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Martín Palermo e seus diversos gols históricos

Palermo
Na sua despedida na Bombonera

El Titán não precisava daquele recorde para se perpetuar no panteão xeneize. Quebrar um recorde de mais de 70 anos foi mais um de tantos feitos para a torcida do Boca e de tantas outras: foi daqueles jogadores cujo carisma despertava a simpatia de todos, até de fãs moderados do River, a ponto de sua despedida na Bombonera, em 2011, ter ofuscado um título na capa de Olé – que estampou “perdão, Vélez”, por achar mais relevante a saída do atacante à taça antecipada vencida pelo Fortín. Uma trajetória cheia de emoções que acabam esfriadas pela simples estatística de maior goleador do clube da Ribeira. Tentaremos então resumir os gols de maior destaque envolvendo Martín Palermo e os auriazuis:

Contra o Boca!

Palermo foi cria do Estudiantes de sua La Plata natal. Passou pelo infortúnio do rebaixamento em 1994 junto do jovem Juan Sebastián Verón, com quem participou do imediato reacesso à elite em 1995. Mas enquanto Verón, sim, ia ao Boca em 1996, Palermo esteve para ir ao modesto San Martín de Tucumán após vencer a segundona: não era levado em conta no Estudiantes. Mas o valor de seu empréstimo foi considerado alto demais pelos tucumanos, ele permaneceu em La Plata e começou a se destacar. Ao fim da temporada 1995-96, conseguiu marcar dois gols sobre o Boca na Bombonera. O Estudiantes venceu por 2-1. De quem foi o gol do Boca? De Verón, que justamente ali despediu-se de sua rápida vida auriazul, rumando em seguida à Sampdoria. A história é a rainha da ironia…

Na despedida de Maradona. Virando o jogo. Contra o River. No Monumental. Em seu primeiro Superclásico

Palermo não marcou apenas na despedida do breve Verón do Boca. Bastava dizer “na despedida de Maradona” acima. As demais circunstâncias parecem de cinema, mas foi o que aconteceu naquele 25 de outubro de 1997. Foi Maradona quem recomendara Palermo do Estudiantes ao Boca, assim como os gêmeos Barros Schelotto do rival Gimnasia LP: as melhores contribuições de Dieguito em seu fracassado retorno aos xeneizes foram essas. Ele decidiu abandonar a carreira dias depois daquele dérbi, de forma que ninguém sabia que presenciava sua despedida. Boca e River pela primeira vez em décadas disputavam o título, tornando aquela partida ainda mais grandiosa. Palermo, de cabeça, colocou os visitantes na liderança. Falamos mais aqui.

Estragando o centenário do Barcelona

O Barcelona preparou-se para um grandioso centenário em 1999, com direito a amistoso contra a seleção brasileira em abril. Os catalães empataram um jogo contra o Brasil com direito a gol mal anulado, foram campeões nacionais e tiveram em Rivaldo o melhor do mundo, mas não puderam com a visita argentina, em agosto. Palermo ainda era piada mundial pelos três pênaltis perdidos na Copa América, em junho. Anotou um 3-1 aos 30 do segundo tempo no Camp Nou. O Barça, treinado pelo assistente José Mourinho, só conseguiria diminuir, com Figo, em um jogo “nada amistoso” conforme relato do Mundo Deportivo: houve gol anulado para cada lado, gol de mão de Guillermo Barros Schelotto, sete amarelos…

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O lance e a comemoração daquele primeiro gol no River, em 1997. E marcando de joelho estourado contra o Colón

O de joelho estourado

Palermo havia ido à Copa América de 1999 no embalo de um bi argentino com o Boca, que até 1998 só havia conquistado outros dois títulos nacionais em espaço de mais de vinte anos. O jejum caíra no Apertura 1998 com o Titán marcando 20 gols em 19 jogos, recorde nos torneios curtos. O ano dos três pênaltis perdidos, porém, ainda lhe reservaram um joelho estourado, contra o Colón em novembro. Palermo não deixou o campo de imediato: só após marcar um gol. Aí saiu para só voltar seis meses depois. O que nos leva ao próximo tópico…

O de cinema

Palermo é o maior artilheiro do Boca também nos encontros com o River. Além daquele Superclásico de 1997, merece destaque um amistoso de 1999 vencido por 3-0 com o Titán marcando todos. Mas a noite de película ocorreu em 24 de maio de 2000. Boca e River faziam o jogo da volta pelas quartas da Libertadores. Palermo não jogava desde a lesão contra o Colón, seis meses antes, e o anúncio de sua escalação ainda que entre os reservas fez o técnico rival Américo Gallego declarar que usaria o aposentado Enzo Francescoli. O Boca precisava de dois gols de diferença para avançar. Palermo entrou com o jogo ainda em 1-0. E, desajeitado, fechou o placar de 3-0 para ser erguido aos choros enquanto o árbitro imediatamente assinalava o fim da partida.

Os dois mais importantes

O Boca venceu aquela Libertadores, voltando a ficar à frente do River em títulos no torneio: até então ambos tinham duas cada. E até então ambos tinham dois mundiais também. Palermo desempatou essa conta anotando duas vezes em Tóquio. Frente ao Real Madrid. Ainda antes dos cinco minutos de jogo. Bom tempo em que os sul-americanos viam adversários europeus com faca nos dentes e não com submissão cega frente a divindades de videogame…

O mais profissional

Após o mundial de 2000, Palermo seguiu por mais uns jogos no Boca, o último curiosamente frente o Estudiantes, derrotado por 1-0. Foi então vendido junto de Gustavo Barros Schelotto ao Villarreal, que começava a investir em sul-americanos. Voltou da Europa em 2004, como consolo à torcida após o vice na Libertadores, e como presente pelo centenário que se aproximava do clube. Palermo não manteve a média de antes mas seguiu vencedor. E em 2006 ele e o Boca estiveram perto do primeiro tri argentino seguido. Bastava empatar um dos dois últimos jogos, mas ambos foram perdidos e os auriazuis foram igualados pelo Estudiantes, o que forçou um jogo-extra. O clube da infância não era campeão havia 23 anos, mas Palermo não hesitou em abrir o placar. Mas os alvirrubros, liderados pelo retorno de Verón, viraram. E um coração já meio boquense do Titán o fez ficar sem falar com o amigo por um tempo.

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Ainda amigo de Riquelme, comemorando o “gol de muletas” contra o River na Libertadores 2000, ano em que fez os dois sobre o Real Madrid no título mundial

Os mais tristes

A volta de Palermo em 2004 teve entre as motivações um AVC que a namorada de anos sofrera. Voltaram, se casaram e no início de 2006 estavam “grávidos”. Se Palermo ficou um tempo sem falar com Verón pela perda do Apertura 2006, foi por ter levado aquele torneio bem seriamente. E a maior demonstração veio logo na primeira rodada, nos 3-0 sobre o Banfield em agosto. O filho Stefano, que nascera prematuro, falecera 48 horas antes. O atacante, para não pirar, achou melhor pedir para jogar, marcou dois gols e seu desespero ao fim da partida terminou consolado também pelos adversários.

Os diversos recordistas, ano a ano

a) Em setembro de 2006, a Recopa opôs o Boca, campeão da Sul-Americana 2005, pegou o São Paulo, vencedor da Libertadores 2005. O Boca venceu por 2-1 na Bombonera e virou o jogo no Morumbi com Palermo anotando o segundo. O Tricolor ainda empatou, mas o 2-2 não garantiu apenas a taça aos xeneizes como também o posto de clube com mais títulos internacionais no mundo, na época: veja aqui.

b) Em 2007, já aos 33 anos, Palermo marcou pelas únicas vezes 4 gols em um só jogo. Uma das vítimas foi o Banfield. E a outra, para seu maior deleite, foi o velho rival Gimnasia LP. Quatro gols que serviram-lhe para se recuperar imediatamente frente a velhos torcedores: a rodada anterior havia sido justamente contra o Estudiantes, contra quem o profissional Palermo havia marcado “só” três…

c) Em 1 de março de 2009, nos 3-1 sobre o Huracán, somou seu 195º gol pelo Boca, superando Francisco Varallo como profissional com mais gols. Escalamos ambos para dupla ofensiva no hipotético time dos sonhos do clube, há dez dias: clique aqui.

d) Mas o que mais rodou o mundo em 2009 veio em outubro, nos 3-2 sobre o Vélez. Ele fez o gol de cabeça mais distante das redes a ser registrado no Guinness, a quarenta metros do arco – mais ou menos a distância daquele gol de Ronaldinho Gaúcho contra a Inglaterra na Copa 2002.

e) Dois jogos depois daquele cabeceio no Vélez, Palermo somou seu 14º gol no River em um 1-1 no Monumental. Ali ultrapassou os 13 gols do brasileiro Paulinho Valentim, até então o jogador do Boca que mais havia marcado em Superclásicos. Palermo, considerando amistosos, faria ao todo 19, só estando atrás dos 22 do riverplatense Ángel Labruna como máximo goleador do dérbi. Só que Labruna defendeu o River por mais de vinte anos. Palermo precisou de dez (1997-2000, 2004-11) no Boca.

f) Após superar Varallo, faltava ainda deixar para trás os 218 de Roberto Cherro, artilheiro máximo considerando a era amadora. Isso veio há exatos cinco anos, completando em 12 de abril de 2010 para o gol do Arsenal cruzamento do desafeto Juan Román Riquelme, que escancarou ao mundo a má relação pessoal dos dois ao comemorar sozinho. O Boca, a partir da virada do século, se acostumou a vencer tudo graças aos dois. Imagine se fossem amigos…

g) Até em seu último gol pelo Boca ele foi recordista: em junho de 2011, à beira da aposentadoria e na antepenúltima rodada, somou seu 227º gol nacional (somando os por Estudiantes e Boca) em um 2-2 com o Quilmes. Na ocasião Palermo se igualou a José Sanfilippo, maior artilheiro do San Lorenzo, como quinto maior goleador da história do Argentinão. Faltou bem pouco para ser o quarto, posto dos 231 gols de Manuel Pelegrina, por sinal o maior artilheiro do Estudiantes.

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Naquele jogo contra o Banfield em 2006 e decidindo no mesmo ano a Recopa contra o São Paulo. E aquela capa do Olé minimizando o título do Vélez em 2011

Nas rivalidades

Além de todos os gols já mencionados contra o River, seu 19º e último também foi especial: foi em seu 31º e último Superclásico, em 15 de maio de 2011. Em um 2-0 que serviu para afundar o rival, que dali a um mês seria rebaixado. Nos duelos contra os demais grandes, fez 13 em 26 jogos contra o San Lorenzo, com destaque aos três que fez em um massacre de 7-1 em pleno Nuevo Gasómetro em 2006; 10 em 18 contra o Racing; e 12 em 22 contra o Independiente, incluindo o seu primeiro pelo Boca, em 30 de setembro de 1997. Pobre Lucas Viatri, talentoso atacante que sempre tinha de voltar à reserva quando Martín se recuperava de lesão: “se lhe deram as traves, a mim tinham de me dar o banco”, brincou Viatri referindo-se ao Boca ter presenteado o ídolo com traves da Bombonera após a despedida em 2011.

O rival “pessoal” Gimnasia LP foi outra vítima preferencial. O Lobo foi o vice do primeiro título de Palermo no Boca, o Apertura 1998, e também foi segundo no Apertura 2005. Foram 18 jogos e incríveis 15 gols, com destaque aos quatro naqueles 5-1 em 2007. Para completar, foi contra ele que Palermo se despediu. Em La Plata, o Gimnasia lutava para não cair e vencia por 2-1 até os 48 do segundo tempo. Christian Cellay foi quem marcou, mas Palermo se envolveu no lance e a histórica ótima relação com o rival fez as câmeras focarem nele como se fosse o autor do gol. Os platenses, como o River, também seriam rebaixados.

Contra brasileiros

A estreia de Palermo no Boca foi contra um brasileiro: o Cruzeiro, pela Supercopa 1997, vitória de 1-0. Deixou seus gols em um 1-0 sobre o Palmeiras na Copa Mercosul 1998; nos pegas contra o Internacional no bi boquense na Sul-Americana, em um 4-2 pelas semifinais de 2004 e no 4-1 pelas quartas de 2005; nos 2-2 no Morumbi contra o São Paulo pela Recopa 2006; os dois nos 2-1 sobre o São Paulo na Sul-Americana 2007; virando para 2-1 para eliminar o Cruzeiro no Mineirão nas oitavas da Libertadores 2008; e descontando na derrota de 3-1 para o Fluminense no Maracanã nas semis daquela Libertadores. Sem falar nos títulos de 2000 e 2007 no torneio, garantidos no Brasil contra Palmeiras e Grêmio.

Na seleção

O argentino mais velho a marcar em Copas é do Boca. Mas se para entrar na Albiceleste foi fácil, em 1999, manter-se após o vexame na Copa América e tantas lesões foi duro. Em 2008, Palermo estourou pela terceira vez o joelho quando estava para ser chamado pela primeira vez desde a eliminação hermana naquela fatídica Copa América. E apenas um técnico senil como Maradona poderia dar uma chance ao veterano em 2009. Dez anos depois, Palermo pôde reconstruir sua história, mantendo a Argentina viva nas eliminatórias naquele gol sobre o Peru no último lance daquela épica noite chuvosa no Monumental. Maradona insistiu em levar o excessivo número de seis atacantes à África do Sul para Palermo (em vez de Lavezzi) ir. Jogou os últimos dez minutos contra a Grécia, suficientes para reforçar sua mística. Dos hermanos que marcaram gols na história do torneio, é o que jogou menos tempo.

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Os três capítulos na seleção: os pênaltis de 1999, salvando a classificação da Argentina em 2009 e marcando com dez minutos na Copa 2010

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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