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Por uma cidade e por uma torcida: Atlético Rafaela está próximo da elite

Uma cidade com pouco mais de cem mil habitantes, no interior da província de Santa Fé está prestes de ter o seu time na elite argentina. O Atlético de Rafaela está a poucas rodadas de retornar à primeira divisão, no qual esteve pela primeira e única vez na temporada 2003/2004. Desde então, a luta do clube contra o imponderável e a falta de sorte para subir, bem como o apoio irrestrito de seus hinchas e da cidade de Rafaela, compõem o enredo de um filme épico ou, se preferirem, um retrato fiel da essência do futebol.

É certo que se pode alegar que o time pareceu amarelar em uma ou outra situação. Mas o enredo do filme é mais denso. Desde que retornou à B Nacional, La Crema tem sido um exemplo de persistência e de ótimas campanhas para seu retorno à elite. Além disso, se estruturou de maneira correta, aportando recursos e contratando jogadores de maneira cirúrgica para as necessidades do elenco. Dessa forma, o clube chegou à Promoción nos dois últimos campeonatos. Seu adversário em ambas as oportunidades foi o mesmo: Gimnasia y Esgrima de La Plata.

Rafaela venceu por 3x0 no primeiro jogo da Promoção em 2009, mas tomou o troco na volta

No primeiro embate, em 2009, o Rafaela marcou 3×0 em casa e foi a La Plata confiante de que sairia com a promoção. No jogo, até que La Crema se comportava bem diante de um local nervoso e sem acertar as jogadas. Então surgiu o primeiro gol, aos 27 minutos do segundo tempo. Até aí tudo bem, a vantagem era grande. Só que a sorte se mostraria contrária ao time de Rafaela. O segundo gol saiu aos 44 e o terceiro aos 46 minutos, ambos feitos por Franco Niell, hoje no Argentinos Juniors. Em meio à festa dos locais, os hinchas de La Crema pareciam perplexos; o sonho seria adiado por mais um ano.

No segundo confronto, em 2010, o pesadelo foi ainda maior. Embora tenha jogado muito, o placar foi de apenas 1x 0 em casa. Porém, o time era bom e mereceu a confiança de seus hinchas, que novamente foram à cancha de El Lobo. Apesar de sofrer o primeiro gol, aos 2 minutos, o visitante assumiu o controle do jogo, adiantando sua marcação e confundindo a zaga do Lobo com um esquema que variava de um 4-4-2 para um 4-3-1-2. Empatou aos 19 minutos. Aos 41, teve um jogador expulso de maneira controversa; na cobrança da falta, o Lobo passou à frente. Em um 2º tempo muito disputado, La Crema teve mais um jogador expulso aos 28 minutos. Estava então com dois homens a menos, na cancha adversária, num jogo aberto, em que precisava de um gol.

Contudo, suas últimas tentativas de reação foram empacotadas com um incidente grave. Aos 35, em rápido contra-ataque do Lobo, o jogador Lucas Castro chocou seu joelho direito contra o rosto do arqueiro Gabriel Airudo. O goleiro saiu de campo ensanguentado, numa ambulância, com 7 fraturas no rosto e com profundo descolamento de retina. La Crema entregava os pontos e ainda veria o local anotar o 3º gol aos 48. No meio da festa dos locais, a pequena torcida do Rafaela, longe de casa, dividia suas lágrimas entre o sonho adiado da promoção e a preocupação com o destino de Airudo.

Em 2010, além de perder a vaga na elite, Gabriel Airaudo perdeu a visão do olho direito

Mas o Rafaela não se entregou. Manteve o técnico Carlos Trullet, se reforçou e se planejou para ser, hoje, o senhor absoluto da B Nacional. Ninguém joga tanto no torneio quanto o Rafaela; o time é sólido, com um meio de campo forte e que sabe sair para o jogo. Sabe jogar fora e dentro de casa; não se assusta com os adversários e, em geral, tem sempre as ações da partida. Ficou quatro meses invicto no atual torneio, tem o seu goleador e tem tudo para ser o campeão da segunda divisão argentina.

E a ironia da história é que enquanto La Crema deverá subir direto à 1ª divisão, o seu adversário das duas últimas promociones, El Lobo de La Plata deverá cair também direto ao Nacional B. Ambos não viverão o tradicional confronto da Promoción. La Crema subirá para pegar justamente o lugar de seu antigo rival. Alguns poderão falar que “quem rir por último rir melhor”, ou que “a justiça tarda, mas não falha”. Este cronista prefere dizer que o futebol tem dessas coisas, por isso é tão singular. E belo.

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

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  • Felicitaciones a los hinchas de Atlético Rafaela! Esa ciudad se merecía que su club regrese a la primera division argentina.

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