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Elementos em comum entre São Paulo e San Lorenzo

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Silas, o grande ídolo em comum nos dois. Especialmente no San Lorenzo

Fora a “santidade” nos nomes, São Paulo e San Lorenzo têm em comum quase uma dezena de jogadores e status de grandeza em seus países, nada muito além. Enquanto o Tricolor é o maior vencedor internacional entre os brasileiros, o lado copeiro dos azulgranas só brotou mais recentemente. Foram campeões no mesmo ano em 1946 (Paulista; Argentino), 2001 (Rio-São Paulo; Argentino e Mercosul), 2002 (Superestadual; Sul-Americana) e 2007 (Brasileiro; Argentino).

O retrospecto entre eles é de equilíbrio: empataram em 2-2 em amistoso de 1960 e cada um venceu ao outro em casa nas Copas Mercosul de 1998 e 1999 – o meia-armador Leandro Romagnoli, ainda no Ciclón, estava presente nestes últimos encontros em 1999, bem como o goleiro Rogério Ceni. A seguir, quem passou pelos dois, com enfoque no desempenho na Argentina.

Em 1933, o San Lorenzo contratou Petronilho de Brito junto ao Syrio. Era atacante da seleção e poderia ter ido à Copa de 1930 se não houvesse a querela entre o futebol paulista e o carioca. Há fontes que sustentam que ele, e não Leônidas da Silva, seria o real autor do chute de bicicleta. Petronilho deu muito certo e foi um dos pilares do título argentino conquistado pelo clube naquele mesmo ano (leia aqui). Paralelamente, naquele mesmo 1933 seu irmão Valdemar de Brito era artilheiro do Paulistão pelo São Paulo, cavando vaga na seleção brasileira que disputou a Copa do Mundo de 1934.

A seleção foi eliminada já na primeira partida pela Espanha (um 3-1 cujos goleadores espanhóis, José Iraragorri e Isidro Lángara, jogariam pelo San Lorenzo, com destaque a Lángara) com Valdemar perdendo um pênalti nas mãos do lendário Ricardo Zamora, mas o irmão do ídolo foi contratado pelos argentinos em 1935. Seu talento foi reconhecido no país vizinho, mas em grau bem menor em relação a Petronilho. Teve uma estreia assombrosa ao marcar três gols em um 5-3 no Talleres de Remedios de Escalada pela primeira rodada do Argentinão, mas já na partida seguinte lesionou-se gravemente ao enfrentar o Boca. A recuperação foi mais longa que o pensado e ele voltou ao Brasil.

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Valdemar de Brito, “o descobridor de Pelé”

Valdemar ainda retornaria ao San Lorenzo em 1939, reencontrando Lángara, agora como colega no ataque. Saiu-se bem, como vice-artilheiro do elenco na temporada (atrás do espanhol), com 16 gols. Mas decaiu de nível em 1940 e saiu pelos fundos. Em 1941, voltou ao São Paulo, onde retomou o alto nível. Se celebrizaria posteriormente como o descobridor de Pelé, em Bauru.

Alberto Zarzur era um centromédio do São Paulo que chegou em 1935 junto de Valdemar. Não se acostumou e em poucas semanas deixou a Argentina rumo ao Vasco, com um único jogo oficial pelo San Lorenzo. Ainda voltaria ao São Paulo, integrando os campeões estaduais de 1943 e 1945, os primeiros títulos tricolores desde o de 1931 (nem sempre considerado, por ser da fase “da Floresta”). Nos anos 40, um dos maiores ídolos cuervos foi o atacante Rinaldo Martino, integrante da campanha campeã de 1946, da qual o futuro Papa Francisco (então com dez anos) declarou ter visto todos os jogos realizados no estádio sanlorencista.

Martino deixou 142 gols em 223 jogos e integrou a seleção bi na Copa América em 1945 e 1946, na qual marcou o gol do título. Era da geração dourada privada de Copa do Mundo em razão da Segunda Guerra. Também defendeu a seleção italiana, em 1949, quando estava na Juventus campeã após quinze anos de jejum (hoje algo impensável). Em 1953, a Portuguesa contratou a ex-dupla de Martino no San Lorenzo e na seleção, o centroavante René Pontoni. Mas quem chegou ao Canindé, naquele mesmo ano, foi El Mamucho – na época, esse era o estádio são-paulino; o Morumbi só seria erguido anos depois.

Tim (a seu lado em pé no San Lorenzo, Héctor Veira, de passagem obscura por Palmeiras e Corinthians) e Matosas

Veio como contratação experimental para o Rio-São Paulo na expectativa de que fosse um novo Antonio Sastre (ídolo contratado já veterano junto ao Independiente na década anterior), mas não tinha mais físico e ainda lesionou-se, logo saindo. O historiador Alexandre Giesbrecht contou em detalhes esse fracasso: acesse aqui. O seguinte foi Pedro Prospitti, um centroavante de escasso profissionalismo. Enquanto isso não privava suas condições, ganhou em 1964 a primeira Libertadores de um time argentino (pelo Independiente) e o maior título internacional da Argentina até a Copa de 1978 (a Copa das Nações, no Brasil: falamos aqui).

Prospitti havia despontado no Estudiantes e antes de chegar ao Independiente passou pelo San Lorenzo, em 1962. Demonstrou apenas fagulhas de talento, com apenas 4 jogos, ainda que marcando duas vezes. No São Paulo, teve uma passagem também obscura, entre 1966-67. Faleceu jovem, aos 45 anos. Jogou quando o São Paulo vivia seu maior jejum, entre 1957 e 1970, período áureo de Santos e Palmeiras. O San Lorenzo teria vivido um de treze anos também, entre 1959 e 1972, não fosse uma taça especial em 1968 – naquele ano, tornou-se o primeiro clube campeão argentino profissional invicto (confira). O técnico era o brasileiro Elba de Pádua Lima, o Tim.

Como jogador, Tim foi um dos dois únicos que a seleção usou da Portuguesa Santista e participou da Copa de 1938, até então o melhor retrospecto internacional do Brasil. Já veterano, ele defendeu o São Paulo entre 1944 e 1947, participando do bi estadual de 1945-46. O nome comum seguinte foi do volante Gustavo Matosas, nascido na Argentina enquanto seu pai, o uruguaio Roberto Matosas, era ídolo no River. Cresceu no país do pai, começou no Peñarol e foi brevemente jogador da Celeste. Ficou no San Lorenzo de 1991 a 1992. Não se eternizou ídolo, mas sua raça e disposição para fazer o trabalho sujo o deixou benquisto na época, ainda que sofresse críticas por ser espalhafatoso demais.

Matosas chegou ao São Paulo em 1993, já após a vitoriosa Libertadores. Quase foi campeão continental no mesmo ano, marcando gol na final da Copa Ouro com o Boca, forçando prorrogação vencida pelos argentinos. Titular na pré-temporada em torneios amistosos, Matosas não se firmou no Brasileirão. Já havia saído antes do Mundial. Depois dele, o nome de mais prestígio em ambos, sem dúvida: o do ex-meia Silas. Despontou como um dos “Menudos do Morumbi” dos anos 80, de forma meteórica: estreou nos profissionais do São Paulo em 1985, faturando o Estadual. E já no ano seguinte foi convocado para a Copa do Mundo, além de ganhar o Brasileirão.

Silas foi jogador de seleção até o início dos anos 90, indo também à Copa de 1990. Mas na Argentina ele alcançaria um prestígio ainda maior. Logo na estreia, pelo Clausura 1994, marcou no clássico com o Boca, que chegou a sofrer até gol olímpico dele em outro encontro. Atleta de Cristo, contaria depois que antes do jogo decidira que se marcasse naquele dia interpretaria como um sinal divino para continuar na Argentina. Ainda mais lembrado foi um sobre o River dentro do Monumental após passar por praticamente meio time (cinco adversários) antes de arrematar ainda fora da área – veja ao fim. O San Lorenzo enfrentava jejum desde 1974 e a taça não escapou em 1995.

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Ameli com Tuzzio no San Lorenzo: mais implacável com o colega do que com o flamenguista Liédson

Silas foi o armador das jogadas campeãs, com pedaladas, assistências e seus golzinhos. Também em 1995, deixou o seu nos 5-0 no clássico com o Huracán, maior goleada do dérbi de bairro. Brilharia em outros clássicos em 1997, marcando em novo massacre no Huracán (5-1) e dois nos 4-0 sobre o Boca, com os outros dois vindos de sua ótima dupla com Néstor Gorosito (técnico daquele Tigre da tumultuada final com o São Paulo na Sul-Americana 2012). Mas naquele mesmo ano uma lesão no joelho findou seu tempo no Ciclón e ele voltou ao Tricolor. Em 2000, um retorno ao San Lorenzo foi cogitado, mas o então técnico Oscar Ruggeri, seu ex-colega, barrou: “tem a mesma idade que eu”.

Enquanto Silas saía, chegava em 1998 o zagueiro Horacio Ameli. Caudilho da defesa, foi o capitão do ótimo 2001, com títulos na Mercosul, sobre o Flamengo (primeira taça continental cuerva), e no Clausura, com recorde de pontuação nos torneios curtos (47). Foi no embalo de outro recorde nacional, o de vitórias seguidas, treze. Chamou a atenção do Internacional, onde esteve no elenco que em 2002 voltou após cinco anos a dar o Estadual ao colorado. Acertou com o São Paulo no segundo semestre.

Ameli foi alvo de muitas críticas ao acumular duas expulsões nos três primeiros jogos no Tricolor, mas houve quem gostasse dele como o raçudo defensor da melhor campanha na primeira fase daquele Brasileirão, o último pré-pontos corridos. O São Paulo caiu já no primeiro mata-mata ao futuro campeão Santos, mas o zagueiro só deixou o Brasil a pedido do River, onde o técnico era o mesmo daquele San Lorenzo de 2001, o chileno Manuel Pellegrini (hoje no Manchester City). E nos millonarios deu sua maior alegria aos são-paulinos, participando da eliminação corintiana na Libertadores de 2003.

A carreira de Ameli estagnou em 2005. Como uma espécie de Icardi da época, descobriu-se que mantinha caso com a esposa do amigo Eduardo Tuzzio, sua dupla de zaga no River e naquele San Lorenzo da virada do século, e levou a pior. O último a passar por CASLA e SPFC foi colega deles na Argentina, o volante Hernán Adrián González. Esteve nos azulgranas de 1998 a 2009, descontando-se o período 2001-04, onde passou por empréstimo a outros clubes. Assim, seu único título foi o Clausura 2007. Tinha mais vontade que talento, mas foi contratado pelo São Paulo em 2009. Só jogou 7 vezes.

*Agradecimentos especiais aos especialistas são-paulinos Alexandre Giesbrecht e Marcelo de Leme Arruda

Atualização após a matéria: em dezembro de 2015, o São Paulo anunciou a contratação do técnico Edgardo Bauza, treinador do San Lorenzo campeão pela primeira vez da Libertadores, em 2014.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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