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15 anos do breve passo de Maradona pelo Almagro

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Maradona com o presidente do Almagro, Dardo De Marchi

A Grande Buenos Aires tem diversos clubes nanicos de tradição e camisa pesada até mesmo fora do país, como Lanús e Argentinos Jrs. Não é bem o caso do Almagro, modesto mesmo entre eles. Participante frequente da elite amadora, não se adaptou ao profissionalismo e os brasileiros o conhecem mais pela amizade com o Grêmio, criada pela semelhança no uniforme. Mas, ainda que por brevíssimo tempo, até Maradona já passou pela equipe da cidade de José Ingenieros – apesar do nome, o time ainda nos primórdios deixou o bairro portenho de Almagro (curiosamente, o mesmo se passou ao gigante San Lorenzo de Almagro, enraizado no bairro vizinho de Boedo quase desde sempre).

Maradona quase morreu em janeiro de 2000. Se entregara de vez às drogas após os malfadados retornos ao Boca, que retratamos há algumas semanas (clique aqui), e no início daquele ano tivera um infarto quase fatal. Internou-se em Cuba, mas seguiu ligado no futebol. Até deixar a ilha em maio para jogar uma partida pelo Bayern Munique contra a Alemanha, no jogo festivo que celebrava a despedida de Lothar Matthäus mas que acabou vendo Maradona roubar a cena e emocionar a todos: falamos aqui.

Em 2000, outro que parecia se recuperar era o Almagro. O clube voltou à elite profissional após mais de 60 anos; sua única estadia nela havia sido em 1938, sendo justamente a primeira equipe estreante desde a criação dela – formada em 1931, a liga profissional não teve rebaixamentos nos seus anos iniciais e apenas em 1937 foi instituída uma segunda divisão apta a promover alguma novidade na primeira. Um dos reforços para a estreia em 1938 havia sido o astro Raimundo Orsi, autor de gol na final da Copa do Mundo de 1934 pela Itália. Realidade a princípio diferente da de 2000, acesso em 2000 veio: a equipe precisou de duas repescagens após a temporada regular e após o êxito mantinha-se com nomes desconhecidos até o sonho maradoniano.

As negociações começaram a ser divulgadas no dia 18 de outubro e foram dadas como concretizadas no dia 27, após Maradona ser visitado por quatro dirigentes do Almagro. Ajudou a atrair outros holofotes a quem havia somado apenas cinco pontos em onze rodadas já disputadas da elite de 2000-01. A parceria foi notícia do Diário do Grande ABC à BBC, de jornais da Normandia à Alemanha, de veículos dos Estados Unidos a Portugal – alguns destes meios até divulgaram equivocadamente que ele seria o técnico. O trabalho de Dieguito envolveria mais as divisões de base, enquanto o elenco profissional seria treinado por dois ex-colegas da Copa de 1986, o volante Héctor Enrique e o líbero José Luis Brown.

Logo passou-se a falar na possibilidade de Maradona atuar em alguns amistosos do ano seguinte, e de que Claudio Caniggia teria sido um dos pedidos do amigo. Caniggia já havia sido requisitado quando ele treinava o Racing e quando negociou com o Santos, ambos no ano de 1995. Afinal, Maradona chegara a jogar ao menos um amistoso pelo Racing enquanto treinava-o – por sinal, diante do Estudiantes de Buenos Aires, justamente o rival do Almagro. Até marcou gol, de pênalti, em dia em que, curiosamente, a camisa do Racing lembrou a do Almagro (veja aqui).

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Orsi, o jogo de quinze anos atrás e Enrique e Brown no Almagro

Maradona viajou à Argentina antes do novo clube enfrentar o Racing. O jogo foi no domingo de 29 de outubro, véspera do aniversário de Diego, que fez a preleção com os jogadores mas sequer compareceu à partida, trabalhando via celular com Enrique e Brown. O adversário, que vivia péssima fase (terminaria em último), ganhou por 2-0 e a torcida tricolor começou a sair faltando 15 minutos.

Mas a injeção de ânimo parece ter funcionado: a equipe deu lampejos nos jogos seguintes. Contra o River, perdeu só após um maluco 5-4 para o poderoso adversário. Também jogou duro contra o Estudiantes (derrota de 3-2 em La Plata), Huracán (1-1), Lanús (1-1), venceu Colón (1-0) e derrotou fora de casa o Vélez (3-2). Assim, conseguindo na reta final deixar a lanterna para ficar em antepenúltimo. Se nos primeiros onze jogos havia somado cinco pontos, nos oito restantes foram oito.

Maradona, porém, na prática jamais trabalhou seriamente pelos lados de José Ingenieros. Em 5 de janeiro de 2001, na véspera da celebração dos 90 anos do clube, o La Nación denunciou que o público vinha sentindo-se enganado, pois esperava uma proximidade maior do astro com o elenco. Diego estaria mais interessado no projeto da base. Os dirigentes sonhavam que a parceria com astro geraria interesse de patrocínio que bancasse a criação de escolinhas. Só que a expectativa não se cumpriu e Diego rapidamente perdeu o interesse no projeto.

Se a relação não vingou a médio e longo prazo, como aspiravam os dirigentes, a curto até que foi boa. O Almagro, que chegou a contratar em fevereiro um sobrinho de Diego (Daniel López Maradona), fez campanha bastante digna no torneio seguinte. Deu um salto para seus padrões: terminou em décimo no Clausura 2001, sua melhor posição na elite. E vale ressaltar que ficou a apenas quatro pontos do quarto colocado, o Boca – com direito a vitória sobre o próprio Boca, recém-campeão mundial e que dali a alguns meses seria bi seguido na Libertadores.

Aquela campanha ruim no Apertura 2000 e o cruel sistema de promedios, porém, pesaram para a equipe ser rebaixada apesar da bela recuperação. O Almagro, já sem Maradona, ainda voltou à elite na temporada 2004-05. Mas fez duas campanhas ruins e tornou a cair imediatamente. E hoje está na terceira divisão, bem distante de quando sonhou como uma Cinderela.

O Futebol Portenho já visitou pessoalmente as instalações do Almagro. Quem se interessou pode conferir nossa matéria a respeito clicando aqui.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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