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Nostalgia da Copa – Argentina 3×2 Alemanha – 1986

No dia 29 de junho de 1986 mais de 114 mil pessoas presenciaram um dos maiores jogos da história do futebol. Debaixo de um forte sol de meio dia, Argentina e Alemanha fizeram uma final inesquecível no gramado do Estádio Azteca. Com a vitória por 3×2, os argentinos venceram pela primeira vez fora de casa e exorcizaram o fantasma de terem um único título, como local e muito questionado pelas suspeitas que cercaram a goleada de 6 a 0 sobre o Peru.

Aquela final foi aguardada com muita expectativa. Após um início razoável, os argentinos começaram a atropelar seus adversários, com Maradona realizando atuações históricas contra Inglaterra e Bélgica, nas quartas-de-final e semifinal. A Alemanha havia tido um início mais complicado: perdeu para a Dinamarca na primeira fase, eliminou os marroquinos nas oitavas com um gol irregular no último lance do jogo e só conseguiram passar pelos mexicanos nos pênaltis. Mas passaram por cima da França na semifinal, chegando àquela final com a velha e conhecida força na reta de chegada, que historicamente caracteriza a seleção alemã.

O primeiro tempo foi truncado. Com Maradona muito marcado a Argentina não conseguia furar o bloqueio alemão. Mas aos 23 minutos uma falta na lateral da área mudou o destino do jogo. Burruchaga levantou na área, e o normalmente seguro goleiro Schumacher saiu muito mal, permitindo ao defensor Jose Luis Brown cabecear para dentro do gol alemão. O discreto zagueiro que nem deveria ter sido titular (assumiu a posição com a contusão de Daniel Passarella) se transformava no primeiro herói daquele dia histórico.

No segundo tempo as coisas aconteceram de forma vertiginosa. Logo aos 10 minutos um preciso passe de Enrique encontrou o ótimo Jorge Valdano livre. O atacante do Real Madrid teve toda a calma para avançar e bater Schumacher com um chute bem colocado. A Argentina abria uma vantagem que só havia sido revertida uma única vez em uma final de Copa do Mundo. Mas como lembrou Burruchaga muitos anos depois: “você tem de matar a Alemanha várias vezes e se certificar com ela está morta”. Os alemães eram famosos por renascer das cinzas mesmo quando isso parecia impossível. Até hoje é a única equipe a sofrer um 2 a 0 numa final de mundial e ainda sair campeã (3×2 contra a Hungria, em 1954).

E o mundo se assombraria mais uma vez com a capacidade de reação daquela seleção. Em pouco mais de cinco minutos os alemães reverteram um quadro completamente desfavorável, aproveitando duas bolas paradas. Aos 29 minutos, o craque do time, Karl-Heinz Rumenigge (que jogava no sacrifício) descontou. E aos 35 minutos o oportunista Rudi Voller (que havia substituido o titular Klaus Allofs) venceu Pumpido para empatar.

Enquanto o valente centroavante alemão vibrava com o gol de empate não houve ser humano que não estivesse aterrorizado com a reação alemã. Haviam realizado duas tarefas que pareciam impossíveis a qualquer mortal: anularam Maradona durante 80 minutos e buscaram um implacável 2 a 0 que haviam sofrido. O mundo esperava o terceiro gol alemão, que parecia óbvio. Mas aquele jogo era mesmo a final das surpresas.

Apenas 3 minutos após o gol de Voller, uma bola espirrada sobrou para Maradona no circulo central. Diego estava cercado por três alemães e não tinha o que fazer. Mas de forma absolutamente mágica, com um leve toque, encontrou Jorge Burruchada livre. O camisa 7 da albiceleste correu com a bola colada nos pés para vencer Schumacher. O mundo se assombrava mais uma vez, agora com a genialidade absurda de Maradona e sua capacidade de fazer o impossível no momento mais precioso e inesperado possível.

Sete minutos depois o brasileiro Romualdo Arppi Filho apitou o final da copa do mundo de 1986. A Argentina havia exorcizado a contestável vitória de 1978, e podia olhar o mundo de cabeça erguida. O futebol argentino se consolidava como um dos grandes do planeta e mostrava ao mundo que tinha o maior craque do mundo pós-Pelé. E os fãs de futebol de todo o planeta agradeciam áqueles 22 jogadores por aqueles 90 minutos em que aconteceu um dos maiores jogos da história.

Tiago de Melo Gomes

Tiago de Melo Gomes é bacharel, mestre e doutor em história pela Unicamp. Professor de História Contemporânea na UFRPE. Autor de diversos trabalhos na área de história da cultura, escreve no blog 171nalata e colunista do site Futebol Coletivo.

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