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Há 100 anos, o Boca estreava na 1ª divisão

Boca1913
Time de 1913 do Boca Juniors

Há exatamente 100 anos, o Boca Juniors estreava na primeira divisão argentina. Se a forma como chegou à elite não foi na bola, o debute, por outro lado, demonstrou uma autoridade desde cedo do vitoriosíssimo clube auriazul.

Antes, o esclarecimento de como o clube chegou à primeira divisão: Boca e Independiente são as duas forças argentinas que, uma vez na elite, jamais foram rebaixadas (a outra equipe argentina que pode se gabar disso é o nanico Arsenal, na primeira divisão desde 2002).

Contudo, a dupla, ironicamente, ascendeu por fatores extracampo, ao contrário dos rivais: o River subiu como campeão da segunda divisão de 1908, o Racing como campeão da de 1910 e o San Lorenzo, como vice da de 1914 – quando voltou à B, em 1981, reascendeu vencendo a de 1982. O “sexto grande” Huracán também precisou ser campeão da segundona, em 1913.

Em 1912, houve um cisma no futebol argentino: o Gimnasia y Esgrima de Buenos Aires (que deixaria o futebol em 1917), discordando da cobrança de ingressos a seus sócios, liderou um grupo de clubes que se desafiliou da Associação Argentina de Futebol e fundou a Federação Argentina de Futebol.

O Gimnasia, juntamente com o Estudiantes de La Plata e o Porteño (outro de futebol desativado; falamos dele e do GEBA na seção dedicada ao rúgbi), fizeram a FAF ganhar corpo recrutando clubes que estavam na segundona da AAF, dentre os quais o Independiente, que inclusive acabaria vice-campeão do campeonato de 1912 dos dissidentes. Disso, falamos aqui.

A AAF, para impedir novas perdas de associados, inchou em 1913 a sua primeira divisão com alguns outros clubes da inferior, dentre os quais o Boca (que começara nela desde que se afiliara ao órgão, em 1907), e com o campeão da terceira divisão, o Banfield. As duas entidades enfim acertariam uma junção em 1915, mantendo na elite os xeneizes e os rojos. Os dois nunca retornaram à segundona – um risco cada vez mais próximo para o Independiente neste semestre, por sinal.

Leal Calomino
Leal, autor dos três primeiros gols do Boca na elite; e Calomino, o mais célebre presente no jogo de 100 anos atrás

Em 1913, com a confirmação de que estaria na primeira divisão, o Boca Juniors logo acertou amistosos preparatórios, a partir de fevereiro: 2-2 contra o Club Paraná na cidade de Zárate, 1-3 contra o Racing, 5-4 no Estudiantes de Buenos Aires e 4-3 no Banfield.

Ironicamente, naquele ano, o clube que levava o bairro de La Boca no nome não jogaria lá e iria ao norte da cidade, um movimento feito pelo River Plate (então também um time de La Boca) dez anos depois. Desalojado de seu campo na área de Dársena Sur, o Boca Juniors recebeu o apoio do Estudiantes de Buenos Aires, que emprestaria sem aluguel seu estádio em Palermo, o mesmo bairro onde o River se instalaria inicialmente na zona norte posteriormente.

O primeiro jogo na elite, contudo, não foi nem em La Boca, nem em Palermo, nem na cidade de Buenos Aires, e sim na de Ituzaingó, onde os auriazuis enfrentaram o Estudiantil Porteño. Dentre os onze primeiros bosteros na elite, alguns ainda considerados ídolos históricos do clube: Juan Garibaldi, Pedro Calomino, conhecido pelas pedaladas, e Donato Abbatángelo foram assim reconhecidos oficialmente no The Book of Xentenary, a enciclopédia em inglês do centenário xeneize, em 2005.

O destaque da ocasião, contudo, foi Arnulfo Leal. Ele não só marcou o primeiro gol boquense na elite, aos 24 minutos da partida, empatando-o (Doyer abrira o placar para o adversário, aos 2 minutos), como fez também os dois seguintes, aos 47 e aos 73 minutos – um hat trick.

Tula diminuiu para o Estudiantil, aos 79, mas Abbatángelo garantiu a primeira vitória no primeiro jogo de primeira do Boca, aos 82. A mesma partida também rendeu a primeira expulsão, de Martín González, aos 87. Os estreantes terminariam o campeonato na quinta colocação, em um torneio considerado histórico também por outras razões: desde o primeiro campeonato argentino, em 1891, os vencedores sempre eram da comunidade britânica, o que se interromperia naquele 1913: a taça foi do Racing, que seria apelidado de La Academia por faturar também as seis edições seguintes.

Os titulares que entraram para a história do Boca Juniors em 13 de abril de 1913, cem anos atrás, foram Juan Bidone, Juan Garibaldi, Horacio Lamelas, Policarpo Martínez, Miguel Elena, Miguel Valentini, Pedro Calomino, Martín González, Arnulfo Leal, Francisco Taggino e Donato Abbatángelo – estes dois também fariam mais história naquele ano: foram, respectivamente, o primeiro e o segundo xeneizes usados pela seleção argentina, onde Calomino chegou a ser recordista de jogos (fez 38) de 1923 até 1945. Além de ser o primeiro boquense, Taggino também foi o primeiro jogador da seleção vindo da rivalidade Boca-River; passou pelo rival ao fim da década, um período onde nenhum havia ainda sido campeão da elite.

Abbatángelo Taggino
Abbatángelo e Taggino

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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