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Meia década sem os históricos Raffo e Infante

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Infante e Raffo onde se deram melhor: no Estudiantes e no Racing

Há cerca de cinco anos, o futebol argentino perdeu dois antigos goleadores. Curiosamente, ambos viraram casacas em grandes rivalidades do país. São Norberto Raffo, ex-Independiente e Racing e ex-Banfield e Lanús (raro campeão em cada dupla), e Ricardo Infante (raro doblecamiseta da ferrenha rixa Estudiantes-Gimnasia), sexto maior goleador do campeonato argentino, com 217 gritos em 439 jogos.

Infante foi revelado pelo Estudiantes nos dourados anos 40 do futebol argentino. O alvirrubro estava longe da importância internacional que as 4 Libertadores lhe trariam: era só um tradicional nanico, com apelo restrito a La Plata. Até 1967, quando o próprio Estudiantes se tornou o primeiro campeão argentino de fora dos “cinco grandes” (Boca, River, Racing, Independiente e San Lorenzo) desde 1929 (vencido justo pelo Gimnasia), a glória aos times restantes era se intrometer entre os cinco.

O Pincha conseguiu isso regularmente naquela década. A partir justamente de 1942, quando Infante estreou, a equipe não ficou abaixo do sexto lugar. Foi em 1944 que os gols começaram a surgir com frequência, com 19 no campeonato e o time ficando em 3º, melhor colocação do Estudiantes no campeonato profissional até então. O clube conseguiu ainda vencer a Copa Adrián Escobar, tradicional troféu da época que reunia em mata-mata os sete melhores colocados do campeonato nacional.

Em 1948, o clube foi novamente 3º e Infante, vice-artilheiro do campeonato, além de marcar pela primeira vez no Clásico Platense, “atraso” que tirou com sobras: foram três em um 6-1, maior goleada do dérbi até o 7-0 sobre o rival em 2006. O gol mais lembrado naquele ano foi, porém, sobre o Rosario Central: fez um de fora da área – de letra. A estreia na seleção, porém, só viria em 1952, até fazendo gol, no 1-0 sobre a Espanha quando a Argentina venceu pela primeira vez em Madrid.

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Ambos passaram por duas das maiores rivalidades argentinas. Infante foi melhor do lado vermelho de La Plata; Raffo, no do azul de Avellaneda

El Beto sofria com a concorrência excepcional na seleção. Já no clube, fez grande dupla com o ponta Manuel Pelegrina: eles são justamente os maiores artilheiros da história do Estudiantes (Infante com 180 gols; Pelegrina, ponta que mais fez gols na Argentina, com 221). Ambos passaram ao Huracán, então “o sexto grande”, em 1953, por conta de uma intervenção política que se estendeu do Pincharrata à própria cidade de La Plata, renomeada Ciudad Eva Perón em homenagem à recém-falecida Evita. O alvirrubro, que já não vinha tão bem na nova década, não resistiu e foi rebaixado em 1953.

No Huracán, Infante não foi mal, até marcando duas vezes no clássico contra o San Lorenzo e sendo lembrado pela raça, mas o clube sim (penúltimo e quase rebaixado em 1954). Voltou ao Estudiantes em 1957 e, aos 34 anos, até integrou a seleção que foi à Copa do Mundo de 1958, ainda que sem jogar. Em 1960, chegou a ser jogador e treinador do clube, antes de passar rapidamente pelo Gimnasia em 1961, quando parou de jogar. Também foi vira-casaca como técnico: passou a trabalhar nos juvenis dos Triperos e assumiu interinamente o time principal alviazul algumas vezes.

No Clásico Platense, assim como no Estudiantes, Infante, com 8 gols (todos pelo Pincha), só está atrás do amigo Pelegrina, que fez 11. Infante é o único que marcou dez gols no lendário Amadeo Carrizo, considerado o maior goleiro do futebol argentino.

Enquanto El Beto parava de jogar, Norberto Raffo começava. Estreou em 1957, no Independiente. O Rojo não vivia bom momento: não era campeão desde 1948 e vira o rival Racing conseguir quatro títulos argentinos desde então. O jejum, o maior da história dos Diablos, enfim acabou em 1960. Mas Raffo não teve grande participação e no ano seguinte acabou no Banfield, na segundona.

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Raffo também passou por outros rivais, Banfield e Lanús, indo bem e sendo campeão nos dois. À direita, comemorando um dos seus gols pelo Racing no mágico 1967

Com treze gols, ajudou o novo clube a ser campeão dela em 1962. Na volta à elite, só não marcou contra o River ao enfrentar os cinco grandes em 1963 (fez até três nos 3-0 sobre o Racing). Estreou pela seleção em 1965. Ficou até 1966 no Taladro e deixou 68 gols, sendo o terceiro maior artilheiro dos alviverdes. O Racing, vítima constante, o trouxe para si em 1967. Jaime Martinoli, seu antigo colega de Banfield, vinha fazendo sucesso: foi o artilheiro do elenco racinguista campeão em 1966 no embalo recordista de 39 jogos invictos. Raffo seria o melhor reforço da Academia para 1967.

O Independiente vencera a Libertadores em 1964 e em 1965, sendo o primeiro clube argentino campeão do torneio. Já em 1967, foi a vez do Racing vencê-la, com participação fundamental da novidade: Raffo foi o artilheiro daquela Libertadores, com 14 gols e, sobretudo, fez o gol do título, o segundo nos 2-1 sobre o Nacional na finalíssima em Santiago (clique aqui). Ele também fez nos 2-1 no Celtic em Avellaneda, pela Intercontinental, vitória que forçou o jogo-extra na neutra Montevidéu, já que os escoceses haviam vencido em casa. O Racing venceu, tornando-se o primeiro clube argentino campeão mundial (clique aqui). El Toro, o maior artilheiro do time em torneios internacionais, ficou eterno, mas não duradouro.

Já em 1969, aos 30 de idade, saiu do Blanquiceleste. Foram só 63 jogos, com 26 gols, quatro no Clásico de Avellaneda; marcou um outro no dérbi em 1957, pelo Independiente. Passou rapidamente pelo pequeno Atlanta. Deixou sua marca uma vez no clássico contra o Chacarita (campeão nacional daquele ano) e um pouco mais, mas não durou no Bohemio. Em 1971, estava um degrau abaixo, na segundona pelo Lanús, bastante distante do porte que tem hoje. Foi campeão pelo Granate, inclusive marcando no clássico original do clube, contra o sumido Talleres da cidade vizinha de Remedios de Escalada.

Parou de jogar na liga da província de Jujuy, no Altos Hornos Zapla. Treinou tanto Banfield como o Lanús, clube do coração dele e sua família: na função, foi novamente campeão da segundona em 1976. Trabalhou um bom tempo nos juvenis grenás na virada dos anos 80 para os 90, quando a rivalidade entre eles, ambos do sul da Grande Buenos Aires e de torcidas amigas, floresceu energicamente por encontrarem-se mais entre si do que com seus rivais originais (o do Banfield era o Los Andes, da vizinha Lomas de Zamora). Ainda treinou o rival lanusense do Talleres de Escalada no fim dos anos 90.

Ricardo Roberto Infante, nascido em 21 de junho de 1924 e que não se limitava a “apenas” fazer gols, sendo bom também em armar jogadas para colegas, faleceu em 14 de dezembro de 2008. O oportunista Norberto Santiago Raffo (que nascera em 27 de abril de 1939), potente cabeceador apesar de baixa estatura que compensava pela grande impulsão, faleceu dois dias depois.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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