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Elementos em comum entre Boca e Barcelona

Boca e Barcelona travarão nessa terça-feira a Copa Maradona, embora um troféu com esse nome devesse envolver num mundo ideal um mata-mata argentino entre os xeneizes e o Argentinos Jrs no estádio do Newell’s e um mata-mata europeu dos culés com o Napoli no campo do Sevilla para que os vencedores então duelassem no estádio Azteca – e não, decididamente, na Arábia Saudita. Caráter caça-níquel à parte, a homenagem póstuma é um bom chamariz para relembrarmos os outros fatores que aproximam a camisa azul y oro do manto blaugrana.

Uma primeira ligação entre os dois clubes pode ser associada aos irmãos Scarone, craques seminais na ascensão da seleção uruguaia como potência. Carlos Scarone, o mais velho, esteve entre março e abril de 1916 no Boca, já com renome de um ponta brilhante na dupla Peñarol (ao sair de lá justificando-se ao pai, um italiano torcedor aurinegro, que buscava evitar mangiare merda, originando-lhes o apelido manyas) e Nacional. Participou de quatro partidas do campeonato argentino antes de voltar ao Nacional. E os tricolores revelaram seu irmão caçula Héctor Scarone, ainda mais craque, a ponto de ser o primeiro jogador que os catalães importaram de um clube do outro lado do Atlântico.

Consagrado nas Olimpíadas de 1924, Héctor apareceu em Les Corts em 1926. O Barcelona já pertencia a um futebol profissionalizado, o que impediria o craque de eventualmente reforçar o Uruguai nas Olimpíadas seguintes. Assim, ele voluntariamente se absteve de defender os blaugranas na Copa do Rei ou no campeonato catalão (a liga espanhola ainda não existia), se limitando a amistosos antes de regressar a Montevidéu ainda naquele ano. O Scarone mais novo seria premiado com o bicampeonato olímpico e presença na vitoriosa Copa do Mundo de 1930. Sua qualidade nos amistosos pelos culés sempre foi reconhecida e ele seria o escolhido para nomear a penya de torcedores do Barça residentes no Uruguai.

O uruguaio Silveyra foi o primeiro a jogar nos dois clubes: à direita, cabeceia para aplicar a lei do ex em 1963

É que apenas em 1928 houve de fato um primeiro encontro entre as duas equipes. O Barcelona excursionou pelo Rio da Prata naquele ano e só conseguiu vencer o amistoso contra o Boca, justamente, realizado após duas derrotas (3-2 e 1-0) e um empate (0-0) contra a própria seleção argentina e uma goleada de 4-1 sofrida para o Independiente. Em 18 de agosto, Josep Sastre abriu dois gols de vantagem no estádio boquense de madeira que os xeneizes mantiveram até 1938 em seu endereço atual, quando começaram as obras para La Bombonera substitui-lo. Recém-artilheiro das Olimpíadas de Amsterdã, Domingo Tarasconi (que deixara gols sobre La Coruña, Athletic Bilbao e Espanyol no triunfo europeu do Boca em 1925), apenas diminuiu o prejuízo, sem evitar o revés de 2-1. O goleiro culé daquela ocasião seria justamente o primeiro nome a realmente trabalhar na dupla: o húngaro Ferenc Plattkó.

Como goleiro, Plattkó substituiu no Barcelona ninguém menos que a lenda Ricardo Zamora, defendendo o arco barcelonista por sete anos, entre 1923-30 – período que abarcou a conquista da edição inaugural de La Liga (1929-30), além de três Copas do Rei e seis edições do campeonato catalão nos tempos finais de prestígio do torneio regional. Voltou a Les Corts como técnico na temporada 1934-35, limitando-se a novo título catalão. Com a proximidade da Segunda Guerra Mundial, veio à América do Sul em 1939 e logo foi campeão chileno invicto com o Colo-Colo. Foi seu trampolim ao futebol argentino. O detalhe é que quem o contratou foi o River mesmo, em 1940. Além de primeiro a trabalhar em Boca e Barcelona, ele foi igualmente o primeiro a passar por River e Barcelona.

Seu passo em Núñez foi fugaz para ter alguma influência reconhecida na nascente La Máquina, algo que coube a seu sucessor Renato Cesarini. No Boca, ele esteve em 1949, justamente em um dos piores anos da história do clube, quase rebaixado. Lá, foi o inverso, tendo substituído Cesarini. É o único estrangeiro a ter treinado a dupla principal do futebol argentino. Plattkó ainda teria um terceiro ciclo no Barcelona, na temporada 1955-56.

Estranho, mas verdadeiro: Di Stéfano jogou amistosos pelo Barcelona e treinou um Boca campeão argentino

Já primeiro a efetivamente jogar nos dois clubes foi outro uruguaio. Alcides Silveyra chegou à Argentina em 1960 para defender inicialmente o Independiente, após ser campeão e eleito o melhor jogador da segunda Copa América de 1959 (a realizada no Equador). Foi pé-quente: o Rojo encerrou seu pior jejum até então, doze anos pendentes desde 1948. Silveyra foi ao Barcelona em 1963, mas bateu de frente com a vedação da liga espanhola a novos estrangeiros. Assim, naquele mesmo ano ele voltou às margens do Riachuelo, repatriado pelo Boca para seguir sendo um marcador duro e temperamental – por vezes tachado de mal intencionado. Chegou a tempo de disputar a Libertadores de 1963 precisamente para as duas finais contra o Santos. Bicampeão argentino em 1964-65, chegou a ser jogador-técnico em 1967.

O ano de 1963 também marcou os dois encontros seguintes entre Boca e Barcelona. Os espanhóis voltaram a fazer uma pré-temporada no Rio da Prata e em 4 de julho sapecaram um 3-0 sobre um combinado portenho e, apenas 48 horas depois, seguraram em Montevidéu um 2-2 com o Nacional. Mas, no feriado argentino de 9 de julho, La Bombonera viu o troco por 1928 até mesmo no placar: o brasileiro Paulinho Valentim e o decaído craque Omar Corbatta abrindo 2-0 descontado depois pelo belga Raymond Goyvaerts. No fim do ano, foi a vez do Boca fazer pré-temporada na Europa, das mais gloriosas, mantendo-se invicto ao fim de oito partidas. A primeira foi no Camp Nou, que viu José Sanfilippo abriu o marcador e o próprio Alcides Silveyra amplia-lo até Luis Vidal descontar a dez minutos do fim.

Em julho de 1964, o Barcelona novamente voltou à Argentina para uma pré-temporada, juntando-se a Botafogo e à dupla Boca e River na chamada Copa Iberoamericana, sediada no Monumental de Núñez. E os europeus passaram vergonha, perdendo as três partidas; já haviam levado de 5-1 do River quando, em 12 de julho, souberam oferecer mais resistência aos xeneizes: Silveira voltou a aplicar a lei do ex para abrir o placar aos 17 minutos, igualado já aos 28 pelo craque húngaro Sándor Kocsis. O obscuro paraguaio Benicio Ferreira anotou o 2-1 logo no primeiro minuto de segundo tempo – e, curiosamente, coube a outro paraguaio empatar de imediato, aos 13 (Cayetano Ré). Aos 19, o craque Ángel Rojas, o Rojitas, anotou o da vitória. Já nos referimos a ele como o Riquelme dos anos 60, aliás.

Campeão da Libertadores 1977, o defensor Alberto Tarantini praticamente só vestiu o uniforme do Barcelona em sua apresentação: o negócio não se confirmou e ele foi à liga inglesa

Como Silveira, o nome seguinte a jogar nos dois, curiosamente, também foi estrangeiro. O peruano Miguel Ángel Loayza havia se destacado, por sua vez, na primeira Copa América de 1959, a realizada em solo argentino – a ponto de sair dali contratado pelo Barcelona. O Boca contratou-o dos catalães em 1961. Foi reconhecido como talentoso (34 gols em 62 jogos, ótimos números a um meia-direita), mas não conseguiu continuidade. A partir de 1964, rodou por outras camisas argentinas, o que incluiu a do River, em 1966, além do Rosario Central e duas passagens pelo Huracán. Loayza radicou-se em Buenos Aires e nela faleceu, em 2017.

Os dois nomes seguintes, tal como Héctor Scarone, vestiram a camisa blaugrana, mas nunca em competições. O caso de Alfredo Di Stéfano é famoso: os catalães negociaram seu passe junto ao River, detentor oficial perante a FIFA, enquanto o Real Madrid acertou diretamente com o Millonarios, onde o argentino pertencia de facto na liga pirata colombiana. A salomônica decisão da federação espanhola em alterna-lo entre a dupla a cada temporada foi rechaçada pelo Barcelona. E assim Di Stéfano, já com alguns amistosos a serviço dos culés, sedimentou sua lenda emergindo o arquirrival, embora mesmo depois da polêmica voltasse ocasionalmente a reforçar o Barça em jogos festivos. Sua relação com o Boca, por sua vez, começou na vida familiar: o pai, também chamado Alfredo Di Stéfano, defendeu o time adulto azul y oro uma única vez, em amistoso em 1914.

Um tio, Dante Pertini, chegou inclusive à seleção nos anos 20 na esteira dos primeiros títulos argentinos do Boca e da consagradora excursão europeia de 1925, a primeira de um clube argentino. Irmãos dele, Juan Pertini defendeu rapidamente o clube em 1922 e Luis Pertini seria vice-presidente entre 1947 e 1953. O craque do Real Madrid, de fato, costumava acompanhar na infância os treinos do Boca e não teve maior pudor em assumir como técnico xeneize – duas vezes. Na primeira, consagrou-se com o título nacional de 1969, garantido em um Superclásico histórico em pleno Monumental. A outra, em 1985, já esteve longe de ser exitosa. Mas ocorreu mesmo após Di Stéfano ter novamente trabalhado no River, coroando-se campeão nacional em 1981 no ex-clube: ele ainda é o único campeão como treinador na dupla, façanha ofuscada pela grandiosa carreira de jogador.

Menotti jogou e treinou o Boca. E dirigiu Maradona no Barcelona

Alberto Tarantini, por sua vez, reforçou o Barcelona após consagrar-se na Copa do Mundo de 1978. Embora oficialmente sem clube na convocação ao Mundial, ele era o único na Albiceleste atrelado ao Boca campeão da Libertadores pela primeira vez, em 1977, pouco antes de sua rescisão nada amigável com a equipe na qual se formara. El Conejo, contudo, calhou de jogar em tempos pré-Lei Bosman e pré-passaporte comunitário europeu. Nem sua possível cidadania dupla italiana, pelas regras da época, o livrariam de ocupar uma vaga de estrangeiro no Camp Nou. E ele rechaçou a pressão dos cartolas para se casar de fachada com uma cidadã local para adquirir passaporte espanhol, seguindo carreira europeia no Birmingham City mesmo. Outro sinal de outros tempos: jogar a liga inglesa lhe dava menos ibope na seleção do que jogar a liga cordobesa. Assim, o defensor logo apareceu no Talleres em 1979, sua escala antes de virar a casaca para defender o River.

Desejado abertamente pelo Barcelona desde 1978, Diego Maradona foi sondado seriamente também por Talleres (no auge financeiro dos cordobeses) e River ao longo de seu período no Argentinos Jrs. Mas escolheu o Boca em fevereiro de 1981, rumando por empréstimo ao clube do coração para lidera-lo em um consagrador Torneio Metropolitano – encerrando um expressivo jejum doméstico de cinco anos, inclusive. Dono do seu passe, o Argentinos Jrs enfim o vendeu aos catalães um pouco antes da Copa do Mundo de 1982. Dieguito teria uma estadia de altos e baixos no Camp Nou. Não resolveu a seca de taças do time em La Liga (só uma, no já distante 1974, havia sido comemorada desde 1960) e ainda sofreu uma fratura na perna.

Os troféus de Maradona na Catalunha se limitaram à temporada 1982-83, mas ambos sobre o Real Madrid, na Copa do Rei e na extinta Copa da Liga – a render a célebre ocasião em que um gol seu foi aplaudido de pé pela torcida arquirrival, no Santiago Bernabéu. O treinador daquele Barcelona era ninguém menos que César Menotti. Ainda como jogador, apareceu em 1963 na seleção argentina pelo desempenho no seu Rosario Central. Em 1964, ele defendeu pontualmente o River em um amistoso, seguindo o ano defendendo dignamente o Racing. Assim, o Boca contratou em 1965 aquele camisa 10. El Flaco esteve na campanha campeã argentina, mas sem vingar. Após o consagrador ciclo de treinador da seleção entre 1974 e 1982, apareceu no Barcelona como um mimo a mais para Maradona.

Os 9-1 do Troféu Joan Gamper de 1984 ainda são a derrota mais elástica sofrida pelo Boca. Mas os argentinos levam vantagem no número de vitórias

Contudo, a dupla deixou o Barça ao fim da fatídica temporada de 1983-84, marcada tanto por aquela fratura que Diego sofreu contra o Athletic Bilbao quanto na briga campal que El Diez, já recuperado, protagonizou ao não conseguir revanche contra o timaço basco (vencedor de La Liga naquelas duas temporadas maradonianas em Les Corts) em nova final de Copa do Rei. Nenhum deles estava no Camp Nou quando o tradicional troféu Joan Gamper rendeu naquele 1984 a pior goleada já sofrida pelo Boca: um simbólico 9-1 no ano mais complicado que o clube argentino já teve. Foi o primeiro encontro das duas equipes desde aquela série de amistosos dos anos 60.

Treinado pelo brasileiro Dino Sani, o Boca terminou o primeiro tempo já sofrendo um 3-0 (José Ramón Alexanko e dois do escocês Steve Archibald e a expulsão de Roberto Passucci. Então veio um apagão de nove minutos, entre os 10 e os 19 do segundo tempo: Ramón Calderé, Alexanko de novo, o alemão Bernd Schuster e Francisco Carrasco anotaram naquele intervalo de tempo o grosso do vexame. O uruguaio Fernando Morena, já em declínio de carreira, descontou de pênalti aos 23. Esteban Vigo e Marcos Alonso (pai do jogador homônimo hoje no Chelsea) deram os números finais, enquanto Maradona e Menotti já seguiam a vida longe dali. Ambos, inclusive, teriam cada um outros dois ciclos no Boca. Que teve um pequeno troco em 1993, em um triangular-relâmpago em Tenerife com o clube local, em jogos de 45 minutos. O ídolo Alberto Márcico fez o único gol naquela partida de abertura, que ainda seguiu-se a uma curiosa definição de pênaltis preventiva, como critério de desempate. E deu Boca de novo, 6-5.

As duas passagens seguintes de Menotti pela Bombonera, agora como treinador (no primeiro semestre de 1987 e no biênio 1993-94, chegando já depois daquele evento em Tenerife), o viram conseguir imprimir um salto de qualidade e resultados ao clube, mas não foi capaz de chegar a títulos: o empréstimo do clube junto ao Argentinos Jrs pelo próprio Maradona em 1981 fora em dólares, com o câmbio calhando de saltar em 240% em meio aos desmandos econômicos finais da ditadura, gerando a bola de neve que resultara no turbulento 1984 e em uma década perdida na sequência. Longe do auge, Diego voltou para casa em 1995; desde que saíra, o time só pudera ser campeão argentino uma vez, em 1992. Ele chegou perto, mas também não solucionou esse problema. Recontratado na temporada 1995-96, viu o Boca decair na reta final tanto no Apertura (onde era líder invicto até a antepenúltima rodada) como no Clausura.

Marcado por Frédéric Déhu, Antonio Barijho (com a bola) até fez gol no duelo de 1999, a última vitória do Boca. O carequinha César La Paglia também marcou o dele. Os outros são Walter Samuel (ao fundo, atrás de La Paglia), o juiz César Megía Dávila e José Basualdo

A decepção foi tanta que ele teve recaída nas drogas e tirou um ano sabático para tratar-se, regressando aos gramados no segundo semestre de 1997. Mas uma sucessão de problemas físicos e o esgotamento midiático o fizeram pendurar as chuteiras ainda na metade do Apertura, que o clube ficou a um ponto de vencer já sob a regência de seu sucessor com a camisa 10: Juan Román Riquelme foi promovido ao time adulto exatamente em meio ao ano sabático de Maradona e logo todos viram a pedra preciosa não-lapidada que estava na Casa Amarilla, ainda que fosse preciso aguardar até a temporada 1998-99 para ela reluzir em taças. Nela, a seca deu lugar a títulos tanto no Apertura como no Clausura, no embalo de um recorde de 40 jogos de invencibilidade seguida.

Abria-se a era mais vitoriosa do Boca e o Barcelona sentiu isso no primeiro encontro desde os 9-1. Em 11 de agosto, a cidade de Alicante serviu de cenário do tira-teima entre os bicampeões argentinos e os bicampeões espanhóis, inclusive colocando em jogo o “Troféu dos Campeões”. Riquelme regeu a bola para que os inábeis Antonio Barijho e César La Paglia abrissem 2-0. O holandês Boudwijn Zenden descontou antes de um final movimentado, em que Martín Palermo ampliou já aos 30 do segundo tempo e o português Luís Figo diminuiu logo aos 32. Foi um primeiro cartão de visitas de Riquelme para os espanhóis, ainda que o negócio demorasse um certo tempo para se concretizar. Um segundo cartão de visitas veio no Mundial Interclubes de 2000, sobre o Real Madrid, em outro baile de Román. O Boca fechou aquele ano com sua primeira tríplice coroa, com o Apertura se somando à reconquista da Libertadores após 22 anos.

No primeiro semestre de 2001, a transferência de Riquelme ao Barcelona chegou a ser anunciada ainda em meio à vitoriosa Libertadores de 2001. Não era segredo que o craque era retido já a contragosto e o clube argentino teve uma temporada de 2001-02 esquecível, a ponto de Román acabar mesmo de fora da Copa do Mundo de 2002, mas enfim embarcar a Les Corts. Seu brilho inicial nos novos ares logo deu lugar a um craque criticado abertamente pelo treinador Louis van Gaal como pouco esforçado no trabalho defensivo que a tática do holandês exigia de todos. Não houve paciência com o argentino, logo despachado ao Villarreal ao fim de uma só temporada no Camp Nou, turbulenta – o time chegou até a brigar contra o rebaixamento em dado momento. Van Gaal tampouco ficou até o fim, mas os cartolas apostaram em Ronaldinho Gaúcho para ser o novo dono da 10.

Riquelme: sua maior alegria ao Barcelona foi desesperar Iván Helguera e Raúl no Mundial Interclubes 2000

R10, de fato, estreou como blaugrana no Camp Nou exatamente em um Troféu Joan Gamper agendado contra um Boca recém-campeão da Libertadores. O novo maestro dos argentinos era o novato Carlitos Tévez, que abriu o placar e protagonizou grande noite. Perto do fim, Gerard López empatou e os donos da casa terminaram levando nos pênaltis. Riquelme já estava no Villarreal, onde pôde se consagrar na campanha quase finalista da Europa na temporada 2005-06. Ele optou por voltar relativamente cedo para casa e se deu bem, regendo a sexta Libertadores do Boca, em 2007, e liderando-o na entressafra que se seguiu; a Recopa Sul-Americana em 2008, sobre o Arsenal do jovem Papu Gómez, segue sendo o último troféu continental do bicho-papão dos anos 2000. Atual técnico boquense, o então volante Sebastián Battaglia até deixou um raro gol naquela conquista.

Entre um jogo e outro contra a equipe de Sarandí (ida em 13 de agosto, volta em 27 de agosto), o Boca voltou a ser convidado pelo Barcelona para o Troféu Joan Gamper, em 16 de agosto. Ausente em 2003 por ainda ser juvenil, um Messi já consagrado também não deu as caras, ocupado (junto com Riquelme, aliás) com a seleção olímpica nos Jogos de Beijing. O amistoso teve faceta história similar ao de 2003: se meia década antes servia de apresentação de Ronaldinho, em 2008 marcou o início do trabalho de Pep Guardiola como novo treinador culé. Em noite em que o Boca pôde efetuar nada menos que nove substituições, jogando a segunda etapa quase com um time juvenil, sua garotada aprontou: Lucas Viatri, que substituíra Palermo no intervalo, abriu o marcador já aos 28 minutos do segundo tempo. Os donos da casa partiram para o abafa e conseguiram uma virada-relâmpago, aos 43 e aos 45, em cabeceios de Carles Puyol e Samuel Eto’o.

Em 2012, então, apareceu o nome mais recente dessa lista, ainda que com asterisco. Sergio Araujo foi uma eterna promessa em três anos de Boca, entre 2009 e 2012, período em que venceu o Apertura 2011, a Copa Argentina de 2012 e foi vice na Libertadores também de 2012 – mas onde só atuou três vezes os 90 minutos. Ao todo, foram só dois golzinhos em 35 partidas, mas ainda assim o Barcelona apostou naquele jogador da seleção sub-20. Foi emprestado pelos argentinos por uma temporada, mas sem que saísse do time B catalão. Seguiu uma carreira longe de relevo. Riquelme, por sua vez, foi o ícone de sempre naquelas campanhas auriazuis em que Araujo foi opção de banco, deixando a Casa Amarilla em 2014 para tirar o Argentinos Jrs (clube em que Román se formara) da segundona.

Ronaldinho Gaúcho escapa de Raúl Cascini, observados ao fundo por Iarley (ex-Real Madrid B): estreia de R10 no Camp Nou foi contra o Boca

O ano de 2018 marcou o encontro mais recente entre Boca e Barcelona, o primeiro em que o abismo técnico e econômico que o futebol europeu abriu a partir de meados dos anos 2000 fez-se sentir no histórico. Malcom e Messi abriram 2-0 no primeiro tempo e Rafinha Alcântara deu números finais no segundo em favor de uma equipe em franca crise, mas capaz de aplicar um 3-0 no futuro finalista da Libertadores.

Boca e Barcelona, além de terem juntos o orgulho de jamais terem sido rebaixados, puderam ser campeões em torneios alusivos aos seguintes anos nos campeonatos argentino e catalão, quando esse torneio regional ainda tinha prestígio antes do franquismo: 1919, 1920 (ano de título barcelonista também na Copa do Rei), 1924, 1926 (nova Copa do Rei), 1930, 1931 e 1935. E demorou-se até 1966 para que os dois times sorrissem juntos: o Boca como bicampeão espanhol seguido, o Barça na Copa das Feiras, precursora da atual Liga Europa. Mas daí foi preciso saltar até 1978, ano de Copa do Rei os catalães enquanto o Boca faturava sua segunda Libertadores (além do primeiro Mundial Interclubes, ainda válido por 1977).

Em 1981, Maradona liderou a conquista argentina enquanto seu futuro clube erguia nova Copa do Rei, mas a década que se seguiu aos dois clubes foi particularmente perdida. Em 1989, cada um faturou o segundo título continental em importância: Supercopa Libertadores (torneio extinto que entre 1988 e 1997 reuniu somente campeões da Libertadores) para os argentinos, Recopa Europeia para os espanhóis. A conquista da Supercopa foi a primeira taça do Boca desde a conquista maradoniana de 1981 e o credenciou a travar e levar em 1990 a Recopa Sul-Americana contra o Atlético Nacional, ao passo que o Barcelona comemorava mais uma Copa do Rei.

Sergio Araujo só esteve no time B do Barcelona. Mas é o nome mais recente em comum na dupla

Apenas em 1992 é que ambos ganharam conjuntamente suas ligas, com o Boca desengasgando com o Apertura seu pior jejum doméstico, seis meses depois de faturar a Copa Master (que por sua vez reunia somente campeões da Supercopa). Naquele ano, o Barcelona também conquistou sua primeira Supercopa da UEFA, além de uma Supercopa da Espanha. Em 1993, nova copa continental ao Boca: a Copa Ouro, troféu da Conmebol disputado entre os vencedores de 1992 da Libertadores, da Copa Conmebol, da Supercopa e da própria Copa Master. Já o Barcelona festejava um tricampeonato espanhol.

Desde então, as duas marcas passaram por entressafras e renascimentos, rendendo os seguintes anos de títulos em comum: 1998 (Espanhol e Copa do Rei; Apertura), 1999 (Espanhol; Clausura), 2005 (Espanhol e Supercopa da Espanha; Recopa, Apertura e Sul-Americana), 2006 (Espanhol, Liga dos Campeões e Supercopa da Espanha; Clausura e Recopa), 2011 (Espanhol, Liga dos Campeões, Supercopa Europeia, Supercopa da Espanha e Mundial Interclubes; Apertura), 2012 (Copa do Rei; Copa Argentina), 2015 (Espanhol, Copa do Rei, Liga dos Campeões, Supercopa Europeia e Mundial Interclubes; Argentino), 2017 (Copa do Rei; Argentino) e 2018 (Espanhol; Argentino).

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Ausente nas edições de 2003 e 2008 do Troféu Joan Gamper, Messi enfim enfrentou o Boca em 2018 e deixou o dele nos 3-0

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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