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Há 40 anos, Maradona estreava pela seleção argentina

Maradona foi mesmo um fenômeno. Estreou no futebol adulto com 15 anos e na seleção com 16, partida esta que completa hoje 40 anos. Só não igualou Pelé como campeão mundial aos 17 por “culpa” de César Menotti, ainda assim o melhor técnico que tivera na opinião do próprio Dieguito. O jogo foi um 5-1 sobre a Hungria (curiosamente, o mesmo país que levaria os primeiros gols maradonianos em Copas do Mundo e contra quem Lionel Messi também estreou pela Argentina) em La Bombonera. Entrou aos 20 minutos do segundo tempo no lugar do atacante Leopoldo Luque, autor de dois gols. Mesmo com poucos instantes, foi bem avaliado.

Menotti cometeu a heresia histórica, mas teve inegável olho clínico. El Flaco, contra os conservadores, seria campeão com diversos jogadores pinçados quando ainda jogavam no interior do país, política nunca feita antes, abrindo mão de gente badalada de clubes mais midiáticos. Olho que enxergou Maradona numa época em que ele mal tinha um semestre de carreira. Afinal, havia estreado no futebol adulto em 20 de outubro de 1976, na derrota de 1-0 de seu Argentinos Jrs para o Talleres.

“Todo mundo se aproximou no vestiário para felicitá-lo, especialmente as pessoas dos juvenis. Para elas, era um triunfo que um dos garotos estreasse nessa idade. Diego pôs uma cara de felicidade que não me esquecerei. Todos lhes dissemos que a derrota não importava”, relatou o volante Miguel Gette naquela ocasião. Diego, ainda assim, só pôde marcar em uma partida até então: foi contra o San Lorenzo de Mar del Plata (onde jogava o artilheiro do torneio nacional de 1976, Norberto Eresuma), que levou dois gols em derrota de 5-2.

O Argentinos Jrs, que antes da estreia do craque estava a um ponto dos líderes do seu grupo, terminou nove atrás. Ou seja, Menotti chamava uma promessa de dois gols e quatro meses de carreira, ainda que já com alguma fama prévia – Diego só não estreara antes em função de uma suspensão.

Há 40 anos, a Argentina formou com Hugo Gatti, Alberto Tarantini, Jorge Olguín, Daniel Killer e Jorge Carrascosa, Osvaldo Ardiles, Américo Gallego e Ricardo Villa, René Houseman, Leopoldo Luque e Daniel Bertoni, autor dos outros três gols. Darío Felman e Jorge Benítez também jogaram, substituindo respectivamente Houseman e Villa. Mas, dos reservas, só Maradona mereceu nota da revista El Gráfico. Eis a avaliação que ela fez dos onze titulares mais aquele adolescente (imagem abaixo):

Gatti (nota 9): “metido no jogo, cada segundo dos 90 minutos. Resolvendo os problemas de todos”.
Tarantini (nota 8): “muito bem na sua dupla função: defendendo e atacando. Forte, decidido, o melhor do fundo”.
Olguín (nota 6): “com momentos muito bons, velocidade física e mental e com passagens de insegurança”.
Killer (nota 6): “ainda não sincroniza bem suas saídas com o resto da defesa para fazer a linha de impedimento”.
Carrascosa (nota 7): “impecável na marcação pessoal, os cruzamentos, e em saídas com bola dominada”.
Ardiles (nota 7): “respeito muito superado para o trotador do segundo semestre de 1976. Não se desanimou apesar do pênalti”.
Gallego (nota 7): “o homem que equilibra toda a equipe, relevando os que vão e acompanhando a todos”.
Villa (nota 10): “a grande figura da equipe. Condutor por ascendência de jogo e hierarquia. Armando e chegando”.
Houseman (nota 6): “longe, aí por 30% do Houseman astuto, criador e hábil que conhecemos. Duas jogadas em 90 minutos”.
Luque (nota 10): “o grande responsável pela mudança ofensiva que a Argentina mostrou”.
Bertoni (nota 9): “a grande quota de potência que a seleção anda precisando desde que Kempes foi embora”.
Maradona (nota 7): “entrou nos últimos 25 minutos. Atrevido, malicioso, encarador. Estreia muito boa”.

As estatísticas fornecidas logo após a partida também informam que Maradona ofereceu oito “bolas bem jogadas”, perdeu sete vezes a bola e sofreu uma falta. 

Valem algumas observações: Kempes é mencionado como quem foi embora – ele havia ido ao Valencia em 1976 em uma época em que ir à Europa mais atrapalhava do que ajudava os jogadores a manterem-se na seleção, só sendo chamado de volta por Menotti às vésperas da estreia na Copa. Gatti lesionara-se nos fins de 1977 e não iria ao mundial (os reservas Felman e Benítez também não, apesar do título na Libertadores de 1977 com Gatti pelo Boca). Carrascosa, então capitão, também não iria, mas por desistência em cima da hora, supostamente por razões políticas – foi só assim que Daniel Passarella pegou a braçadeira.

Já o nota 10 Villa, que Menotti promovera em 1975 na seleção ainda como jogador do Atlético de Tucumán (viraria ídolo histórico no Tottenham conforme contamos aqui), “roubaria” de Maradona uma das vagas de meia-armador no mundial, ainda que Diego começasse a despertar já em 1977 – fez doze gols no Torneio Metropolitano, que lhe permitiram jogar mais duas vezes pela Argentina naquele ano (ambas contra o Paraguai, em agosto). 

Antes da Copa, Maradona defenderia a Albiceleste uma vez mais, em 19 de abril de 1978, contra a Irlanda (afinal, no mês anterior havia marcado três vezes em um 5-2 fora de casa no Atlanta). Foi a última vez em que começou a partida no banco por seu país. E foi a partir do corte que ele desembestou a fazer gols: em maio, já fora da concentração da seleção, pegou o Torneio Metropolitano andando para sagrar-se pela primeira vez artilheiro do campeonato.

Com menos de vinte anos, em 1980, já tinha cinco artilharias, ainda um recorde exclusivo seu na Argentina: Metro 1978, Metro 1979, Nacional 1979, Metro 1980 e Nacional 1980. Desempenho que o recolocou na seleção e o pôs no Boca em 1981. O resto é a história conhecida do único argentino que esteve em quatro Copas do Mundo.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

2 thoughts on “Há 40 anos, Maradona estreava pela seleção argentina

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