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25 anos da Supercopa do Racing: “Campeão dos Campeões”

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Olarán, Colombatti, Costas, Ludueña, Fabbri e Fillol; Vázquez, Fernández, Acuña, Paz e Catalán

Estes vêm sendo dias de festa para o Racing: de campanhas frequentemente opacas nos últimos tempos, classificou-se à Sul-Americana. Mas, sem dúvida, o mais comemorado foi o rebaixamento do arquirrival Independiente, no último sábado, enfim igualando neste aspecto, depois de trinta anos, os gigantes de Avellaneda. Hoje, o lado blanquiceleste comemora também um quarto de século de seu último título internacional: a primeira edição da Supercopa Libertadores, alento nos terríveis anos do largo jejum nacional (1966-2001).

A Supercopa era um torneio que reunia apenas campeões da Libertadores. Como a galeria deixava de fora times de interesse midiático, os organizadores resolverem extingui-la em 1997, criando no lugar a Copa Mercosul, onde o peso da camisa definia os participantes. Mas a falta de um índice técnico também relativizou sua importância e, em 2002, passou a ser substituída pela Sul-Americana, que retomava em parte o conceito da também extinta Copa Conmebol (que, de 1991 a 1999, reunia não-classificados à Libertadores para um torneio-consolação).

Até 1988, os vencedores resumiam-se a (pela ordem cronológica) Peñarol, Santos, Independiente, Racing, Estudiantes, Nacional, Cruzeiro, Boca, Olimpia, Flamengo, Grêmio, Argentinos Jrs e River. O Racing tinha uma mancha: de todos os treze, era o único que, já vencedor da competição, fora posteriormente rebaixado. O descenso ocorrera cinco anos antes, em 1983, e o relatamos brevemente ontem, aqui. Só em 1985 La Academia voltou à elite. O técnico era Alfio Basile, antigo zagueiro do elenco racinguista campeão da Libertadores, em 1967.

Basile saíra em 1986, mas já ao fim de 1987 estava de volta ao cargo. O clube somava 20 anos sem títulos. O último havia sido exatamente a Copa Intercontinental de 1967 (a primeira vencida por um clube argentino), quando ele ainda dava ordens na zaga blanquiceleste. O incômodo seria quebrado justamente de forma internacional também. E, em meio a tanta assombração passada pela instituição (relatamos algumas aqui), naquela Supercopa o Racing deu sorte. Literalmente: por sorteio.

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A volta olímpica e o capitão Fillol com a taça

A competição se iniciaria já em mata-matas, a partir de sextas-de-final, que se encaminhariam para quartas-de-final, semifinal e final. Para resolver a questão de como seis classificados nas sextas-de-final se enfrentariam em quartas, em uma competição com treze participantes, o regulamento estipulou o tal sorteio. Por ele, o Nacional foi colocado já nas quartas, ao passo que o vencedor de um dos confrontos das sextas estaria garantido já nas semis – o jogo sorteado foi o de Santos-Racing.

Santos-Racing, por sinal, reuniria equipes que viviam situações algo parecidas. O Peixe também vivia decadência desde o fim dos anos 60, embora em menor grau (vencera o Paulista em 1973, 1978 e 1984). A Placar inclusive rotulou o Racing de “o Santos argentino” em 2001, contexto em que a equipe da Vila estava ainda caída no rótulo de “apenas um clube simpático”. O sorteio não poderia ter escolhido equipes que mais ansiavam uma resposta aos rivais, na época. No alvinegro, os nomes mais célebres eram o do goleiro Rodolfo Rodríguez e dos meias César Sampaio e Luvanor.

Já o Racing tinha o zagueiro Néstor Fabbri e o atacante Ramón Medina Bello, que, contudo, só se destacariam nos anos 90. Os mais célebres da Academia eram o artilheiro José Iglesias, o habilidoso meia uruguaio Rubén Paz, ex-Internacional e participante da Copa de 1986 (e vindo de outro Racing, o de Paris, que inspirara o de Avellaneda) e, sobretudo, um mito entre as traves: Ubaldo Fillol, que retornava depois de 15 anos ao clube que o projetara nacionalmente. Outro ídolo era o zagueiro Gustavo Costas, quem mais jogou pela Academia, 337 vezes entre 1982 e 1995.

Os nomes gravados nos duelos foram os de Iglesias e Miguel Colombatti (de 35 gols em 154 jogos, ótimos números para um volante), que selaram em escanteios os 2-0 em Avellaneda: El Toti aproveitou bola não segurada por Rodríguez e Colomba acertou um cabeceio. No primeiro jogo, a torcida já se atreveu a soltar o característico “Sí sí, señores, yo soy de Racing. Sí sí, señores, de corazón. Porque en este año, de Avellaneda, de Avellaneda, salió el nuevo campeón” (veja no primeiro vídeo). Na Vila Belmiro, empate sem gols e Racing nas semifinais.

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Miguel Colombatti, Walter Fernández e Rubén Paz, grandes destaques na Supercopa

Pela frente, duelo de gigantes argentinos, contra o River. Os de Núñez estavam na ressaca de sua melhor fase, no ano de 1986 (campeão nacional e, pela primeira vez, da Libertadores e da Intercontinental; alguns integrantes ainda venceram a Copa do Mundo pela Argentina), mas pintavam como favoritos: de 1986, ainda remanesciam Nery Pumpido, Nelson Gutiérrez, Oscar Ruggeri, Héctor Enrique, Antonio Alzamendi, Ramón Centurión e despontavam as revelações Pedro Troglio e Claudio Caniggia.

Os millonarios haviam vencido Olimpia e Grêmio e abriu o placar em Avellaneda, com Jorge Borelli (que logo iria jogar no próprio Racing, onde seria ídolo) no fim do primeiro tempo. Mas, na segunda etapa, apareceu Walter Fernández: com gols dele aos 2 e aos 17 minutos, os anfitriões venceram de virada. Também com dois gols em um 4-0, fora ele quem recolocara o Racing na elite, no último play-off de acesso em 1985, contra o Atlanta. Colombatti também marcara ali.

Na volta, Gutiérrez acertou um pênalti para colocar o River na frente e encaminhar tudo aos penais, evitados no último minuto, com um cabezazo de Fabbri. A decisão foi diante do Cruzeiro, que tinha o ex-corintiano Wladimir e dois medalhistas olímpicos de prata com o Brasil naquele mesmo ano, Ademir (que jogaria no próprio Racing em 1992) e Careca. Os comandados de Carlos Alberto Silva, que seria o técnico destes dois também nas Olimpíadas de Seul, foram outros a assustar em Avellaneda: Robson pôs 1-0 aos 36 minutos, completando em cima da linha tentativa de Careca após falha da defesa racinguista.

Mas dois gols no fim de cada tempo, com quem já vinha marcando na competição, impuseram nova virada da Academia. O primeiro, após bela jogada de Paz: com passe sutil, lançou Ludueña, que cabeceou para Omar Catalán, derrubado na grande área aos 44 minutos. Walter Fernández acertou o pênalti e, aos 43 do segundo, costurou a defesa mineira pela ponta-esquerda para Colombatti, marcar. No Mineirão, enfim o Racing voltou a conseguir acalmar sua torcida – lançado por Fernández, Catalán, em disparada, abriu o placar aos 43 minutos.

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O gol de Catalán e “o campeão dos Campeões” na capa da El Gráfico, com Fernández e Costas

O detalhe é que Catalán era um atacante fracassado na equipe: jogou apenas 25 vezes e marcando só 4 pelo clube, sendo ainda torcedor do Independiente, mas eternizado a partir dali. Atrás, Fillol garantia a segurança visitante, até um bate-rebate em escanteio aos 37 do segundo resultar em novo gol de Robson, retomando a tensão: aos 44, Heraldo e Colombatti acabariam expulsos. Aos 46, a Raposa ainda teve duas chances na grande área, rechaçadas pela defesa. O juiz encerrou com os argentinos no contra-ataque do lance.

A Supercopa renovou os ares pelos lados azuis de Avellaneda, que recebeu de volta um antigo filho, Julio Olarticoechea. Na temporada argentina seguinte, a equipe terminou o primeiro turno do campeonato de 1988-89 na liderança. Mas o boom acabou não duradouro: exatamente na última rodada do primeiro turno, em confronto direto contra o Boca, segundo, no Cilindro, um rojão racinguista atingiu o goleiro boquense Carlos Navarro Montoya. A partida foi suspensa ainda sob empate, mas o tapetão deu vitória aos auriazuis. O Racing desandou na metade seguinte, terminou apenas em 9º e seus principais nomes saíram: Paz (que havia sido eleito em 1988 o melhor jogador sul-americano), Fillol, Iglesias, Medina Bello, Fernández e Basile.

O campeão foi justamente o Independiente. Com o tempo, o peso do jejum nacional voltou a se fazer forte e apenas em 2001 voltou a ser campeão, não sem (muito) drama. Contamos aqui. Mas, há 25 anos, o clube seguia sua característica vanguarda: o primeiro campeão argentino não-britânico (e bi, e tri, e tetra, e penta, e hexa e… hepta seguido, ainda um recorde seu), o primeiro campeão entre os cinco grandes, o primeiro tricampeão seguido no profissionalismo e o primeiro argentino campeão do mundo se tornava também o primeiro “campeão dos campeões”, como bem intitulou uma capa da El Gráfico.

FICHA DA PARTIDA – Cruzeiro: Wellington, Balu, Gilmar Francisco, Heraldo e Wladimir, Éder, Ademir, Heriberto (Ramon 1/2º) e Anderson, Robson e Careca. T: Carlos Alberto Silva. Racing: Ubaldo Fillol, Carlos Vázquez, Gustavo Costas, Néstor Fabbri e Carlos Olarán, Jorge Acuña, Miguel Ángel Ludueña, Miguel Ángel Colombatti e Rubén Paz (Hugo Pérez 34/2º), Omar Catalán (Ramón Medina Bello 27/2º) e Walter Fernández. T: Alfio Basile. Árbitro: Juan Cardelino (URU). Gols: Catalán (43/1º), Robson (37/2º)

http://www.youtube.com/watch?v=uclxcth8E2E

http://www.youtube.com/watch?v=LAVqIbqWZJU

http://www.youtube.com/watch?v=XsIsQ48iDN8

http://www.youtube.com/watch?v=AzfNv-IdUdA

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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