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“Anfitrião” dos barra bravas argentinos na Copa, Hierro Martins fala ao FP com exclusividade

Jorge Roberto Gomes Martins, 41 anos é conhecido como Hierro e é ex-líder da Guarda Popular
Jorge Roberto Gomes Martins, 41 anos é conhecido como Hierro e é ex-líder da Guarda Popular – Foto: Luís Felipe dos Santos/Terra

Faltando apenas 33 dias para o início da Copa do mundo, no Brasil, autoridades brasileiras ainda correm atrás de informações quanto aos barras bravas que virão da Argentina. Sabe-se que embora Marcelo Mallo seja o chefão das HUA (Hinchadas Unidas Argentinas), a organização tem como um de seus cabeças Pablo “Bebote” Álvarez, principal articulador da queda de Javier Cantero, ex-presidente do Independiente. Pouco se sabe, contudo, acerca de quem são os barras bravas que virão para a Copa. Presume-se que a maioria deles venha dos clubes pequenos e médios de Buenos Aires e de outras entidades do interior do país. Pois bem, mesmo no país de Cristina Kirchner a polícia tem dificuldades para lidar com os barras bravas do chamado Ascenso argentino. Falou-se muito acerca da recepção aos barras por Jorge Roberto Gomes “Hierro ‘Martins'”, ex-líder da Guarda Popular, a principal organizada do Internacional de Porto Alegre. Daí que entrevistamos Hierro para saber dessas coisas.

Entre os primeiros contatos e a entrevista, Hierro lançou em sua página no Facebook um pronunciamento oficial em que se descola da recepção aos barras. Interessante conhecer o pensamento do homem que se identifica como barra brava, embora não argumente, ao menos nesta entrevista, em favor do cenário de violência que alguns deles têm causado constantemente na ‘Terra dos Hermanos”. Vejamos o que pensa Hierro Martins.

FP – Você é sócio do Inter? Desde quando?

Hierro – Não me recordo desde quando era sócio.

FP – Após presidir a Guarda Popular por vários anos, você a considera como uma instituição à parte, em relação ao Inter?

Hierro – Veja bem, a Guarda Popular não era, no meu tempo, uma torcida organizada como entidade de direito e com eleições pra presidência e demais cargos. Fui líder da torcida de 2005 a 2011. E a torcida não pode ser uma instituição à parte de maneira alguma, é onde se perde o controle. Todas torcidas devem responder ao clube sempre. E não ao contrário, como a gente conhece alguns exemplos de torcidas que mandam em seus clubes.

FP – Quantos membros tem a Guarda Popular e qual o percentual de sócios do clube entre os membros da Organizada do Inter?

Hierro – Nunca tivemos como realmente saber o número de integrantes, justamente por não ser uma torcida organizada e com componentes cadastrados. A ideia de integrantes/simpatizantes sempre foi pela medição de pessoas por m³ no setor, sempre numa média de 3 mil pessoas em jogos normais e chegando a mais de 8 mil em jogos com grande expressão.

FP – A Guarda Popular recebe ingressos dos dirigentes colorados?

Hierro – Durante minha época de liderança sempre fui contra receber ingressos. Exigia que todos fossem sócios do clube. Em determinado momento, fomos obrigados a ter no mínimo 50 integrantes cadastrados, e eram estes que recebiam o acesso gratuito ao estádio Beira-Rio. Hoje em dia funciona como uma torcida organizada clássica, membros cadastros no clube como sócios-torcedores organizados pagando uma mensalidade simbólica ao clube e com acesso gratuito em todos os jogos no estádio Beira-Rio.

FP – O que é mais importante, o clube ou a organizada?

Hierro – O clube com toda certeza. A organizada um dia pode acabar, e eu batia sempre nesta tecla para sempre expressarem amor incondicional ao clube e não para a organizada. Tive muitos problemas por não aceitar manifestações de amor incondicional através de faixas da torcida, sempre pedia para as faixas e bandeiras expressarem amor ao clube.

FP – A Guarda Popular e outras organizadas do SCI negociam drogas? A venda – ou revenda – ocorre mesmo dentro do clube e no entorno do Portão 7?

Hierro – Negócios de drogas existem em todos os lugares. Estádios de futebol é uma mina de ouro pro comércio de drogas. Cabe a cada um querer ou não fazer parte da associação ao tráfico. Eu nunca quis, ofertas não faltavam.

FP – Você é favorável à ideia de Barra e não de torcida organizada? Onde está a diferença?

Hierro – A principal diferença é a não ter o compromisso, não estar legalmente atado a uma organização, não precisar estar uniformizado. Sou da barra, visto minha camiseta do clube e vou no setor ou não, a escolha é minha. Não ficar amarrado a uma uniformização padrão e de ter que estar e permanecer em determinado setor do estádio.

FP – Até na Argentina, falam de sua importância na chegada dos barras argentinos à Copa do Mundo. O que há de verdade nisso?

Hierro – Estou oficialmente fora da recepção aos barras da HUA. Lancei uma nota oficial no meu perfil público de Facebook.

FP – Alguns diários argentinos e também a advogada das HUA, Débora Hambo, testemunham sua participação na acomodação e locomoção dos barras, durante o Mundial do Brasil. Se você está fora da recepção aos barras, a cargo de quem ficará esta recepção?

Hierro – Conforme noticiado na imprensa, o anfitrião é outro. Não o conheço, não sei direito quem é esta pessoa, conhecia vagamente de vista no estádio, só foi visto no estádio a partir de 2011, não tem nenhum histórico.

FP – Por que você declinou de ajudar aos barras, já que se identifica com eles? Sofreu alguma pressão ou recebe alguma orientação jurídica para isso?

Hierro – Não trabalho com coisas ilegais e pesadas.

FP – Recentemente o presidente do Inter, Giovanni Luigi, negou que o clube estaria ajudando os barras, oferecendo acomodações. Você sabe alguma coisa sobre isso?

Hierro – Acredito na palavra do presidente, jamais o clube ajudaria nesta situação. Nem em jogos do próprio Internacional, por exemplo a final da Recopa de 2011, quando recebi em confraternização em torno de 800 torcedores do Indepediente o clube não ajudou. Tudo bancado pela própria renda da torcida. De positivo ficou a confraternização noticiada por toda imprensa e até pelo próprio site do clube.

FP – Qual sua relação com as HUA e seus principais líderes, como Bebote Álvarez, Marcelo Malo. Onde e quando ocorreu seu primeiro contato com os membros das HUA?

Hierro – Aqui é preciso explicar que antes de ter relações com Bebote Álvarez e HUA já tinha relações com outras barras que não eram filiadas a HUA. E sempre soube que qualquer relação com barras argentinos deve ser considerada como uma reunião de negócios. Mantive relações com Bebote Álvarez a partir de 2011, por causa da final da Recopa do mesmo ano.

FP – Na quarta-feira, dia 08/05/2014, o Governo da Província de Buenos Aires disse que enviará às autoridades brasileiras os dados dos barras bravas. E a polêmica em torno disso segue acesa. Na sua opinião, o acesso das autoridades brasileiras aos dados pessoais dos barras é relevante para impedir a chegada deles ao Brasil?

Hierro – Será relevante para os principais líderes da HUA, os que são figurinhas marcadas. Pois estes terão problemas pra entrar no Brasil, porque a Segurança Pública estará atenta. Porém, não tem como impedir 1.500 barras da lista do “derecho de admisión” de passarem nas fronteiras.

FP – A AFA assegura que não dará ingressos para os barras. Você acredita nisso?

Hierro – Não acredito. E tenho mantido contatos com diversas barras que me asseguram e dizem até a quantidade de quantos ingressos cada barra já conseguiu junto a AFA. Pelas minhas contas algo em torno de 800 ingressos já foram destinados às principais barras (HUA, LA 12, LBDT e gente de Billardo em La Plata) Pra política da Argentina, a cidade de La Plata é ponto-chave em qualquer eleição partidária, só ligar os fatos.

FP – A polícia brasileira está preparada para lidar com eventuais problemas causados pelos barras argentinos?

Hierro – A polícia brasileira tem muito pouca informação, será sempre pega de surpresa. O fator-surpresa é negativo pra polícia brasileira.

FP – Recentemente você tuitou a frase: “NÃO TRABALHO NA ILEGALIDADE !!! C/C: Para jornalistas e órgãos de segurança que me investigam. H.M. – ‘O inimigo agora é outro’”. Que inimigo é este, Hierro?

Hierro – Eu estava sendo considerado erroneamente inimigo pelas autoridades da Segurança brasileira. Eu era o que havia de mais oficial e dentro da legalidade que as autoridades poderiam contar para esta invasão de barras no Brasil. Tinha portas abertas pra tratar todos os assuntos com Polícia Federal e Polícia Civil; todos os contatos estavam sendo feitos, e assim seria a maneira que eu iria proceder. Agora os órgãos de segurança que se virem e tratem de investigar quem realmente eles acham que venha a ser um novo inimigo. Estou fora oficialmente disto tudo !!!

Abaixo, na íntegra, o pronunciamento oficial de Hierro Martins, na sua página do Facebook:

Boa tarde para toda gente do Brasil e da Argentina.

Venho através desta postagem esclarecer de forma oficial que não serei o anfitrião das Hinchadas Unidas Argentinas (HUA) durante o Mundial Brasil 2014. Diversos meios de imprensa da Argentina e também aqui do Brasil ainda noticiam o meu nome como anfitrião.
Deixo também dito aqui que apesar de ser um homem que mantém uma postura fiel com certos códigos/conduta, respondo a um juizo/processo no Brasil, e o mais importante neste momento para a minha vida pessoal é tratar deste juizo/processo, pois isto que vai me dar resguardo para a continuação da minha vida social no Brasil.

Não aceito trabalhar com coisas ilegais e pesadas. Não sou um bandido. Talvez os que aceitem sejam bandidos, mas eu não sou e tenho que me afastar deste tipo de associação.

No momento estou colaborando oficialmente com tudo e todos, das melhores maneiras possíveis, para continuar mostrando que o caminho que sempre escolhi e defendi é o da legalidade das coisas.
H.M. – “Em favor do réu …” – Síntese

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

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