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Argentinos de Atlético e Real

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Solari: rebaixado no Atlético, campeão da Liga dos Campeões no centenário do Real (na última vencida pelos blancos)

Em poucas horas haverá a histórica final entre Real Madrid e Atlético de Madrid na Liga dos Campeões, pela primeira vez decidida entre clubes da mesma cidade, opondo a ânsia merengue pelo décimo título e a agonia colchonera pelo primeiro. São dois clubes repletos de hermanos em suas histórias, muitos deles ídolos. Contabilizando aqueles que defenderam a seleção espanhola, estes são os times estrangeiros que mais levaram argentinos à seleção: o Atleti com 17, o rival com 16. Sendo que dois, os únicos argentinos vira-casacas em Madrid, conseguiram por ambos.

Tirando a dupla, estes outros dez aqui já defenderam a Albiceleste vindos do Real Madrid: Jorge Valdano, Oscar Ruggeri, Fernando Redondo, Esteban Cambiasso, Walter Samuel, Fernando Gago, Gabriel Heinze, Javier Saviola, Gonzalo Higuaín, Ángel Di María. Já Alfredo Di Stéfano, Héctor Rial, Juan Carlos Touriño e Roberto Martínez (não confundir com o técnico do Everton) jogaram pela Furia.

Já os rojiblancos usados pela Argentina, além dos dois em questão, foram estes outros doze: Ramón Heredia, Rubén Ayala, Luis Islas, o atual técnico Diego Simeone, Germán Burgos, Ariel Ibagaza, Fabricio Coloccini, Leo Franco, Sergio Agüero, Maxi Rodríguez, Eduardo Salvio e José Sosa. Só a Internazionale supera o Atlético como clube estrangeiro mais “selecionado” na Argentina. A Espanha usou José Gárate, Rubén Cano e Mariano Pernía.

Os dois argentinos doblecamisetas na rivalidade madrilenha (nenhuma outra estrangeira cedeu mais de um jogador à seleção argentina) tiveram trajetórias opostas e semelhanças. Ambos passaram diretamente de um rival ao outro e se saíram melhores com a troca. Só que Juan Esnáider veio do Real para o Atlético. E Santiago Solari fez o inverso.

Esnáider foi pinçado ainda adolescente pelo Real na base do Ferro Carril Oeste no início dos anos 90. Primeiramente foi usado no time B madridista, demonstrando ser um goleador em estado bruto. Mas não encontrou lugar na equipe principal. Em 1993, foi repassado ao Real Zaragoza. Ali, foi muito bem: logo faturou a Copa do Rei e, sobretudo, a Recopa Europeia, marcando na final contra o Arsenal. Nas duas temporadas ali, foi o artilheiro do time aragonês.

O Real logo trouxe Esnáider de volta em 1995, ano em que ele enfim estreou pela Argentina. Mas realmente não combinou com os merengues. Na reserva de Raúl e Iván Zamorano, recebeu mais amarelos (cinco) do que fez gols (só um) em 20 jogos em temporada marcada pela dobradinha do Atlético no Espanholzão e na Copa do Rei, feito inédito no país.

Acabou parando no rival. Ficou só a temporada 1996-97, mas se saiu muito melhor: artilheiro do elenco colchonero com 16 gols em 35 jogos em La Liga, à média de quase meio gol por jogo como nos tempos de Real Madrid B e Real Zaragoza. Sua segunda partida pela Argentina deu-se como atleticano.

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Esnáider: reserva em anos de Real, artilheiro em passo fugaz no Atlético

Logo depois, passou ao Espanyol, onde continuou bem afiado, ainda mais para o porte do clube: 15 gols em 37 jogos e mais uma vez era o máximo goleador do elenco em que atuava. Seu terceiro e último jogo pela seleção foi inclusive pelo primo pobre do Barcelona, mas ficou de fora da Copa 1998. Dali passou à Juventus e por diversos outros clubes, como River e Newell’s, mas só teve sucesso novamente em uma rápida volta ao Real Zaragoza em 2001 (campeão de novo na Copa do Rei).

Enquanto Esnáider deixava a Espanha rumo à Juve, ao país chegava Solari, outro que poderia ter ido à Copa de 1998 pelo bom desempenho naquele saudoso River dos anos 90. Mas sua primeira convocação só viria já pelo Atlético de Madrid, em 1999. O meia-esquerda não poderia ter escolhido momento mais inoportuno para chegar ao clube. Foi a temporada em que o time, mesmo com Gamarra na zaga e os gols de Jimmy Floyd Hasselbaink, foi rebaixado, muito atrapalhado pelo caos institucional por dívidas.

Em meio ao vexame, o talento de El Indiecito (ele é sobrinho de Jorge Solari, jogador da Argentina na Copa de 1966 apelidado de El Indio) foi reconhecido pelo rival, que acabava de vencer a Liga dos Campeões. Santiago teve bons momentos no Real, integrando o título de 2002 nesse torneio, especial de diversas formas: foi o último vencido pelos madridistas, foi no ano do centenário do clube e houve direito a eliminar o Barcelona na semifinal.

Negando que teria traído o Atlético, Solari assim se justificou em entrevista: “não tivemos presidente por seis meses e as contratações eram feitas por um juiz porque o clube estava sob intervenção com quebra. Os torcedores apoiaram até o final. Consumado o descenso, o Atlético me comunicou que não podia manter a mim e outros jogadores, que o ajudassem buscando clube. Apareceu o Real Madrid e fui. Fiz gols no Vicente Calderón e não os celebrei, sempre me comportei respeitosamente. Tenho muito carinho pelo Atlético, e o povo me devolve, nunca tive um problema na rua”.

Apesar de ser titular naquele elenco histórico, Solari foi solenemente ignorado por Marcelo Bielsa na convocação ao mundial da Ásia logo depois, embora lembrado em alguns amistosos pré-Copa. Foi perdendo espaço depois no próprio Real, com a crescente valorização de reforços midiáticos. Em 2005, com o modelo galáctico já em crise, quase foi ao Manchester United, mas terminou indo junto com o compatriota Walter Samuel e o português Luís Figo à Internazionale. Mas, ao contrário deles, não se firmou em Milão. Hoje vive em Madrid e treina categorias de base do Real.

Além deles dois, podemos citar a ocasião em que Alfredo Di Stéfano vestiu a camisa do Atlético! A Flecha Loira chegara à Espanha em 1953 com contratos com Barcelona e Real. Acabou ficando só no Real, que o contratara diretamente do Millonarios; o Barça acertara com o River, dono oficial do passe do argentino, e se negou a alterna-lo com o Real a cada temporada, uma sugestão feita para resolver o impasse. Ainda assim, Di Stéfano jogou algumas vezes depois pelos blaugranas, em amistosos festivos.

Da mesma forma vestiu a camisa rojiblanca. Foi em 6 de janeiro de 1955, no jogo que celebrou Adrián Escudero, jogador que completava dez anos de Atlético e que é o maior artilheiro do rival no campeonato espanhol. O Real cedeu o argentino e também Joaquín Oliva e Luis Molowny para a ocasião.

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Di Stéfano no Atlético de Madrid! Em pé: Riquelme, Martín, Oliva, Corbo, Hernández e Augustín. Agachados: Miguel, Ben Barek, ele, Molowny e Escudero

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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