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50 anos sem o primeiro maestro do futebol argentino: Gabino Sosa, “o Repentista da Redonda”

No início dos anos 20 do século passado, a mais tradicional revista esportiva argentina (El Gráfico, que circulou de 1919-2018) já fez uma primeira eleição sobre quem seria o maior jogador já visto até então. O público apontou que seria José Piendibene, longevo craque do Peñarol que simbolizou a remontada da seleção uruguaia para cima da Albiceleste, fazendo dos charrúas os novos donos de um clássico onde eram fregueses nos primórdios. Mas, segundo nota da mesma El Gráfico já em 1934, o próprio Piendibene se dizia inferior a Gabino Sosa, cujo apelido já indica seus atributos: El Payador de la Redonda, “O Repentista da Bola”. Sosa também foi ídolo de outros charrúas, o que o fez ser respeitado pelos rivais Rosario Central e Newell’s. Vale relembrar El Negro, maestro da chamada “escola rosarina”, ícone também do primeiro título da seleção argentina e falecido há exatos 50 anos.

O estilo de Gabino

Antes de resumirmos sua carreira, convém trazer mais descrições de época para realçar a introdução acima. A começar por outra publicação que mostra que as comparações entre Sosa e Piendibene (não só em relação à habilidade, mas também à longevidade e extrema fidelidade a seus clubes de origem) não se resumiam à imprensa do Rio da Prata; foi da revista chilena Estadio, nos anos 40:

“O Chile lembra com carinho da figura de Gabino Sosa. Através dos anos, essa lembrança se engrandeceu, como lógico pagamento do passado, e poucos nos custa hoje em dia, ao tributar-lhe esta homenagem, encontrar palavras adequadas que levem ao público leitor a verdadeira impressão do que foi o grande maestro. Porque Gabino Sosa foi, igual a seu colega uruguaio Piendibene, um artista do futebol. Só três casos de continuidade futebolística se conhecem na América do Sul; três casos que arrancaram os mesmos adjetivos e obrigaram os jornalistas a usar sem receios o signo de admiração. Os mesmos três que em seus países foram reconhecidos como figuras máximas dos campos: Friedenreich no Brasil; Piendibene no Uruguai e Gabino na Argentina. Durante 20 anos, estiveram assombrando multidões”.

A Estadio também destaca a opinião de Piendibene e menciona até o redator daquela nota de 1934 da El Gráfico, o uruguaio apelidado de Borocotó: “uma vez, perguntaram a Piendibene: ‘a quem considera você o melhor jogador de sua posição?’. E, sem titubear, o crack oriental respondeu: ‘Gabino Sosa’. Bastaria este elogio para ter uma impressão real do que foi o jogador rosarino. Borocotó disse uma vez: ‘aquele negro Gabino das lendas violeiras fez vibrar clarins nas premiações e pôs nas esteiras o retumbar dos canhões revolucionários. Este outro Gabino pulsou o violão de sua arte na grama, derramando generosamente toda a beleza de suas concepções clássicas; sentou cátedra de um futebol que se vai. Seus passes, seus dribles, todo esse acúmulo de privilégios que constituíram sua figura de jogador, foram nazarenas gaúchas que sobre o verde dos fields deixaram lembranças que ainda revivem quando Sosa, evocando façanhas, passa pelos campos blindando o ontem. (…) Sem pertencer a nenhum dos dois clubes grandes de Rosario, Sosa foi o homem mais querido e respeitado da cidade”.

Gabino, que retribuía as gentilezas dizendo-se inferior a Piendibene, reforçava de outro lado as comparações ao destacar que a tal da “escola rosarina” que tanto regeu era mais próxima do estilo uruguaio do que o praticado na capital Buenos Aires. Foi o que expressou naquela referida nota de 1934 a Borocotó (que o entrevistou em um casamento onde o jogador era padrinho, encerrando a matéria assinalado que os noivos haviam ido embora antes do astro tão amado pelos convidados):

Na primeira seleção em que brilhou, a rosarina: é o agachado ao meio, com o mascote

“Vou te falar com respeito ao futebol de outros tempos, das minhas melhores épocas. Opino que o futebol rosarino foi mais armado do que o portenho. Nós jogávamos para nosso quadro e com três ou quatro passes, já estávamos prontos para o chute a gol. Os portenhos buscaram mais o brilho pessoal. Nós queríamos ganhar jogando todos e sem egoísmos. Que o goal o fizesse quem tivesse mais chance. Em Buenos Aires, sem dúvida pelo desejo de agradar cada um a torcida de seus clubes, os homens jogavam muito individualmente, mas sem ordem. As seleções rosarinas sempre pareceram teams de clubes onde os homens se entendiam bem; os portenhos deram a impressão de ser seleções de muita força individual, mas pouca coletiva”.

De fato, embora ele chegasse a ter um recorde de gols em um só jogo pela Argentina (já chegaremos lá), marcou poucos para um centroavante: hoje a página oficial do Central Córdoba consignou que Sosa marcou 116 em 408 jogos. As descrições de seu estilo de jogo na época cairiam bem ao que se hoje atribui ao “falso 9” consagrado pelo rosarino Messi. Gabino era um centroavante que recuava para municiar os colegas de ataque. Como em um 4-0 em que a seleção rosarina aplicou sobre o próprio Barcelona, por sinal, em visita catalã em 1929 – onde salvou-se que os dois primeiros gols vieram de assistências de Sosa, em tempos em que esse atributo era menos registrado do que hoje. É, em resumo, outra descrição feita pela revista chilena Estadio, nos anos 40:

“No ano de 1924, reconhecidos seus indiscutíveis méritos, lhe designam para integrar o combinado argentino que deve enfrentar os campeões olímpicos uruguaios, e aí Gabino Sosa dissipa toda dúvida de que é o valor maior de sua posição. Logo o vimos atuar no Sul-Americano de 1926, em Santiago, e sua lembrança já não nos abandonará jamais. O futebol rosarino se sente atraído por sua modalidade e imita seu jogo, o mesmo que ainda perdura e que levemente vai se perdendo. Foi, sem lugar a dúvidas, o criador de um estilo. Fazia jogar o ataque em forma de leque, correspondendo a ele a parte organizadora, a do que verdadeiramente dirige uma linha. Atrás de todos os seus companheiros, acompanhado de perto por seus interiores, a precisão de seus passes curtos encontrava fácil caminho entre as defesas adversárias. Seus interiores sempre terminaram scorer.”.

Em outro trecho, a mesma nota opina que “acreditamos que a continuidade de seu jogo se deve particularmente a saborear a missão de diretor, a de ser como guia para seus companheiros, a de sentir a satisfação enorme de entregar um ‘gol feito’ após uma série interminável de jogadas magistrais. Porque Gabino nunca foi egoísta (…). Também Borocotó disse sobre ele: ‘nunca eletrizou as multidões; jamais sacudiu violentamente as redes. Os postes não sentiram o chicote de seus tiros. Foi sereno, amável, persuasivo. Convencendo em cada passe, chegou ao gol para endereçar a bola como se usasse a mão, carinhosamente, sem fazê-la sofrer. E, na maioria das vezes, por não pecar de egoísta e não assinar a jogada com uma conquista material, deu a bola a outro’”.

Também dos anos 40, o jornal santafesino Litoral exaltou a figura do ídolo cujo auge já datava de vinte anos antes: “aquilo de ‘todo o tempo passado foi melhor’ tem nesse caso sua plena confirmação. E não é produto do espelhismo, nem da nostalgia dos tempos passados. É a realidade clara e firme, que não admite discussões. Fruto de vivência e da sutileza no manejo da bola eram gos gols de Gabino. Gostava de leva-la em zigue-zague sobre o peito do pé, esquivando de adversários para deposita-la suavemente em um dos rincões da rede. Não lhe agradavam os ‘golaços’, esses que se produzem por bombas, o arremate violentíssimo. Para quê? Fazer gols assim exigem chute forte. Fazê-los como Gabino exigiam saber jogar muito bem…”.

A primeira Argentina campeã da Copa América, em 1921: Américo Tesorieri, Miguel Dellavalle, Emilio Solari, Alfredo López, Florindo Bearzotti e Adolfo Celli; Pedro Calomino, Julio Libonatti, Gabino Sosa, Raúl Echeverría e Jaime Chavín. À direita, o perfil da revista Estadio traduzido no terceiro parágrafo

Todas essas exaltações foram encaminhadas pelo historiador Esteban Bekerman, dono da única livraria de futebol em Buenos Aires, a Entre Tiempos. E há espaço para mais algumas. Como a de que “dizem que mais do que um esportista, era um artista. Um inventor de arabescos e sutilezas que embelezavam cada uma de suas manobras” ou que o apelido de Payador de la Redonda se devia por ter “posto letra e música na bola” (embora valha lembrar que o xará Gabino Ezeiza, ele sim um músico e falecido ainda em 1916, era figura consagrada na época com o apelido El Payador). Ou ainda a de que o homem nascido em uma humilde família mestiça em 4 de outubro de 1899 no bairro rosarino de La Sexta, na rua Alem, matriculou-se como jogador de futebol “no colégio de todos: a rua”, enquanto o segundo grau “cumpriu no Central Córdoba e no Central Córdoba se fez universitário do futebol”, posteriormente se tornando “o decano dos catedráticos” da bola. Ou “o último baluarte daqueles tempos em que não havia contratos nem tapetão”.

Hora de, enfim, sermos mais objetivos sobre a carreira de um personagem esquecido do grande público – em parte porque o Central Córdoba, embora visto como a terceira força da cidade de Rosario, nunca passou muito da aura de clube “simpático” ao invés de fomentar alguma rivalidade intensa com a duopólio Newell’s x Rosario Central. E em parte porque a despeito disso, Sosa sempre recusou ofertas que apareciam de Buenos Aires, tendo tamanho espírito amador que a ele bastava como pagamento a entrega de bonecas para suas filhas. Outra história que será mais detalhada a seguir.

A carreira amadora

Não são poucos os clubes argentinos originados no início do século XX a partir de trabalhadores britânicos recrutados para as ferrovias construídas a rodo. Se a própria capital federal tem o Ferro Carril Oeste e o Ferrocarril Midland, de nomes autoexplicativos, no país adentro o setor de oficinas da empresa Ferrocarril Central Argentino (que ligava Rosario a Córdoba) originou o Rosario Central – a quem Sosa e muitos de sua época chamavam de Talleres, a palavra castelhana para “oficinas”. E foi das oficinas do Ferrocarril Central Córdoba, que ligava a capital da província cordobesa a interiores mais profundos, que realmente saiu o clube denominado de Talleres mesmo. Essa mesma empresa germinou em Córdoba o clube Instituto. E, nas províncias vizinhas, pariu pelo menos duas equipes de nome Central Córdoba: a rosarina e a que hoje está na elite argentina representando Santiago del Estero.

Gabino Sosa chegou ao Central Córdoba como empregado da ferrovia, justamente, apadrinhado por Blas Sosa, um irmão mais velho que defendera o clube antes (“não conseguiu destacar-se muito porque era nervoso”, explicaria El Negro naquela nota de 1934). Com 17 anos, Gabino fez em 1916 uma primeira aparição no time sub-19 dos charrúas, apelido que era um trocadilho gozador com Claro Charras, representante do clube na liga rosarina – e que acabou aceito pelos simpatizantes rubroazuis, que viam na expressão um símbolo de resistência do conhecido povo indígena uruguaio tão invocado pelo futebol celeste.

Com apenas um jogo pelo sub-19, Gabino foi promovido ao adulto, ainda que inicialmente na ponta-esquerda, estreando contra o Provincial pelo campeonato rosarino; é que, apesar do nome, o campeonato “argentino” era restrito oficialmente a times da Grande Buenos Aires e La Plata, só vindo a admitir em 1939 a dupla Newell’s e Central. A carreira de Sosa é também o retrato de uma época em que não só a liga rosarina tinha muito mais importância, ao agrupar esses dois clubes, mas também a própria seleção de Rosario. Para a qual ele já foi convocado com apenas sete partidas pelo time adulto do Central Córdoba, incluindo uma semifinal contra o Independiente em 5 de novembro de 1916 pela Copa Competencia – um embrião de Libertadores que opunha clubes de Rosario, Montevidéu e da Grande Buenos Aires.

O dia do gol olímpico: ex-jogador Pedro Calomino convertido em bandeirinha, o técnico Ángel Vázquez, Segundo Médici, Américo Tesorieri, Mario Fortunato (futuro técnico do Botafogo), Emilio Solari, Florindo Bearzotti e Adolfo Celli; massagista Kanichi Hanai, Domingo Tarasconi, Ernesto Celli, Gabino Sosa, Manuel Seoane e Cesáreo Onzari.

O perfil de Gabino no livro Quién es Quién en la Selección Argentina, publicado em 2010, chega inclusive ao ponto de dizer que “talvez nele se reúnam todas as características que fizeram destacado, desde sempre, o jogador rosarino, a cuja denominada escola ele representou como poucos. Hábil para o drible, ágil nos deslocamentos, potente e preciso para definir. Talentoso. De grande categoria. (…) São muitos os que sustentam que o melhor de Gabino Sosa foi nos famosos jogos internacionais não-oficiais que os combinados rosarinos da época jogavam contra uruguaios ou visitantes estrangeiros”. Mas ele próprio dizia que a estreia já representou uma primeira tristeza no futebol, naquela nota de 1934:

“Porque perdemos por 3-1. Me marcava El Negro [Juan] Delgado. Muito habilidoso, me tocava num pé de maneira tal que me emaranhava com o outro e caía. Essa manobra realizava tão bem que nunca apitavam foul. Apesar disso, creio que minha atuação não foi má, porque de imediato me puseram de centreforward no team que jogou contra os portenhos um match que se empatou em dois tentos”.

Aquela viagem a Montevidéu para o jogo, realizado em 19 de novembro de 1916 no Gran Parque Central, não só colocou pela primeira vez Sosa e Piendibene em um mesmo campo.

Ela também fez Gabino receber suas primeiras calças compridas, para a recepção social de gala que se promoviam em tempos de cavalheirismo entre as federações.

Uma revanche foi concedida em 9 de julho de 1917, no estádio do Gimnasia y Esgrima de Rosario. Sosa já atuou na meia-esquerda, sem ainda evitar nova derrota, de 1-0. Ainda verde, o garoto chegou a ser realocado no time B do Central Córdoba naqueles primeiros anos e foi figura ausente do duelo de 1918 entre as duas seleções (Uruguai 3-1, em Montevidéu). Mas, em 28 de setembro de 1919, desafogou: fechou a goleada de 4-1 para a equipe que tinha ainda o único a defender a seleção argentina como jogador de Newell’s e Rosario Central (o ponta-esquerda Juan Francia) e dois futuros colegas de Sosa na histórica Copa América de 1921: o zagueiro Adolfo Celli e o ponta-direita Julio Libonatti, futura figura histórica também no futebol italiano a serviço do primeiro Torino campeão e da Azzurra.

Em 1920, Gabino já estreou por outra seleção que não a rosarina. Ainda não era a argentina: é que, deslocado a Córdoba para cumprimento do serviço militar obrigatório, ele foi realocado no braço cordobês da ferrovia. E defendeu naquele ano não apenas o recém-fundado Instituto, com o qual terminou artilheiro da liga cordobesa daquele ano (com sete gols), mas também a seleção de lá no então prestigiado campeonato argentino de combinados regionais – e também em um amistoso de Córdoba contra a própria seleção argentina, vencedora por 4-2 em 18 de julho. Sua inclusão não foi sem polêmica alheia, gerando pedidos de que as seleções regionais só contassem com filhos da casa.

Em meio a isso, a seleção argentina viu-se em outra encruzilhada. É que seu campeonato oficial foi esvaziado dos principais clubes ainda em 1919, com River, San Lorenzo e a dupla Racing e Independiente abrindo uma liga à parte enquanto Boca e Huracán foram as forças restantes na oficial. Sem poder recorrer a muitos craques dos clubes renegados (a reunificação só se daria em 1926), a federação buscou reforços no interior para não fazer feio na Copa América de 1921, apenas a segunda sediada em Buenos Aires.

Outros registros do dia do gol olímpico. Sosa aparece na imagem inferior esquerda no pontapé inicial simbólico. Ao meio, a retirada uruguaia. E diversas fotos da invasão de campo da plateia comovida pela desforra nos campeões olímpicos

Miguel Dellavalle, outro presente na seleção cordobesa que enfrentara a argentina em 1920, veio do Belgrano para ser em mais de cinquenta anos o único que a Albiceleste convocou diretamente do futebol cordobês (seu sucessor? Mario Kempes, do Instituto em 1973). Também houve espaço para quem jogava no ignoto Belgrano de Rosario mesmo, o zagueiro Florindo Bearzotti. Os citados Celli e Libonatti, além do centroavante Blas Saruppo, vinham do Newell’s. O ponta-esquerda Vicente González trazia ainda mais exotismo, proveniente do Gimnasia y Esgrima de Mendoza. Gabino Sosa, por sua vez, tornou-se o primeiro dos seletos quatro jogadores aproveitados pela Albiceleste como atletas do Central Córdoba.

Mesmo desfalcada, a Argentina começou batendo o detentor do título, o Brasil – onde o Jornal do Brasil chegou a atribuir o único gol a Sosa, embora o autor real fosse Libonatti, em possível confusão a uma de tantas assistências sem registros de Gabino. Os hermanos adiante sagraram-se campeões pela primeira vez, no que é apontado como a primeira grande comoção popular pelo futebol, com os jogadores carregados pelo público em procissão pelas ruas de Buenos Aires. Também foi o primeiro troféu à carreira do Payador de la Redonda, cujo Central Córdoba normalmente não ia além do terceiro lugar em uma duopolizada liga rosarina.

O grosso das partidas de Gabino pela Argentina deram-se ao longo daquela cisão que o campeonato argentino teve entre 1919-26. Em meio a ela, também continuava defendendo a rosarina, que voltou apenas em 1º de julho de 1923 a encarar o Uruguai. E venceu-o pela primeira vez em Montevidéu: Vicente Aguirre, o segundo jogador do Central Córdoba aproveitado pela seleção argentina, fez na ocasião os três gols da vitória e o primeiro surgiu a partir de passe fornecido pelo colega de clube. Enquanto isso, a seleção argentina preferiu concentrar-se nos clubes de Buenos Aires para a Copa América realizada de outubro para novembro daquele ano. O mesmo Uruguai foi campeão e levou a única vaga para as Olimpíadas de 1924.

Enquanto os Jogos de Paris viam o nascimento da Celeste Olímpica, a Argentina teve como chamariz internacional um amistoso contra o clube inglês Plymouth Argyle. Que, mesmo inexpressivo na terra natal, justificou o cartaz da superioridade do futebol britânico já profissionalizado ao inicialmente vencer a Argentina por 1-0 em 22 de junho e, por 4-0, uma seleção secundária do Uruguai em 4 de julho. Ausente no primeiro jogo da Argentina, Sosa foi recrutado para a revanche, em 29 de junho. E fez os dois gols de vitória por 3-0. O Plymouth seguiu viagem para Rosario para novos duelos contra Sosa, agora pela seleção rosarina, que segurou um 0-0 em 6 de junho e venceu por 2-1 dois dias depois.

Os ingleses voltaram a vencer uma Argentina sem Gabino em 13 de julho e ficaram no 1-1 na revanche dos uruguaios em 18 de julho. A turnê se encerrou com a segunda revanche oportunizada à Albiceleste, em 20 de julho: Sosa estava em campo de novo e de novo quem jogou com ele não perdeu. Foi 1-0, no estádio do Sportivo Barracas. Que, dali a três meses, recebeu um Argentina x Uruguai que renderia o primeiro encontro dos hermanos contra o elenco recém-campeão olímpico. A expectativa foi tanta que dez mil interessados ficaram de fora do estádio, sendo acalmados por megafones instalados nos arredores para narrações da partida.

A seleção em 1926, ano em que Sosa praticamente se despediu da Argentina (é o homem atrás do mascote), ainda deixando Guillermo Stábile (de terno) na reserva – e ano de seu embate contra o Espanyol do goleiro Ricardo Zamora, abrindo um 3-0 pela seleção rosarina

A história mais conhecida daquele jogo é de que ali ocorreu o primeiro gol olímpico legítimo, anotado logo aos 12 minutos pelo ponta Cesáreo Onzari. As estatísticas também registram que os outros gols foram de Pedro Cea no empate provisório uruguaio e de Domingo Tarasconi para dar a vitória aos anfitriões. Para notícias da época que passaram décadas esquecidas sob poeira até o advento de hemerotecas virtuais, contudo, o melhor em campo naquela partida histórica (tão comovedora que os uruguaios, revoltados, se retiraram de campo a quatro minutos do fim enquanto a plateia da casa invadia o gramado para carregar os heróis carimbadores da faixa olímpica) teria sido Gabino – cuja modéstia o fazia desmentir isso, segundo outra informação naquele seu perfil no livro de 2010.

Com o Central Córdoba nunca páreo para furar o duopólio, Sosa desafogava também na seleção rosarina naqueles tipos de torneios amistosos opacados pelo tempo e pela insensibilidade dos sedentários que definem com suas canetas o que é oficial e o que não é. Como o Torneio Interprovincial que celebrou em outubro de 1925 pomposamente os 200 anos de Rosario, com a seleção da casa recebendo as das cidades de Tucumán, Paraná e Santa Fe. Sosa deixou dois gols em um 7-0 nos tucumanos, outro em 9-1 nos paranaenses de Entre Ríos e por fim mais um em 4-2 no clássico provincial com os santafesinos. Mas a Argentina voltou a concentrar a seleção em times de Buenos Aires para a Copa América realizada no fim do ano.

A Albiceleste pôde ser campeã, mas foi menos insensível na edição de 1926. É que entre junho e julho outro time europeu com cartaz de profissionalizado excursionou pelo país. Era o Espanyol, com porte ainda mais equiparável ao do Barcelona e que tinha, sobretudo, o já lendário goleiro Ricardo Zamora consigo. Os catalães começaram invictos, batendo por 1-0 o combinado dos times do norte da Grande Buenos Aires e ficando no 1-1 com os do sul, arrancando na sequência um 2-2 contra a seleção Argentina após estarem perdendo de 2-0. Sosa não jogou essa partida e sim a seguinte: Zamora e colegas pisaram no estádio do Newell’s e levaram de 3-0 em um placar aberto pelo Payador de la Redonda. Feito realçado pelo clube ter na sequência visitado o Uruguai e vencido por 1-0 o Nacional, ainda que o veterano Piendibene assegurasse vitória do Peñarol pelo mesmo placar depois.

Assim, em outubro de 1926 a seleção argentina não duvidou em levar Gabino para a Copa América realizada no Chile. Autor de um gol nos 5-0 na Bolívia, ele consagrou-se contra o Paraguai, onde fez o primeiro, o terceiro e os dois últimos de um inapelável 8-0. Não deixou espaço para que seu reserva jogasse: era ninguém menos que Guillermo Stábile, que dali a quatro anos se sagraria artilheiro da primeira Copa do Mundo. Não bastou para evitar título do Uruguai. Mas o que viria a despedir Sosa da seleção seriam fatores extracampo. A começar pela reunificação das ligas, em 1927, reforçando a concorrência ao posto com gente mais midiática de clubes mais populares e mais próximos do radar – El Negro jogou pela Argentina pela última vez naquele ano, em derrota de 1-0 para o Uruguai em 30 de agosto, pelo troféu binacional Copa Lipton.

A Argentina venceu sem ele a Copa América de 1927 e disputou sem ele as Olimpíadas de 1928 por pura opção técnica e abundância de craques em meio à primeira geração dourada do país. Ainda assim, ao eleger em 2011 os cem maiores ídolos da seleção, a revista El Gráfico incluiu Gabino Sosa. Cujo cartaz europeu em 1928 exibiu-se em turnês de outros dois clubes: terceiro colocado na também duopolizada liga escocesa na temporada 1927-28, o Motherwell excursionou pelo Cone Sul entre maio e junho e não deixou de falar grosso: venceu mesmo a Argentina por 3-0 em 2 de junho e repetiu esse placar no dia seguinte contra um combinado Argentina-Uruguai.

Duas imagens que refletem a longevidade da carreira de Sosa: à direita, no amistoso com o Rosario Central comemorativo dos 20 anos dela, posa com Harry Hayes, filho de ex-colega de mesmo nome na seleção rosarina. À direita, com Vicente de la Mata, que nem era nascido quando Sosa começou a jogar

Na mesma turnê, os britânicos derrotariam o Peñarol em Montevidéu por 1-0 e ficariam no 1-1 contra a seleção carioca. Sosa, dessa vez, não venceu, mas não passou vergonha: a seleção rosarina caiu primeiro por 4-3 e depois por 3-2. Em agosto sim, Gabino venceu: o Barcelona programou sua pré-temporada com oito jogos pelo Rio da Prata e teve contra os rosarinos a derrota mais elástica da gira, aqueles 4-0 em que El Negro forneceu as assistências para os dois primeiros gols. Ainda haveria mais, mas era o bastante para essas menções de uma nota da revista La Cancha nos anos 30:

“Fora de nosso país, Gabino Sosa goza de uma fama que não conseguiram muitos celebrados meias-atacantes de Buenos Aires. Em Montevidéu, o consideram o mais completo que o balompié sul-americano produziu. E todas as equipes estrangeiras que visitaram Rosario, desde os escoceses do Motherwell até os catalães do Barcelona, saíram convencidos de que Rosario tinha um maestro nativo do futebol. Um maestro de pedagogia própria, definida, inconfundível. Um maestro do futebol criollo, desse futebol nosso que é uma degeneração progressista do jogo base dos anglo-saxões, do qual só restou a essência estatutária, a forma anatômica, mas cuja modalidade fisiológica (valha a metáfora) difere substancialmente das características inglesas. Gabino Sosa foi um maestro desse futebol criollo que foi à Europa passear sua superioridade. Gabino Sosa é um maestro do que para os ingleses é jogo ciência e para nós, por obra e graça de nossos campeões, é jogo-arte”.

Entre maio e julho de 1929, quem veio da Europa para excursionar no Cone Sul foi o Chelsea – que, embora fosse ainda um clube virgem de títulos e de segunda divisão, tinha calibre profissional para vencer a seleção de Buenos Aires por 3-2 em 25 de maio e a própria Argentina por 1-0 no dia 31, ou o San Lorenzo por 2-0 já em 8 de junho. Em 16 de junho, os londrinos levaram então uma virada de 2-1 no estádio do Newell’s pela seleção da cidade orquestrada por Gabino. Mas as chances de El Negro voltar à seleção acabariam de vez ainda naquele ano: primeiramente, fraturou o perônio da perna esquerda, no que ele descreveu como “a única desgraça séria” vivida no futebol, naquela nota de 1934.

Os trinta anos de idade já elevados para a época também pesariam contra uma convocação à primeira Copa do Mundo. A pá de cal foi uma greve dos jogadores rosarinos em 1930, vetando a inclusão generalizada deles na convocação. A greve, inclusive, já denotava a existência de um regime profissional que se escancaria no ano seguinte.

Não exatamente para Gabino Sosa.

Um amador profissional. E um profissional, enfim, campeão

Apesar da estrela de Gabino, o Central Córdoba era um clube pouco ou nada lucrativo, com apenas 300 sócios no ano de 1927. Mesmo times menores beliscavam um título ou outro na liga rosarina (o Tiro Federal em 1920, 1925 e 1926 e o Belgrano em 1924). Os charrúas, quando muito, chegavam ao vice, secundando o Newell’s em 1929 e o Rosario Central em 1930. Em 1931, então, os principais clubes da Grande Buenos Aires romperam com a federação, criando uma liga assumidamente profissional. O mesmo ocorreu em Rosario, onde o Central Córdoba não deixou de fazer parte da primeira liga rosarina profissional, também em 1931.

Sosa como técnico do Central Córdoba campeão regional em 1939, entre Waldino Aguirre e Francisco de la Mata

Essa realidade germinou diferentes versões sobre a hora em que Sosa e o Central Córdoba precisaram por lei sentar pela primeira vez para pactuar um contrato de jogador profissional. Em algumas, os dirigentes teriam combinado um salário de 400 pesos e o presentado com uma boneca para a filha, emocionando o jogador – que apenas dizia “obrigado, obrigado” às lágrimas deixando o dinheiro na mesa, dizendo que o brinquedo era suficiente; em outras, o jogador é que teria pedido pela boneca no lugar do dinheiro. Também há quem narre que ele teria assinado em branco o contrato para que os dirigentes oferecem o valor que entendessem. Em outra, “Sosa, um pouco infantil, não queria assinar seu primeiro contrato como profissional, pois sustentava que era suficiente o compromisso de palavra”, em palavras datadas já de 1957 pela revista El Gráfico. Foi em nota que celebrava o título charrúa na segunda divisão argentina, rendendo a única temporada dos rubroazuis na elite nacional.

No perfil dedicado aos estreantes, a El Gráfico tratou de embutir um sobre Sosa: “somente o tempo e o reconhecimento de quem sabe das etapas difíceis do Central Córdoba podem dizer como Gabino Sosa, com uma personalidade que há de ser muito discutível fora dos campos, por seu apego ao ‘estranho’ e à vida noturna nos bodegones, e que ele nunca ocultou, foi bandeira no então clube [do bairro] de Tablada. (…) Gabino Sosa foi identificando-se no corpo e alma com o Central Córdoba, volcando nele toda sua sabedoria futebolística e característica malícia criolla. Para quem vimos atuar em seu apogeu, e ainda admitindo diferença de tempo e de táticas, cremos que essas condições não foram superadas por homens das novas gerações”.

Pois bem. Em 1931, a principal anedota envolvendo Sosa na liga teria sido um jogo contra o Provincial, então o clube do goleiro Julio Yustrich, mais tarde ídolo no Boca e quem inspiraria o apelido do goleiro flamenguista de nome real Dorival Knipel: Gabino driblou um defensor e ficou então livre de frente ao Yustrich argentino. Ameaçou chutar para um canto, fazendo o goleiro pular naquela direção, para então gozar com um “não, loirinho, não aí” – e colocar a bola no canto oposto. Em 1932, porém, a história já seria mais laureada.

Para 1932, a liga rosarina foi travada em simplesmente três turnos. Teve o melhor ataque, com 91 gols, e a melhor defesa, que sofreu 28 ao longo dos 24 compromissos – goleando nos últimos cinco: 6-2 no Provincial, 5-0 no Sparta, 7-2 no Washington e 6-1 no Tiro Federal podem parecer folclore dado os adversários. Na rodada final, o Newell’s era o único concorrente à taça, calhando de o adversário do Central Córdoba ser exatamente o Rosario Central. Podia-se assim até esperar pouco esforço dos canallas.

Mas não que levassem de 8-0 dos rubroazuis.

Sosa marcou os dois primeiros.

E, em retribuição, clube e torcida se unirem em uma vaquinha para presentear o ídolo com uma casa própria, onde ele moraria até o fim dos seus dias.

O primeiro título rosarino do Central Córdoba teve ainda novo desdobramento glorioso. É que as associações “argentina”, rosarina, cordobesa, santafesina e uruguaia programaram outro embrião de Libertadores, entre novembro de 1933 e fevereiro de 1934. A chamada “Copa Beccar Varela” começou com fases regionalizadas e o clube de Gabino destacou-se desde o início, liderando o grupo com o Nacional de Rosario, o Belgrano rosarino, o Tiro Federal e a dupla Newell’s e Central. Nas oitavas-de-final, bateram por 2-0 o Platense em jogo único no estádio neutro do River; nas quartas, passaram pelo Atlanta por 2-0 em jogo único na cancha do Rosario Central. E o campo do próprio Atlanta recebeu as semifinais: 3-2 no Gimnasia y Esgrima de Santa Fe.

Como guarda-trem do Ferro Carril Central Córdoba (note as iniciais no quepe) e assinando a papelada de sua aposentadoria na ferrovia, nos anos 50

A decisão foi contra o Racing, campeão de Beccar Varela anterior e que havia surrado por 4-1 a “final antecipada” contra o rival Independiente. Aos 2 minutos, Demetrio Conidares abriu o placar para os favoritos de Avellaneda, mas o ensaio de uma goleada contra uma defesa rosarina avaliada como desorientada só ficou no ensaio mesmo. Os dribles não saíam e o volume ofensivo maior não chegava a inquietar o goleiro Ernesto Funes. Por outro lado, Juan Bottaso, goleiro da Argentina na final da Copa de 1930, defendeu sem dificuldade um pênalti cobrado por Telmo Collins no meio do gol. Ainda assim, os charrúas não esmoreceram: aos 37 minutos, “os passes curtos dos centrais rosarinos lhes proporcionaram um magnífico goal, conseguido por [Eduardo] Constantini ao cabo de uma combinação de Sosa e Collins”.

O Central voltou melhor do intervalo, mas o Racing marcou antes, aos 8, com Vicente Zito, “na melhor jogada da tarde e o único momento em que se fez presente a Academia. [Roberto] Bugueyro colocou um cruzamento largo, que passou frente ao arco – como todos os seus – e ali recolheu Conidares, sobre a mesma linha; de voleio, fez o cruzamento curto para trás e Zito pôs o selo com um sobrepique”. Mas em seguida, aos 15, veio novo empate: “o segundo goal de Constantini nos fez lembrar aqueles outros goals de Libonatti, que já passaram. Rapidez, habilidade e precisão; isso houve na jogada do insider”.

À parte dos quatro gols, o jogo foi avaliado como discreto, carente de grandes figuras e sem situações de emoção na quantidade esperada. E a imprensa avaliou o veterano como a figura: “o nome de Gabino Sosa se impõe, mais que por sua atuação no match, pela notória influência de sua técnica no jogo dos forwards”. Foi então que, a dois minutos do fim, o beque racinguista Arturo Scarcella fez falta perto da área em Constantini. O lateral Lorenzo D’Uva cobrou e, na sequência, foi a vez de Scarcella cometer pênalti em Collins. Inconformados com o apito, os jogadores da Academia então cercaram o árbitro, impedindo-o que contasse os doze passos para assinalar a marca da cobrança e chegando ao cúmulo de se revezarem em sentadas na bola – sob a calmaria dos rosarinos, que apenas observavam.

Após cinco minutos de confusão, o juiz deu o jogo por encerrado e retirou-se do campo. A falta de fair play foi condenada em peso pela própria imprensa portenha, sem bairrismos da El Gráfico: “na partida final pela Copa Beccar Varela, os jogadores do Racing nos privaram de um epílogo que teria sido, acaso, o melhor da tarde. Esperávamos que, ao executar-se o pênalti e decretar-se o triunfo do Central Córdoba, seriam 22 os homens que aplaudiríamos ao dar a volta olímpica, e que antes de retirarem-se do field, os jogadores do Racing, caídos com honra, teriam em suas mãos em ademão de cavalheira felicitação a seus vencedores”. A lamentou ainda que o capitão de La Acadé não se impusesse, em contraponto a um exemplo dos anos 10 onde “o célebre Alberto Ohaco advertiu severamente, com autoridade de um pai, Natalio Perinetti, porque em um match amistoso esse protestou uma falha do árbitro”.

Apesar da confusão, a volta olímpica foi possibilitada – curiosamente, os dois clubes deram, ainda que os da Academia se colocassem atrás dos rosarinos, não escapando de vaias abafadas pelos fanáticos alvicelestes. Dentre seus pares, Sosa era quem ia mais atrás, às lágrimas pelo maior feito nacional do Central Córdoba até hoje. O jornal rosarino El Mundo destacou na época que ele “ainda na atualidade e pese aos 18 anos transcorridos, um valor de recomendáveis quilates. Dirige o jogo com pasmosa habilidade e é a alma mater da equipe Central Córdoba. No cotejo de ontem, patenteou uma vez mais suas condições de footballer fogueado em mil encontros”.

Busto no estádio do Central Córdoba. O campo leva o nome do craque

Gabino Sosa ainda teve mais dois capítulos gloriosos no clube de sua vida; um segundo título rosarino veio em 1936, na companhia de outro raro jogador que a Argentina aproveitou do Central Córdoba: Vicente de la Mata, que na esteira da conquista iria à Copa América iniciada em dezembro daquele ano para ser o herói da conquista sobre o Brasil. Em meio à campanha da seleção, De la Mata transferiu-se ao Independiente para ser sua maior figura na primeira metade do século XX. Sosa seguiu sendo a estrela máxima da companhia rubroazul até parar de jogar, em 1938. Justamente o último ano em que Newell’s e Rosario Central se limitaram ao campeonato rosarino.

Em 1939, então, a AFA incorporou essa dupla ao campeonato argentino (o Central Córdoba viria a ser admitido em 1943, mas na segunda divisão). Com a perda imediata de prestígio da liga rosarina, a saída inicial dos clubes restantes foi criar para 1939 o Torneio do Litoral, com a dupla santefesina Colón e Unión, além do Gimnasia y Esgrima local; e com dois representantes da cidade de Paraná, os combinados entre Patronato e o Belgrano local e entre o Paraná e o Talleres local.

Gabino ainda seguiu frequentando os vestiários rubroazuis como técnico e foi o comandante até 1940. A tempo de saborear mais um raro título da galeria charrúa; ao fim do turno e returno, seu clube e o Unión terminaram empatados com 25 pontos, acertando duas finais. Em Santa Fe, o Tatengue surrou por 6-2 os rosarinos em 17 de dezembro. Na véspera de natal, então, o Central ganhou de 3-1, sem que o saldo fosse critério de desempate; a taça foi decidida em jogo-extra na neutra Buenos Aires, em 6 de janeiro, no estádio do San Lorenzo. Francisco de la Mata, irmão de Vicente e futuro campeão no próprio San Lorenzo, abriu a vitória de 2-1 para o quadro onde também brilhava Waldino Aguirre, futuro maior artilheiro profissional do Rosario Central.

Após o futebol

A carreira como treinador não foi muito além daquele epílogo: Gabino seguiu dedicado a seu posto de guarda de trem na ferrovia, aposentando-se nos anos 50 realocado na seção de encomendas. Em 7 de novembro de 1969, foi homenageado ainda em vida quando seu nome foi escolhido para designar o novo estádio do Central Córdoba. Seguia sendo um raro ídolo do passado não relegado ao esquecimento das torcidas alheias: em 5 de janeiro de 1971, ele ingressou no velho Policlínico Ferroviário para tratar de um tumor na coluna e não mais sair.

Recebeu ao longo da internação apoio generalizado para além do pessoal charrúa. O Ñaró, clube de boxe (esporte que promoveu lutas beneficentes para El Negro), lhe doou 10 mil pesos. Outros 50 mil saíram da conta pessoal do presidente da AFA. Uma conta bancária foi mesmo aberta para doações. O filho de Blas Sosa e de Andrea Basualdo, o irmão de outro Blas Sosa e de Prudente Sosa, o esposo de Margarita Chaves e o pai de María Margarita, Beatriz Adriana, Marta Yolanda e Alcira Oiga (além de outro Gabino, gêmeo desta e falecido pouco após o nascimento) conseguiu lutar até as 8h40 da manhã chuvosa de 3 de março de 1971. Um poeta teria assegurado que “a cidade, marcada pelo céu cinza, chorava nesse dia por Gabino Sosa”.

https://twitter.com/afa/status/1367127634644115463

https://twitter.com/museocc/status/1367099122596130816

https://twitter.com/centralcordoba/status/1367080946227437569

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

One thought on “50 anos sem o primeiro maestro do futebol argentino: Gabino Sosa, “o Repentista da Redonda”

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