Boca arrasador, em seu primeiro semestre sob Carlos Bianchi. Campeão invicto, os auriazuis seriam bi no Clausura 1999 no embalo de 40 jogos seguidos de invencibilidade, superando a marca do Racing de 1966. O recorde profissional se mantém até hoje enquanto o time de Avellaneda, sem honrar as dívidas para montar aquele time, tinha em paralelo sua falência decretada. A extinção não foi efetivada na prática, mas chegou-se a o ponto de no Apertura 2000 o Boca ser campeão e o Racing, último.

2008: no primeiro semestre, o Racing, ainda sentindo efeitos da quase-quebra, só escapou do rebaixamento em uma repescagem contra o Belgrano. No segundo semestre, foi 14º no Apertura enquanto o Boca perseguia o líder San Lorenzo. O triunfo auriazul por 2-1 na antepenúltima rodada foi vital para que ao fim xeneizes e azulgranas terminassem mesmo igualados na liderança – junto à surpresa Tigre. No triangular extra forçado, deu Boca (em torneio festejado especialmente pelo lanterna ter sido justo o River).

2011: começando a temporada 2011-12 ameaçado de rebaixamento, o Racing recorreu ao torcedor Diego Simeone para ser técnico. Deu certo: o clube foi vice do Apertura e El Cholo acabou rumando na virada de ano ao Atlético de Madrid para fazer história desde então com os espanhóis. Só não houve ameaça séria contra um Boca feito de ver, mais eficiente: pela segunda e última vez campeão invicto (foi a última vez que qualquer clube garantiu sem derrotas a liga), o time terminou doze pontos à frente.

2012: a temporada 2011-12 também marcou a volta da Copa Argentina. Em sua terceira edição (a primeira desde 1970), o torneio terminou decidido entre um Boca recém-vice da Libertadores e um Racing já sob comando de Luis Zubeldía (que substituía uma decepcionante volta de Basile, opção inicial dos cartolas para substituto de Simeone no Cilindro), mantendo a união da juventude de Centurión à experiência de Sand, Camoranesi e do goleiro Saja. Deu Boca, 2-1.

2015: concorrendo com o San Lorenzo, o Boca pôde ser campeão na penúltima rodada, embora sob suspense de uma derrota de 3-1 para o Racing (4º colocado) na anterior.

Boca também já sorriu seis gols (a um), nesse duelo de 1991 onde Batistuta marcou três vezes em Goycochea. À direita, a final da Copa Argentina de 2012: melhor para o carequinha Santiago Silva, autor de um dos gols do título boquense

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

19 thoughts on “Elementos em comum entre Boca e Racing

  • Navarro Montoya

    Este especial foi sensacional, tenho uma preferência pelo boca, mas confesso o Racing é algo especial….
    Valeu Caio por mais este épico especial relativo as duas mais peculiares equipes sulamericanas ao lado do Grande Penarolllll…..
    Nota 10…

  • Navarro Montoya

    Parece história mais é realidade….
    Uma vez que estava em Buenos Aires, peguei um taxi, e como gosto de futebol, não demorou muito perguntei ao taquixista, se ele gostava de futebol, ele respondeu que sim.
    Logo em seguida perguntei qual equipe torcia, ele respondeu Racing…
    QUando ele disse Racing, eu logo falei: El Gran Racing Club de Avellaneda!!!
    Imediatamente ele estacionou o carro, foi ao porta-malas, pegou uma camisa do racing, beijou-a e com os olhos com lágrimas me deu a camisa(original), me deixou no destino e só cobrou metade da corrida….
    O futebol têm destas coisas….

  • Caio Brandão

    Hahahaha. Eu tinha um papo para cada taxista conforme o time de cada um, na segunda vez em que viajei para lá. Infelizmente, nenhum foi racinguista. Mas foram legais, um cuervo até tentou me colocar dentro do Nuevo Gasómetro em plena tarde de país parado para ver Argentina x México pela Copa de 2010….

  • Carlos R Lopes

    Excelente apanhado do Futebol Argentino,um paises de melhor futebol das Americas,e ferrenho rival dos brasileiros.

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