EspeciaisRacing

Racing e suas eliminações precoces na Libertadores

Racing01
Não deu, Milito

O Racing é o gigante argentino que menos Libertadores disputou, reflexo da crise que virou sinônimo do clube no último meio século. Mesmo o San Lorenzo que tanto sofreu pela falta do título acumula mais participações – o que ocorreria até se contabilizarmos apenas as ocorridas desde 2000. A frustração, não bastasse isso, também se dá desde o título de 1967 pelo gosto sempre presente de que não era complicado ir mais longe nas campanhas seguintes.

Em 1968, como campeão do ano anterior, La Academia adentrou já na fase semifinal, tendo pela frente um fortíssimo Estudiantes. A equipe de La Plata havia batido o próprio Racing na final do Metropolitano de 1967, mas a menos de duas semanas dos alvicelestes decidirem a Libertadores e estes usaram um time misto. Os alvirrubros até haviam demonstrado força liderando sem sustos um grupo que contava com outro gigante, o Independiente, humilhado em Avellaneda com um 4-2. Na primeira semi, em La Plata, foi a vez de surrarem o Racing, por 3-0.

Mas não era o fim do mundo: uma vitória simples em casa, pelo regulamento da época, bastaria para manter La Acadé viva, pois forçaria um terceiro jogo. No Cilindro, ela venceu por 2-0. A amargura se deveu exatamente às circunstâncias do jogo-desempate: mais experiente, controlava-o e a dois minutos do fim, ainda no 0-0, poderia ter vencido se o árbitro interpretasse pênalti em um epurrão do pincharrata Néstor Togneri dentro da grande área em Humberto Maschio.

A partida, no neutro Monumental de Núñez, seguiu à prorrogação e o melhor saldo daria ao Estudiantes a vantagem do empate. E ele abriu o placar, com Juan Ramón Verón, o igualmente craque pai de Juan Sebastián, marcando de bicicleta aos sete minutos do tempo extra. O Racing até empatou, mas tarde demais, já aos 14 do segundo tempo. Ironia: de pênalti. E o Estudiantes, clube de porte apenas médio, adiante seria campeão, pela primeira vez.

Desde 1967 o Racing já não conseguiu nenhum título. A Libertadores era enxuta e só admitia dois representantes por país, e o futebol argentino fornecia essas vagas aos campeões dos dois campeonatos anuais que vigoraram entre 1967 e 1985 (Metropolitano e Nacional). Não fosse por exceções, o clube só voltaria a jogar quando quebrou em 2001 seu jejum nacional. As exceções foram 1989 e 1997.

racing02
O lance que poderia ter colocado o Racing na final da Libertadores de 1968

Na maior parte dos anos 80, a Libertadores se desenrolava no segundo semestre. Isto se alterou em 1989. O Argentinão se modificara em 1985, voltando a ser um único por temporada – mas definiu-se que ela seria à moda europeia, começando na metade final de um ano para terminar na metade inicial do seguinte. Assim, a Libertadores de 1988, ainda no segundo semestre, contou com os representantes da temporada 1987-88, mas a de 1989, que ocorreria no primeiro, seria disputada ainda antes da conclusão da temporada 1988-89. Solução: dar as vagas ao líder e vice-líder do primeiro turno.

Racing e Boca dividiam essa liderança parcial e assim jogaram a Libertadores 1989. Classificado à segunda fase, o Racing, que ainda em 1988 encerrara a seca de títulos ao faturar a Supercopa, pegaria um representante do forte narcofútbol colombiano da época, presente em três finais entre 1985 e 1987. Mas o Atlético Nacional não tinha histórico forte: só três participações e todas encerradas ainda na primeira fase. O clube até venceu por 2-0 na ida, em Medellín. Só que os argentinos devolviam em casa o placar, o que forçaria decisão por pênaltis. E para isso tinham um especialista: o veterano Ubaldo Fillol, exatamente o goleiro recordista de defesas de pênalti na Argentina.

Contudo, a quatro minutos do fim os visitantes diminuíram em arremate que desviou na zaga racinguista e encobriu Fillol além do calculado. A amargura alviceleste só aumentaria: o algoz sem tradição acabaria sendo justamente o primeiro colombiano campeão da Libertadores. E o campeonato de 1988-89 seria conquistado justo pelo arquirrival Independiente…

No segundo semestre de 1991, o futebol argentino voltou a reinstituir dois campeonatos anuais, agora o Apertura e o Clausura. A Libertadores seguiria enxuta até 2000, com dois representantes por país com os argentinos voltando a fornecer só os campeões anuais. Em algumas vezes um mesmo time conseguiu ambos os títulos, possibilitando a participação dos vices – estes decidiriam em um play-off a vaga continental. A temporada 1995-96 foi bisada pelo Vélez, com o vice do Apertura 1995, o Racing, levando a melhor sobre um time que consegue ser mais azarado, o Gimnasia LP, vice do Clausura 1996.

Racing03
Outra queda precoce nas semis: Sporting Cristal em 1997

Contamos neste outro Especial o que aconteceu: o Racing não convenceu na primeira fase, mas permitiu a seu torcedor sonhar após eliminar os pesadíssimos River (detentor do título) nas oitavas e Peñarol nas quartas. As semis reservariam clube sem força histórica na Libertadores de um país idem: o Sporting Cristal, do Peru. A metade alviceleste de Avellaneda já se projetava em nova final exatos trinta anos depois do título de 1967. Venceu em casa para conseguir perder de 4-1 em Lima…

O título do Apertura da temporada 2001-02 rendeu a ida à Libertadores 2003. Dessa vez, o Racing, que celebrava seu centenário, empolgou na fase inicial, invicto com direito a duas vitórias fora de casa. O então jovem Diego Milito, ainda reserva no título argentino, havia deslanchado como grande figura, com Lisandro López sendo o reserva. A Placar escreveu na época que ele “mostra o futebol mais bonito da Argentina na atualidade”, com o meio-campo sendo “o grande trunfo e lembra os tempos românticos do futebol, com três jogadores cerebrais (Peralta, Mirosevic e Mariano González) e só um volante de contenção (Bastía). De quebra, o goleiro Campagnuolo é um dos poucos confiáveis do país”.

O adversário nas oitavas seria o América de Cali, um clube que havia levado de 5-0 em casa, ainda que fosse para o celebrado Santos de Diego e Robinho. “O América tem bastante tradição na Libertadores, mas a atual equipe é muito frágil. (…) Se passar de fase, vai ser uma grande surpresa”, relatou a Placar. A ida foi na Colômbia e Milito buscou um empate em 1-1, o que facilitaria a tarefa em casa. Mas Avellaneda viu um zero no placar. E os donos da casa sucumbirem nas primeiras cobranças alternadas de pênaltis. E o América ainda eliminaria categoricamente o River, que tirara um ótimo time do Corinthians para levar de 4-1 em Cali, caindo só nas semifinais para o futuro campeão Boca…

A sensação de eliminação precoce volta a se repetir em 2015, levando-se em conta o porte modesto do Guaraní mesmo no futebol paraguaio e o fato da derrota mínima em Assunção, mas suficiente para a classificação aurinegra pelo 0-0 em Avellaneda, ter vindo no finzinho do jogo. Lamentações e lamentações na Acadé, ainda mais levando-se em conta que as semis seriam contra o River, clube contra quem tem excelente retrospecto quando há disputas diretas – confira.

Poderia ainda haver uma participação racinguista na Libertadores 2011. Os argentinos seriam representados pelo campeão do Clausura e do Apertura de 2010 e pelos três melhores não-campeões na tabela anual agregada. Mas com o decorrer da Sul-Americana 2010 definiu-se que seu campeão jogaria a Libertadores 2011. E se o campeão fosse argentino, as vagas dos não-campeões no agregado caseiro se reduziriam a duas. O Racing ficaria com a última das três, mas há coisas que só ocorrem com o Racing: a Sul-Americana foi realmente conquistada por um time argentino. O Independiente.

Racing04
Milito, terceiro em pé, e os pênaltis em 2003

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

10 − três =

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.