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75 anos da maior goleada do clássico de Avellaneda: Independiente 7-0 Racing

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Se um certo 7-1 marcou a ferro e fogo os torcedores do lado derrotado, imagine um 7-0. E imposto pelo seu maior rival. Era esse o cenário em Avellaneda naquele 3 de novembro de 1940. Essa é também a maior goleada envolvendo dois dos cinco grandes do futebol argentino, grupelho que formam com Boca, River e San Lorenzo.

Em 1940, o Independiente era o bicampeão seguido na Argentina. Em 1938, voltara a ganhar o campeonato após doze anos. O bi de 1938-39 significou também os primeiros títulos profissionais do Rojo. Vieram no embalo do superartilheiro paraguaio Arsenio Erico, até hoje o maior goleador do campeonato argentino. Já dedicamos especial a ele, que faria cem anos em 2015: clique aqui.

Já o Racing, grande potência do amadorismo, vivia jejum há quinze anos, embora lutasse pelas cabeças na maior parte dos anos 30. Em 1940, a Academia também tinha um artilheiro paraguaio: Delfín Benítez Cáceres, que havia brilhado pelo Boca e que seria o artilheiro daquele campeonato, superando ao menos nisso o compatriota Erico, rival desde quando jogavam na terra natal (Erico no Nacional, Benítez Cáceres no Libertad). Benítez, que por seu Paraguai havia jogado a Copa de 1930, havia defendido até a seleção argentina.

Outro atacante de qualidade do lado derrotado era o ponta Enrique García, apelidado de “poeta da canhota”. E o homem que por décadas foi o recordista de jogos por ela era o zagueiro José Salomón, outra figura daquele Racing. O que só torna mais incrível aquela goleada.

O Independiente lutava pelo tri seguido com um timaço. Já havia ganho de 7-1 do Boca (até hoje a derrota mais elástica dos auriazuis) e de 8-1 do Estudiantes. Alguns de seus jogadores passariam ao futebol brasileiro, casos do beque Sabino Coletta no Flamengo e do lateral-esquerdo Celestino Martínez no Fluminense. Mas quem brilharia seria Antonio Sastre, contratado já veterano pelo nascente São Paulo para ajuda-lo a vencer seus primeiros títulos desde a refundação do clube (em 1935).

Sastre era um multi-homem que sabia jogar no ataque, no meio, na defesa e até no gol e já foi considerado o mais completo jogador argentino. Segundo o técnico Osvaldo Brandão, foi o homem que teria ensinado os brasileiros a jogar futebol, embora eles atualmente atribuam as primeiras taças são-paulinas apenas a Leônidas. Outro daquele Rojo que deixou sua marca nos brasileiros foi Vicente de la Mata, mas de outra forma: na final da Copa América de 1937. Ele foi o adolescente que entrou na prorrogação do jogo-desempate para marcar os dois gols do título. Seu filho, também chamado Vicente de la Mata, venceria duas Libertadores no Independiente e eles foram o primeiro caso de pai e filho aproveitados na seleção.

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Salomón, do Racing, e Erico, do Independiente.

Quem abriu o marcador, porém, foi um volante central aguerrido chamado Raúl Leguizamón. O primeiro tempo ia acabando no 0-0. Leguizamón substituíra o grande Juan Carlos Corazzo (avô materno de Diego Forlán) e inaugurou o placar aos 41 minutos, de cabeça. A balança logo foi retorcida: aos 43, Erico, também de cabeça, ampliou.

“Na etapa complementar, tudo se via colorado. O Racing foi empalidecendo como uma dessas más fotografias que os anos apagam” foi a descrição da revista El Gráfico na época. Os rojos não exatamente metralharam do início ao fim, mas foram felizes em pontuais blitzkrieg. Dois novos gols vieram aos 13 e aos 15 minutos: primeiramente com o ponta-esquerda Juan José Zorrilla, também de cabeça (“como mestre, quase ao nível do chão”, descreveu a El Gráfico), e depois com De la Mata.

“O que ia fazer o Racing se não tinha nada? Começou o êxodo dos torcedores visitantes. Chegava a meia hora, Salomón sentiu os efeitos do calor e se foi do campo. Como os restantes fazia tempo que se haviam ‘ido’, o Independiente ficou só”. Os gols que fecharam o massacre vieram aos 40 (novamente Zorrilla), 42 (novamente De la Mata) e 44 (novamente Erico).

Apesar da goleada, o Independiente não conseguiria o tri. Ficou em segundo a oito pontos do Boca, em tempos onde a vitória valia dois e não três pontos. Foi um campeonato atípico: o rebaixado foi o Vélez, que desde que retornou à elite não mais caiu e é quem há mais tempo está seguidamente na primeira divisão além do “incaível” Boca – as más línguas dizem que o Independiente deixou o Atlanta ganhar-lhe na última rodada para se vingar do Vélez, que atrapalhara as pretensões de título dos Rojos ao lhes vencer por 5-4. O Atlanta era o concorrente velezano contra o rebaixamento e as suspeitas ganharam força quando passou pouco tempo depois seu melhor jogador ao Independiente, José Battagliero.

Além do rebaixamento do Vélez, foi um torneio repleto de outras goleadas: Boca 8-2 Gimnasia (na rodada seguinte à derrota auriazul de 7-1 para aquele Independiente!), Gimnasia 7-1 Tigre, Banfield 7-3 Atlanta, Tigre 7-2 Rosario Central, Huracán 6-0 Estudiantes, Chacarita 6-1 Atlanta, Newell’s 6-1 Lanús. Outras partidas cheias de gols foram a favor do Racing: 6-5 no Lanús e 6-3 (com quatro gols de Benítez Cáceres) no River. O que não impediu que os dirigentes racinguistas, diferentemente dos brasileiros, multassem os jogadores que apanharam de sete.

As escalações de 75 anos atrás foram Fernando Bello; Manuel Sanguinetti e Sabino Colleta; Luis Franzolini, Raúl Leguizamón e Celestino Martínez; Juan José Maril, Vicente de la Mata, Arsenio Erico, Antonio Sastre e José Zorrilla, treinados por Guillermo Ronzoni, no Independiente. E, no Racing, os humilhados foram Albino Risso; José Salomón e Héctor Vidal; Raúl Santiso, Héctor Narvarte e José García; Juan Ángel Devizia, Vicente Zito, Delfín Benítez Cáceres, Atilio Fila e Enrique García, treinados por Emilio Firpo.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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