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Sabella, finalmente no banco, e Messi com a certeza de que pode não ter outra chance

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Necessário dizer que a Seleção da Argentina finalmente se reconfigurou como um time. Seria elogiável, se antes já não tivéssemos esse time. Contudo, mesmo assim, vale a pena reconhecer os méritos de um treinador teimoso, que no último momento se deu conta de que abusava da sorte e fez as necessárias mudanças. Vamos falar disso aqui, de Messi e da possível conquista do título pela seleção que mais merece e precisa de um caneco: a Argentina.

Dias atrás, soltamos aqui um texto opinativo que irritou muita gente. Em parte, por causa dos argumentos, que muitos não estão dispostos a entender, quando ficam furiosos por falarmos daquilo de que não concordam. Em parte, por causa do tom, que faz com que, ainda que alguns, ainda que aceitem os argumentos, não se furtem de se chatear com o rigor de certas palavras. Respeitamos aqueles. E com estes, além do respeito, sempre estaremos dispostos a debater. Na ocasião, chamamos a Argentina de “lixo”. Não que a gloriosa Albiceleste fosse um lixo, mas pelo futebol que ela estava jogando e que negava não só suas origens, mas a competência até dos 23 atletas que estão no Brasil. Isto não existe mais, pois as necessárias modificações foram feitas pelo comandante do banco de reservas. Falemos dele primeiro.

Voltando a ser Sabella

Alejandro Sabella tem o mérito indiscutível de pegar um amontoado de jogadores e transformá-lo num time de futebol. Parece fácil, só que nem Dieguito conseguiu nem tampouco Batista, um técnico de futebol, ao contrário de Maradona. Havia momentos noa quais muitos suspeitavam de que a casa não seria arrumada de maneira alguma. Contribuía para isso o fato de que a Argentina se configurava como um time que não chegava mais. Era só ensaio de uma peça esperada, mas que não raro decepcionava já na estreia.

Neste contexto, era comum o reconhecimento de que no país vizinho a fábrica de craques brindava o mundo com atletas fenomenais, mas que eles dificilmente levariam a Albiceleste à gloriosa conquista do caneco de um Mundial. Inevitável esquecer daquela Copa América na qual um time extraordinário perdeu para o “Imperador” Adriano e um amontoado de reservas discutíveis que o acompanhavam na esquadra da Seleção Canarinho. Desespero e pessimismo eram comuns e davam o tom.

Sabella tratou do assunto com uma competência incrível. E para tanto, soube bancar vários jogadores do Estudiantes, mesmo com as severas críticas que recebeu. Isto importou menos do que a percepção quanto ao fato de que finalmente uma seleção seria configurada para trabalhar para Messi. Símbolo disso foi a braçadeira de capitão, logo oferecida a “La Pulga”. Aos poucos, o Pachorra montou um time e foi se dando ao luxo de fazer algumas poucas experiências. Muitos discordavam de um ou outro jogador, mas todos sentiam que havia uma Seleção Argentina forte e competitiva.

Esta Seleção desapareceu nos primeiros jogos da Copa do Mundo. A opção por ignorar meias habilidosos como D`Alessandro era discutível, mas tinha uma explicação: Um time seria formado na defesa para que o craque do Barça circulasse livre do meio-campo para frente. Como armador, Messi teria os demais membros do quarteto mágico para municiar com a pelota; como falso nove, Messi teria em Dí María alguém flutuando por todo campo, se deslocando dos lados para o centro e armando para o craque do Braça guardar. Nada disso funcionou e a solução demorou a parecer, pois certa miopia se assenhorou dos olhos de Sabella.

Agüero mal física e tecnicamente. Higuáin e Dí María com a musculatura à beira de uma estafa perigosa, enquanto Messi ainda parecia completar sua longuíssima recuperação pós-lesão de 2013. Um dos problemas foi a sobrecarga ao craque do Barça; o outro foi a necessidade do sistema defensivo lidar com as falhas de marcação no ataque, além da necessidade de que seu volante de criação, Fernando Gago, alternasse bem o papel de marcador e de homem da primeira bola. As questões relacionadas a Messi foram se resolvendo pela competência do maior jogador do mundo. Porém, quanto a Gago, se fez necessário que Sabella abandonasse sua teimosia e modificasse a equipe. Por certo que o Pachorra não leu nosso texto opinativo. Contudo, foi depois de sua publicação que coincidentemente ele colocou Lucas Biglia para jogar.

Quem acompanha nosso trabalho aqui e no twitter sabe o quanto defendemos a entrada de Biglia na equipe. Vários textos foram publicados aqui, no FP, principalmente pelo Júnior Marques, falando ou sinalizando a mesma coisa. Não temos problema com Gago, que reconhecidamente é uma referência de volante habilidoso e técnico. Mas o craque do Boca não vinha bem há muito tempo e não tinha condição de ser titular tendo Negro Fernández e Lucas Biglia no banco.

Foi então que Sabella deu uma lição tardia de humildade e mudou a equipe. Além de Biglia, colocou Demichelis para jogar. Muitos podem ter estranhado a saída de Fernández, mas o defensor do City é um zagueiro perfeito para atuar num sistema que o coloca protegido pelo monstro Mascherano e pelo polivalente Biglia, que se alterna entre a composição do “doble 5” e o preenchimento do meio-campo, reduzindo o setor em que Messi, Enzo Pérez e possivelmente Dí María tenham obrigação de cobrir. Efeito foi instantâneo e já contra a Bélgica o retrato era o de uma Argentina fortalecida taticamente e com cara de chegada. Então, o amontoado de jogadores, bem semelhante ao que havia no comando de Maradona e Batista, dava lugar novamente a um time de futebol, semelhante ao que o substituto do “Checho” já havia montado anteriormente. O mérito disso foi do técnico que deixou de ser “Felipão” e voltou a ser Alejandro Sabella. Indiscutível.

Messi será o Maradona de 1986 ou o Maradona de 1990?

Foi Paulo Vinícius Coelho que colocou a dúvida, após os dois primeiros jogos da Argentina, na Copa. Em ambos, Messi não jogou bem, embora tenha decidido as duas partidas. Esta situação o colocava sim como o Maradona de 1990, que não era brilhante, porém decisivo e responsável pela excelente campanha que fez a Albiceleste. Messi flertou com o Maradona de 86 nos jogos seguintes, ainda que timidamente. Na essência, contudo, seguia a ser o Dieguito de 90. Todavia, no último jogo, contra a Holanda, sequer foi uma coisa ou outra. Foi completamente anulado pelo esquema defensivo holandês, que colocava o recuperado De Jong na sua marcação.

E restou apenas uma partida para que o craque do Barça decida de qual dos “dois” Maradona´s ele vai se aproximar. Bom deixar claro que isto é apenas uma aproximação, já que Messi é genial sem precisar ser comparado até ao maior craque da história do futebol argentino. Porém, no coração dos torcedores, o craque do Barça só vai superar Dieguito se for o cara do jogo no domingo. E ele, Messi, sabe disso mais que ninguém.

Desnecessário dizer que agora ele tem um time para protege-lo e ajuda-lo. Tem Mascherano finalmente provando para alguns o gênio tático que sofisticou ainda mais seu futebol ao ser deslocado à zaga, no Barcelona. Terá Dí María de volta ou Enzo Pérez, que mostrou personalidade para preencher o vazio deixado pela ausência do “Fideo”. Contudo, o que mais pertence a Messi neste momento é a certeza de que talvez não tenha outra chance para levar a Argentina ao título uma Copa do Mundo.

E o que faz um jogador de futebol com esta certeza em sua cabeça? Depende do jogador. Ser for comum, não saberá conviver com a pressão e vai refugar. Mas quando se trata de um gênio do futebol é bem possível que ele supere todas as adversidades em torno de não desperdiçar uma rara chance de ser campeão. E Lionel Messi é este gênio. Por causa disso, ele será o Maradona de 86, no domingo, para depois voltar a ser Messi. Por causa disso, ele vai levar a Argentina ao sonhado título de tricampeão do Mundo, fazendo justiça à história do futebol mundial. Só.

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

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